sábado, 5 de agosto de 2017

Modificação e Efeitos da Sentença

CPC/2015, art. 494. Publicada a sentença, o juiz só poderá alterá-la:

I – para corrigir-lhe, de ofício ou a requerimento da parte, inexatidões materiais ou erros de cálculo;

II – por meio de embargos de declaração.

De acordo com o novo CPC, a publicação da sentença pode se dar em dois momentos distintos: na própria audiência de instrução, após o encerramento dos debates ou depois de oferecidas as razões finais; ou no prazo de trinta dias, após o encerramento da fase probatória. Quando proferida em audiência, as partes e os respectivos advogados serão cientificados no mesmo ato. Quando prolatada em momento posterior, a intimação da sentença será, preferencialmente, realizada por meio eletrônico. Não sendo o caso, será publicada no órgão oficial (art. 272, CPC/2015).

Uma vez publicada a sentença (ou apenas proferida, no caso de ter sido prolatada em audiência), pouco importa a sua natureza, incide o princípio da inalterabilidade da decisão judicial, que se aplica também aos acórdãos e, de forma mitigada, até às decisões interlocutórias.

A rigor, constitui erro procedimental a alteração, fora dos casos previstos em lei, de qualquer decisão judicial. O próprio CPC, no entanto, prevê os casos em que se admite alteração da sentença ou do acórdão.

Um deles é para correção de inexatidões materiais ou retificação de erro de cálculo (art. 494, inciso I, CPC/2015). Por inexatidão material entende-se o erro, perceptível sem maior exame, que traduz desacordo entre a vontade do julgador e a expressa na decisão. Omitiu-se, por exemplo, o nome de uma das partes. Erro de cálculo passível de correção é o que resulta de equívocos aritméticos, por exemplo, inclusão de parcela devida e não constante do cálculo por equívoco.

Em caso de inexatidão ou erro, a correção pode ser feita por despacho retificador (que não altera a substância do julgado e, portanto, não tem qualquer reflexo sobre o prazo recursal), a qualquer tempo, mesmo depois de transitada em julgado a sentença. Ressalte-se, no entanto, que os critérios de cálculo e os seus elementos não podem ser alterados após o trânsito em julgado. Nesse sentido: STF, AI 851.363/PR, 1ª Turma, Rel. Min. Luiz Fux, DJe 20.04.2012).

A alteração também pode ocorrer, de acordo com o inciso II do art. 494, CPC/2015, em virtude de interposição de embargos de declaração, quando a sentença ou acórdão contiver obscuridade, contradição ou for omissa com relação a questão suscitada pelas partes.

Os embargos de declaração, espécie de recurso dirigido ao próprio juiz ou órgão prolator da decisão, e por ele julgado, são opostos no prazo de cinco dias, interrompendo-se o prazo para interposição de outros recursos (arts. 1.022 e seguintes do CPC/2015).

O acolhimento dos embargos é feito com a prolação de decisão complementar, de natureza idêntica à decisão embargada, e que a esta se integra.

Afora os incisos do art. 494, outros dispositivos constantes do Código autorizam a alteração da sentença.

O arts. 331, § 1º, e 332, § 3º, constituem exceção ao princípio da inalterabilidade, na medida em que facultam ao juiz retratar-se, mediante interposição de recurso de apelação, no caso de indeferimento da petição, bem como no de improcedência liminar do pedido.

O princípio da inalterabilidade das decisões judiciais não retira do juiz a competência para atuar no feito depois da publicação da sentença. Compete ao juiz de primeiro grau, por exemplo, deferir o desentranhamento de documentos, exercer o juízo de admissibilidade da apelação, determinar o cumprimento do julgado e homologar acordo celebrado pelas partes, mesmo que o processo esteja em grau de recurso.

Efeitos da sentença

A tutela jurisdicional concedida pela sentença guarda relação com o pedido formulado na petição inicial, ou mesmo pelo réu, quando este apresentar reconvenção ou pedido contraposto, ou quando se tratar de ação dúplice. No processo de conhecimento, a sentença será sempre declaratória, seja para conferir certeza à relação jurídica afirmada pelas partes ou negar a existência dessa relação.

A meramente declaratória se restringe à declaração de certeza da existência ou inexistência de relação jurídica, ou da autenticidade ou falsidade de documento. A condenatória, além da declaração de certeza do direito afirmado pela parte, impõe uma condenação ao devedor. A constitutiva, além da declaração da situação jurídica preexistente, cria, modifica ou extingue a relação jurídica.

Tais efeitos são denominados principais porque visados pelos litigantes, tanto que se manifestam em razão do pedido; também denominados formais, porquanto constam expressamente do dispositivo da sentença; finalmente, denominam-se efeitos materiais em razão da sua influência que podem criar sobre a situação jurídica dos litigantes.

Afora os efeitos principais (declaratório, condenatório ou constitutivo), há efeitos que se manifestam automaticamente, em decorrência de previsão legal, independentemente de qualquer pronunciamento judicial. Tais efeitos, denominados secundários ou acessórios, surgem do simples ingresso da sentença no mundo jurídico.

A sentença que decreta a separação judicial ou divórcio, bem como a que anula o casamento, além do efeito constitutivo ou declaratório visado pelas partes e deferido pelo juiz, automaticamente, põe fim ao regime de comunhão de bens (arts. 1.571, II, III e IV, e 1.576 do CC).

A hipoteca judiciária, conforme previsto no art. 495, constitui efeito secundário de toda sentença que condenar o réu ao pagamento de prestação em dinheiro e que determinar a conversão de prestação de fazer, não fazer ou dar coisa certa em prestação pecuniária.[1]

No Código de 1973, a hipoteca judiciária, que está prevista no art. 466, não assegura ao credor qualquer direito de preferência quanto ao recebimento dos créditos estabelecidos na sentença. Ela apenas figura como meio preventivo para se evitar a alienação dos bens em fraude à execução. O credor dispõe, então, apenas do direito de sequela, isto é, da prerrogativa de perseguir os bens hipotecados onde quer que eles se encontrem. A preferência leva em consideração apenas o registro da penhora ou do arresto, segundo posição dominante do STJ.

Conforme redação do art. 495, § 4º, do novo Código, “a hipoteca judiciária, uma vez constituída, implicará, para o credor hipotecário, o direito de preferência, quanto ao pagamento, em relação a outros credores, observada a prioridade no registro”. Isso quer dizer que, nas hipóteses em que houver mais de um credor, o crédito daquele que fizer o registro da sentença perante o cartório de registro imobiliário terá preferência em relação aos demais. Ressalte-se que essa regra é processual e, portanto, não se sobrepõe às preferências estabelecidas nas regras de direito material.

Nos termos do § 1º do art. 495, CPC/2015, a sentença condenatória produz o efeito secundário relativo à hipoteca judiciária: (a) embora a condenação seja genérica, caso em que o registro da “garantia” depende da liquidação da sentença; (b) ainda que o credor possa promover o cumprimento provisório da sentença ou esteja pendente arresto sobre bem do devedor; (c) mesmo que seja impugnada por recurso dotado de efeito suspensivo. Para evitar abusos, o próprio CPC prevê que, sobrevindo reforma ou a invalidação da decisão que produziu a hipoteca judiciária, deverá a parte que promoveu o registro, independentemente de culpa, responder pelos prejuízos causados à outra (art. 495, § 5º, CPC/2015).

Para a efetivação da hipoteca judiciária basta que o credor apresente cópia da sentença perante o registro imobiliário, sendo desnecessária qualquer providência por parte do juiz (art. 495, § 2º, CPC/2015).

[1]  Nessas últimas hipóteses a conversão da obrigação em prestação pecuniária se dá porque as obrigações originárias não puderam ser cumpridas da forma como ajustadas. Por exemplo: se um cantor é contratado para fazer um show e não comparece, injustificadamente, ao evento, causando prejuízos ao contratante, a obrigação que era de fazer deve se converter em pecúnia, já que não haverá mais utilidade no cumprimento da obrigação original.

por Elpídio Donizetti
Jurista, professor e advogado. Membro da Comissão de Juristas do Senado Federal responsável pela elaboração do anteprojeto do Novo CPC. Mestre em Direito Processual Civil pela PUC/MG. Doutor em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidad Del Museo Social Argentino. Pós-Doutor em Direito pela Universitá degli Studi di Messina. Fundador do Instituto Elpídio Donizetti e do Escritório Elpídio Donizetti Advogados. Foi Promotor de Justiça em Minas Gerais e Goiás (1985 a 1988), Juiz de Direito (1988 a 2005), Juiz do TRE/MG (2001/2002), Juiz do Tribunal de Alçada (2004 a 2005) e Desembargador do TJ/MG (2005 a 2013).  Foi professor concursado na Fac. de Direito da UFU (1990/1992); professor em cursos preparatórios em Belo Horizonte (1994/2001); professor e coordenador dos cursos de pós graduação da Newton Paiva em convênio com o Aprobatum no período de 2003/2012; atualmente é professor nos cursos de pós-graduação do FEAD em convênio com o IED. Foi Presidente da AMAGIS (1998 a 2001) e da ANAMAGES (2002 a 2011) e Diretor da Escola Nacional de Magistratura Estadual (2011 a 2014).

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