"Recusar-se a fazer contas raramente traz benefícios aos mais pobres" – Thomas Piketty
Thomas Piketty em seu livro: O Capital no Século XXI relata que um por cento da população do mundo detêm mais de 50 por cento da riqueza. A concentração de riqueza é um fenômeno mundial. A solução do problema a primeira vista, parece simples. Basta a vontade política de distribuir as fortunas igualitariamente.
Mas, será a distribuição de renda e riqueza, via tributação progressiva, uma solução adequada? Creio que não. A distribuição de renda, caso não seja sustentável, é mera ilusão. Se redistribuíssemos toda a renda do mundo igualitariamente, ao invés da eliminação da pobreza, o resultado seria um desastre econômico de proporções catastróficas.
As tentativas atuais para a solução desse problema se baseiam em políticas fiscais que taxam os ricos de forma progressiva. Esse dinheiro é redistribuído aos pobres, os quais o utilizam para seu consumo e não conseguem acumular. Em outras palavras: os que se localizam no andar de baixo da renda, ao ter um acréscimo dela, direcionam-as ao consumo e não à poupança, pois suas necessidades básicas estão insatisfeitas, criando assim um círculo vicioso.
Nesse contexto, por mais que se taxe o lucro e distribua a renda, ela não necessariamente aumentara a riqueza dos pobres, nem o seu nível de satisfação de necessidades. Ao contrário, a distribuição de renda, por desviar recursos da oferta para a demanda, provoca, na maioria das vezes, o aumento da inflação, afetando muito mais os pobres do que os ricos. Para resolver o problema, mais do que a taxação progressiva, é necessário também criar condições de igualdade na remuneração do dinheiro. A distribuição pura e simples da renda e da riqueza é uma ilusão que apenas destrói a capacidade da sociedade de manter um ritmo adequado de crescimento.
A solução do problema, no meu entendimento, está na criação dos fundos sociais soberanos tais quais aqueles já existentes no Brasil, que visavam originalmente a distribuição de riqueza e não apenas de renda. Todavia os fundos sociais brasileiros, como o FGTS, foram mal administrados nos últimos 50 anos, e consequentemente, dificultaram a formação de riqueza dos pobres e se colocam entre os piores investimentos jamais imaginados. No Brasil a discrepância se acentua, pois os ricos receberam a maior taxa de remuneração do mundo. Se fizermos as contas, somente este fato explicaria o porquê da concentração de renda e riqueza.
A razão dessa discrepância decorre da classificação de risco pelas instituições financeiras. A dos ricos é superior a dos pobres e por isso sua rentabilidade é maior o que, até certo ponto, é natural. No entanto, os pobres, em conjunto, aplicando através de fundos sociais, poderiam alcançar a mesma classificação e remuneração dos ricos. Não apenas por uma questão de justiça, mas também e principalmente por uma questão lógica de análise de riscos. Portanto economicamente sustentável, além de justa. Óbvio é salientar que os fundos sociais deveriam ser administrados com total governança e transparência, o que não ocorreu no país.
Dizem que o Brasil distribuiu renda nas últimas décadas, mas vê-se que se a distribuição fosse de riqueza produtiva e não de renda improdutiva, poderíamos encontrar a solução para o problema, possibilitando o estímulo à formação de capital e a manutenção do crescimento economico. E, conforme as pesquisas de Piketty indicam, favoreceriam a distribuição de renda e riqueza no longo prazo. Existe uma grande diferença entre distribuição de riqueza e distribuição de renda. A primeira pode ser sustentável e a segunda quase nunca.
Para tanto é necessário evitar que tais mudanças prejudiquem a produtividade das instituições e da sociedade. Em face da necessidade insatisfeita e penúria que afeta grande parte da humanidade há que se considerar, como premissa, produzir mais com menos, o que coloca a produtividade como mola mestra da evolução. Nesse sentido não há justificativa para penalizar o lucro, já que este é condição mandatória para se resolver os problemas. Óbvio também a necessidade de estímulo à formação profissional e a educação em termos mais justos e produtivos.
Enfrentamos um problema de máximos e mínimos no qual a solução é um ponto de equilíbrio entre o futuro e o presente. Se pensarmos unicamente no futuro, aumentando a riqueza sem aumentar a renda, perderemos a força para continuarmos vivos. Por outro lado, ao pensarmos unicamente no presente, distribuindo renda de forma insustentável, ficaríamos felizes no curto prazo, mas o futuro não existiria. O Imposto progressivo, proposto por Piketty, não deixa de ser um caminho, no entanto, encontra grandes resistências por parte dos contribuintes além de concentrar no estado a sua distribuição. Além do mais, isoladamente, pode ter um efeito paralelo contrário à produtividade por desviarem recursos da produção para a demanda.
Piketty alerta que a solução do problema é muito mais político do que econômico. Penso, e estou convicto de que Piketty concorda, que uma solução política somente é viável se ao mesmo tempo envolver uma solução econômica que lhe dê sustentabilidade.
Há mais de quatro décadas estudo profundamente os assuntos associados ao Mercado de Capitais e leciono a matéria em universidades. Ao longo desses anos tenho discutido esse assunto com alunos e professores e hoje sinto à vontade para divulgar minha percepção e opinião. Devemos continuar estudando, descobrindo e aprofundando nos algoritmos da evolução humana entre eles os algoritmos da democratização do capital. Dessa forma estaríamos criando a proposta de corrigir a remuneração do capital dos menos favorecidos de forma sustentável e representando a evolução da economia para um novo estagio de desenvolvimento e equilíbrio.
Luiz Roberto Kallas é consultor e professor de Planejamento e Finanças há 33 anos.
Fonte: Conjur
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