Retração e estagnação: este é o panorama atual do mercado financeiro em nosso país. Juros altos, restrições de crédito, consumo em desaceleração e menor confiança dos empresários fazem parte do cenário neste ano de 2015.
O pleno emprego já não existe mais.
Empresários e Centrais Sindicais passaram os últimos dois anos buscando maneiras de resguardar os direitos dos trabalhadores, garantir a manutenção dos empregos e possibilitar a sobrevivência das empresas, aplicando o "Lay-off", o "Acordo de Redução de Jornada" e o "Trabalho em Regime de Tempo Parcial" como alternativas à redução do quadro de empregados.
Neste mês de julho, contudo, tivemos a instituição do Programa de Proteção ao Emprego que, ao oposto do que muitos acreditam, não resolve, tampouco melhora a situação das empresas e trabalhadores. Ao contrário disso, inviabiliza por completo a aplicação da legislação atual, dificultando a negociação sindical e o diálogo entre as partes.
Para que possamos analisar a fundo a Medida Provisória nº 680 de 2015, é necessário termos uma noção clara do que já existe na legislação brasileira como opção para empresas que enfrentam dificuldades financeiras.
Uma destas alternativas encontra-se disposta no artigo 476-A da CLT: o Lay-off.
O Lay-off nada mais é que a suspensão temporária do contrato de trabalho em tempos de crise, muito utilizada para que as empresas consigam gerenciar o excesso de mão de obra nas fábricas quando o baixo consumo exige a redução do ritmo de produção. Para sua implementação é necessária autorização do Sindicato e de todos os empregados envolvidos.
Atualmente, milhares de brasileiros encontram-se enquadrados neste regime, onde o funcionário não trabalha, recebendo uma bolsa qualificação que nada mais é que o seguro-desemprego pago através do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). A empresa, por sua vez, investe na qualificação do empregado fornecendo cursos profissionalizantes.
Com o Lay-off a qualidade de segurado se mantém, embora não haja recolhimento de INSS. Quaisquer benefícios adicionais que as partes pretendam auferir podem ser objetos de negociação.
Essa modalidade de suspensão temporária dos contratos conta com o apoio do FAT pelo prazo máximo de cinco meses.
A crise, por sua vez, ultrapassou as previsões iniciais e já dura um ano e meio sem que se possa avistar uma luz no fim do túnel: o Lay-off tornou-se insuficiente para as empresas, que passaram a aguardar uma solução mais duradoura, mas que mantivesse os benefícios de ambas as partes.
Aquelas que não visualizam os cinco meses de Lay-off como uma solução, utilizam a Redução Parcial da Jornada de que trata a Lei nº 4.923/1965, legislação criada como alternativa ao desemprego de 1965 e que continua vigente.
A legislação em comento permite que empresas que estejam comprovadamente em dificuldades possam negociar com a entidade sindical a redução da jornada de trabalho, deduzindo até 25% do salário mensal dos trabalhadores.
Para viabilizar o Acordo, a entidade sindical deve convocar os trabalhadores interessados e, caso não haja concordância, a empresa poderá submeter sua proposta à apreciação imparcial do Poder Judiciário.
Autorizada a redução, os trabalhadores envolvidos não poderão realizar horas extraordinárias e a empresa não poderá, sem antes recolocar aqueles que fizeram parte do programa, contratar novos trabalhadores por até seis meses após a cessação do Regime de Redução de Jornada.
Na Redução Parcial de Jornada os benefícios se mantêm e a empresa consegue tempo para se reerguer e recolocar no mercado.
Por manter o desempenho das atividades, a alternativa sempre foi bem vista por todos os envolvidos.
A terceira alternativa existente diz respeito a utilização do Trabalho em Regime de Tempo Parcial de que tratam os artigos 58-A e 59 §4º da CLT.
Decorrente apenas de negociação coletiva, a duração do trabalho não pode exceder a 25 horas semanais, com a correspondente redução salarial proporcional.
Estes trabalhadores em Regime de Tempo Parcial têm períodos de férias distintos, proporcionais à jornada realizada e não lhes é permitida a ocorrência de horas extraordinárias.
Como se pode verificar, já haviam alternativas suficientes para auxiliar empresas e trabalhadores em momentos de crise.
Tínhamos três formas diferenciadas de contenção da crise com preservação de empregos. Embora nenhuma fosse a ideal, serviam às expectativas das partes, ainda que por um curto período.
Qualquer modificação legislativa deveria visar a melhoria e não o retrocesso.
Contudo, sem uma análise detalhada, a publicação da Medida Provisória nº 680/2015, que criou o Programa de Proteção ao Emprego foi muito comemorada. Sem o profundo estudo ela parece realmente a solução ideal para empresas em crise, com redução dos custos e manutenção dos empregos.
O Programa de Proteção ao Emprego (PPE) prevê uma redução de jornada de até 30%, seguida da competente redução proporcional dos salários.
Na prática, o trabalhador não sofrerá perdas salariais consideráveis, pois receberá montante correspondente a 85% da sua remuneração atual, dos quais 70% serão custeados pela empresa e 15% pelo Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). A quota parte da empresa, contudo, não pode ser inferior ao salário mínimo nacional.
Isso significa que um empregado que possui um salário de R$ 1.000,00 e uma jornada de 40 horas semanais poderá vê-la reduzida para 28 horas semanais, vindo a receber um salário de R$ 850,00. Destes, R$ 700,00 serão pagos pela empresa, e R$ 150,00 será custeado pelo FAT.
Em contrapartida, a empresa terá o dever de garantir estabilidade ao trabalhador pelo tempo que durar a redução, acrescido de 1/3 dos dias. Ou seja, se a empresa convencionar que a redução de jornada perdurará por 12 meses, o trabalhador consequentemente será estável por 16 meses.
É importante frisarmos que esse empregado estará trabalhando, embora em menor jornada, e somente poderá ser despedido se cometer falta grave o suficiente para tanto, não havendo que se falar em direito contratual do empregador, pois o Programa de Proteção ao Emprego não permite esse argumento.
A empresa assumirá compromissos tornando trabalhadores estáveis pelo período de até 16 meses, sem garantia alguma de que este tempo será suficiente para que a economia se estabilize. Vale frisarmos que todos os especialistas projetam que a crise no Brasil ultrapassará o ano de 2015 e adentrará o de 2016 sem prazo para melhoria do cenário.
Caso o período não seja suficiente para a empresa retomar seu faturamento e a mesma venha a fechar as portas, ainda terá que indenizar o período estabilitário de todos estes trabalhadores, correndo o risco de ter que devolver os valores pagos pelo FAT em razão do encerramento inesperado do Programa.
O Programa, analisado com cautela, já não parece solucionar problema algum. Pelo contrário. Ele gera outros tantos que antes não faziam parte da realidade das empresas.
Existem ainda alguns requisitos básicos para que uma empresa possa aderir ao programa.
O mais importante deles é que a empresa precisa, comprovadamente, estar em crise.
O mais antagônico é que, embora em crise, precisa estar sem dívidas fiscais, previdenciárias ou fundiárias.
Um pouco de sensibilidade à temática já traz a percepção de que dificilmente uma empresa que se encontra em crise estará livre de dívidas destas naturezas.
Assim, o Governo declarou, através da Medida Provisória em comento, que somente auxiliará a empresa cuja atividade e os lucros permitiram que continuasse solvente. Todas as outras, que se encontram realmente em crise e à beira da falência foram automaticamente excluídas do benefício estatal.
Além disso, as empresas terão que comprovar com base em dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), estar dentro do Indicador Líquido de Emprego. Esse índice será calculado levando em conta a diferença entre as admissões e os desligamentos acumulados nos últimos 12 meses, contados a partir do mês anterior ao da solicitação de adesão, sobre o total de funcionários da empresa. No resultado, o indicador não poderá ultrapassar 1% (positivo).
Na prática, todas empresas que no período já tiverem demitido mais trabalhadores do que contratado estarão aptas a ingressarem no programa, o que é, no mínimo, estranho.
Como se não bastasse, a determinação da Medida Provisória é de que o Acordo para aplicação do Programa de Proteção ao Emprego seja realizado entre a empresa e o Sindicato da categoria correspondente à sua atividade preponderante. Mas e se forem atingidos trabalhadores pertencentes a categorias diferenciadas, como os engenheiros, técnicos em segurança do trabalho, motoristas, vendedores viajantes e publicitários?
O Sindicato da categoria preponderante não possui sequer legitimidade para representar trabalhadores de categorias diferenciadas, o que invalidaria o Programa e submeteria a empresa a acusações de fraude e às penalidades correspondentes.
A Medida Provisória que instituiu o Programa de Proteção ao Emprego não veio para solucionar problemas, para valorizar ou favorecer aqueles que realmente precisam de auxílio, tampouco para sanar lacunas legislativas.
Ao contrário, ela gera insegurança jurídica e retira direitos.
Ela vem dificultar as relações em uma época conturbada em que apenas o diálogo poderia fazer com que aqueles que detém o poder e os responsáveis por movimentar as engrenagens da produção unissem forças pelo bem comum e pelo enfrentamento do que pode vir a ser a crise mais longa já enfrentada pelo Brasil e pelos brasileiros.
por Kerlen Caroline Costa - Advogada trabalhista e empresarial do escritório Scalzilli Advogados Associados. Graduada e pós-graduada pela URI - Campus de Santo Ângelo. Especialista em Direito Previdenciário pelo LFG.
Fonte: FISCOSoft
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