Uma das reformas mais discutidas há 28 anos --desde a Comissão Mattos Filho, do governo Collor-- e jamais concretizada é a reforma tributária.
O grande diferencial, nos países desenvolvidos de carga inferior ou superior à do Brasil, é que os serviços públicos são de qualidade consideravelmente superiores, principalmente em educação e saúde.
Todos os projetos de reforma tributária no país, seja para redução da carga ou simplificação do sistema, têm esbarrado na triste realidade detectada por editorial desta Folha de 20 de novembro, vale dizer, nos gastos federais com pessoal (R$ 300 bilhões), assim como no que foi apontado por reportagem segundo a qual os gastos de pessoal pressionam as despesas correntes de 14 estados e do DF, superando de muito sua arrecadação.
A carga burocrática impede não só a redução da carga tributária como a simplificação do sistema. Como dizia Alvim Toffler, os "integradores do poder" (burocratas) multiplicam-se nos governos ineficientes, criando obrigações insuportáveis para a sociedade ("A terceira onda"), sendo, em grande parte, mais importantes que os políticos, pois, uma vez acoplados ao poder, não mais o deixam. São permanentes, e não transitórios, como os políticos.
Quanto mais burocratas, mais complicados são os sistemas, pois é a forma de se tornarem imprescindíveis. Quanto mais complicados os sistemas, mais recursos da sociedade são necessários para sustentá-los no poder.
Hoje, a carga burocrática do Brasil impede a redução da carga tributária a tal ponto que o peso dos tributos é destinado de forma assustadora à remuneração, em dose superior à dos países desenvolvidos, da burocracia dominante, composta de parcela considerável de servidores não concursados, mas escolhidos, em grande número, por serem amigos do rei. Pagamos tributos não para receber serviços públicos de qualidade, mas para sustentar burocratas e políticos.
Por essa razão, todos os projetos de reforma tributária apresentados nos últimos 28 anos não foram adiante, o mesmo acontecendo com as boas propostas do deputado Luiz Carlos Hauly, ou dos professores Bernard Appy e de De Sancti, pois, em qualquer delas, governadores de estados perderiam o poder de continuar a promover a guerra fiscal do ICMS, assim como os burocratas deixariam de ser necessários para gerar complexidade, algo que se tornou o "nó górdio" em todos os projetos não aprovados no passado.
Creio que uma revolução tributária seja necessária. Nada é tão justo como permitir que o contribuinte entenda as leis que o obrigam a pagar tributos, sem ter, como ocorre nesta terra de Santa Cruz, que se socorrer de uma legião de especialistas.
Enquanto, todavia, burocratas e políticos mantiverem seus privilégios, não ocorrerá a simplificação necessária, que poderia ser feita por legislação infraconstitucional. E o peso dos tributos, superior ao de muitos países desenvolvidos, continuará a flagelar a sofrida nação brasileira --transformada, como na Idade Média, em "escrava da gleba" pelos novos "senhores feudais" do Brasil.
Ives Gandra da Silva Martins Advogado e professor emérito da Universidade Mackenzie, da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército e da Escola Superior de Guerra
Fonte: Folha.uol.com.br/
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