Por mais que seja criticada a reforma trabalhista produzida pela Lei 13.467 de 13 de julho de 2017, os ajustes na reconstrução dos relacionamentos parecem inevitáveis tanto no âmbito das relações individuais de trabalho como nas relações coletivas. É comum em momentos de transição que o novo seja rejeitado porque incomoda a zona de conforto de quem sempre achou que tudo se resolvia no modelo estatal de proteção. A partir da vigência das novas disposições o comprometimento e a responsabilidade contratuais ocuparão lugar de destaque nas relações trabalhistas.
A pretensão de reforma da legislação trabalhista sempre acompanhou a CLT ao longo de sua existência, sempre com comissões de juristas notáveis. É certo que tudo se mistura com o momento político em que o País vive e os interesses se cruzam no sentido da desqualificação da reforma.
O Direito do Trabalho não foi concebido para ser fechado no seu campo de atuação. Não foi concebido para ser imutável. Nas palavras de Evaristo de Moraes Filho e Antonio Carlos Flores de Moraes “Caminhando rente à vida, sentindo a própria realidade concreta, altera-se permanentemente a legislação do trabalho, procurando acudir aos mínimos pormenores das relações da estrutura econômica. O dinamismo é sua essência, como um organismo em desenvolvimento que cresce incessantemente” (Introdução ao Direito do Trabalho, 11ª ed. São Paulo, LTr, 2014, p. 59).
Não fosse assim, não teríamos negociações coletivas pelas quais os grupos vão de aperfeiçoando às suas peculiaridades e necessidades próprias. O Direito do Trabalho prima pela verdade dos fatos, sempre privilegiando dois princípios: o protetor e o da primazia da realidade, restringindo abusos e práticas ilícitas.
A legislação trabalhista reflete a evolução das condições sociais e a transformação inquestionável dos novos modelos de entregar o trabalho e, se adapta, criando normas de proteção a fim de que abusos não sejam praticados a ponto de alcançar o equilíbrio social.
Fala-se muito em modernização das relações de trabalho com a reforma. Todavia, não se modernizam as relações trabalhistas por lei. Na verdade, a ordem é inversa pois existe um impulso de modernização do trabalho que a lei não acompanha, especialmente nos dias atuais em que a evolução dos meios informatizados e telemáticos ocorre com velocidade incontrolável.
O modelo de proteção trabalhista foi construído para trabalho sob o vínculo de subordinação, supondo que se trata de forma de garantia de continuidade no emprego e, por consequência, modo de efetiva subsistência do trabalhador e de sua família. Assim foi com a antiga estabilidade decenal, atualmente excluída do universo trabalhista.
O emprego adquiriu características outras, tanto pelo lado dos novos ingressantes no mercado de trabalho quanto pela própria modernização da prestação de serviços: o trabalho na atualidade envolve a participação de trabalhadores em resultados mais imediatos e o emprego com carteira assinada pode ser o passaporte para integração dos trabalhadores nos negócios empresariais, celebrando com ele relações contratuais de participação em resultados, sem comprometer o vínculo de emprego. O empregador não deveria ser mais simples pagador de salários nem o empregado deveria se mover como mero cumpridor de jornada sem percepção do negócio que representa a atividade empresarial em que está inserido.
Talvez estejamos caminhando para relações de trabalho e de emprego que reproduzam maior segurança jurídica e maior responsabilidade contratual. No campo das relações coletivas, os sindicatos e as empresas terão uma missão de construir novos relacionamentos. As empresas terão o desafio de aprender com a representação dos trabalhadores e os sindicatos com esta representação desvinculada da condição sindical, com atuação autônoma e capaz de apaziguar os conflitos trabalhistas.
Ainda no campo das relações coletivas, com a extinção da contribuição sindical obrigatória, os sindicatos terão que se alinhar e quem sabe abandonar o confinamento em categorias para pensar no conjunto de trabalhadores mais identificados na representação. Muitos são os debates e reflexões feitos sobre as novas dimensões do Direito do Trabalho e somente a prática é que poderá conduzir à avaliação final da sua efetiva contribuição.
Paulo Sergio João é advogado e professor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e da Fundação Getulio Vargas.
Fonte: Conjur
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