Lei nº 13.467/17, que introduziu a reforma trabalhista, vem causando enorme polarização de posicionamentos acerca dos efeitos dela decorrentes, sobretudo à luz dos propósitos instituidores das alterações.
Tirante as fundadas críticas feitas quanto ao açodamento do processo legislativo e a restrição às discussões dedicadas à oitiva de todos os atores envolvidos, as alterações introduzidas refletem o anseio por modificações estruturais voltadas a fazer frente à enorme judicialização das relações de emprego e à insegurança jurídica a que expostos os empregadores, com impacto sobre o custo da mão-de-obra e a própria criação e manutenção de postos de trabalho.
Uma vez subscrito o instrumento coletivo, a entrada em vigor depende do simples depósito perante o órgão do Ministério do Trabalho e Emprego, vigendo pelo prazo estipulado, tendo força cogente e sendo impositivo a empregados e empregadores envolvidos, independentemente desindicalização ou qualquer pronunciamento judicial prévio acerca da regularidade formal ou material da norma concebida.
Haja vista a normatização inerente aos acordos e convenções coletivas de trabalho, o cumprimento de suas disposições deveria implicar ato jurídico perfeito, a teor do disposto no caput e § 1º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, a conferir segurança às partes abrangidas.
Nesse contexto, sem prejuízo à discussão judicial posterior sobre a legalidade e constitucionalidade das normas coletivas, sobretudo acerca da disponibilidade dos direitos transacionados, era de supor-se a imutabilidade das relações e dos fatos consumados sob a égide de tais atos normativos.
No entanto, o que se tem, até então, é ambiente de extremada imprevisão, onde o adimplemento das normas coletivas, das quais não se pode desvencilhar o empregador, não os torna imunes a condenações em dissídios individuais ou multas,por vezes milionárias, em fiscalizações empreendidas pelo próprio Estado.
Nesse contexto, o empregador que se vale, por exemplo, de permissivo convencional, quanto às categorias em que há tal previsão em norma coletiva, para pagar em parcela única o 13º salário devido aos seus trabalhadores, como alternativa ao parcelamento de que trata o art. 3º do Decreto nº 57.155/1965, não está a salvo de expressiva penalização, conforme o número de empregados envolvidos, a cargo da Superintendência Regional do Trabalho sob o argumento de violação à lei trabalhista incidente.
Do mesmo modo, o sindicato patronal que se ponha a negociar coletivamente incentivos à continuidade mediante instituição de hipótese de rescisão contratual por culpa recíproca, com redução do valor de multa sobre o saldo do FGTS e garantia de contratação do trabalhador pela prestadora de serviços sucessora, pode sujeitar a classe patronal executora da norma coletiva a condenações judiciais em demandas individuais, retroativamente quanto ao período imprescrito, e a novamente a expressivas multas, com obrigação de pagamento da diferença apurada, oponíveis pela Fiscalização do Trabalho, independentemente de qualquer decisão judicial prévia em caráter abstrato sobre eventual nulidade do acordo ou convenção. O Ministério do Trabalho e Emprego, inclusive, por meio de suas inspetorias, vem se constituído no aventado direito de ignorar acordos e convenções coletivas de trabalho quanto às cláusulas que entende nulas para penalizar o empregador e sem sequer se ocupar de expor ou motivar as razões de seu convencimento, com ímpeto que por vezes sugere pretensão de exterminação do autuado, tal como um inimigo a ser eliminado.
O cenário presente deixa clara a fragilidade do ordenamento jurídico quanto ao viés normativo das normas coletivas e a insegurança resultante do próprio tratamento conferido pela Justiça do Trabalho às questões levadas a seu conhecimento e da forma como a Fiscalização do Trabalho vem apreciando e, eventualmente, ignorando tais instrumentos convencionais.
O empregador assume os riscos da atividade econômica e, sem qualquer certeza ou garantia do sucesso do investimento realizado, empreende, emprega, movimenta a economia, produz riqueza e gera receitas necessárias à prestação de serviços públicos e à atuação do Estado, em direto benefício para o trabalhador, que pode emprestar sua força de trabalho, empregar-se a garantir assim o seu sustento.
Com efeito, mais que a imposição de limites ao âmbito de apreciação do conteúdo e forma de acordos e convenções coletivas de trabalho, tal como preconiza o art. 8º, § 3º, da Lei nº 13.467/17, há que se ter previsibilidade e preservação dos atos jurídicos perfeitos como forma de consecução de segurança jurídica para ambas as partes na relação de emprego, eis que só assim haverá terreno fértil e sustentável para o empreendimento e a expansão da economia, com respeito às negociações coletivas e, agora, aos acordos individuais, sensíveis às nuanças de cada realidade.
Donne Pisco - Advogado em Brasília-DF, sócio de Pisco & Rodrigues Advogados, especialista em Direito Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas (FGV)
Fonte: Jota.info/
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