MANIFESTAÇÕES DO PRESENTE, PROVAS DO PASSADO E AGENDA LEVY DO FUTURO…
Há estreita relação entre o TEMPO PRESENTE das manifestações de rua de 18/06/2015, o TEMPO PASSADO das provas e informações abertas que ensejam a operação Lava Jato e o desafio do TEMPO FUTURO da Agenda de Cooperação Legislativa para o Crescimento, anunciada por Levy em 14/08/2015: não por acaso, esta relação entre passado, presente e futuro é construída pelo direito.
O direito funciona como uma máquina do tempo. Projeta-se pelas leis para desenhar o FUTURO. Pelas provas e pelos poderes que aplicam o direito (e.g. Receita Federal, Polícia Federal, Ministério Público e Judiciário) reconstrói o PASSADO. Para, assim, mediante os processos jurídicos de apuração dos fatos, turbinado pela liberdade de imprensa e pela sociedade em rede, o direito (ou sua falta) traz a atual percepção do PRESENTE: uma estrutura estatal que já não dá conta de oferecer abertura cognitiva, julgar e deliberar perante esse novo fluxo de informação que inunda a administração pública, sujeitando a risco de pane todo sistema tributário nacional.
O desafio está em escrever a arquitetura jurídica do futuro de um novo sistema tributário nacional. Sem os vícios do passado, para estimular e viabilizar os princípios de ação delineados pela Carta Levy: (i) estimular ambiente de negócios e geração de emprego, (ii) garantia da sustentabilidade fiscal e (iii) criação de instrumentos para uma economia dinâmica e inclusiva.
MÁFIA DO ISS, OPERAÇÃO ZINABRE DO ICMS E OPERAÇÃO ZELOTES: Percepção da corrupção sistêmica do Direito Tributário, capturado pelo poder político federal, estadual e municipal
O sistema fiscal brasileiro está gravemente fraturado e ficará exposto nos próximos anos em decorrência das positivas políticas de transparência e combate à corrupção que foram sucessivamente implantadas.
Pela via interna, lei e instituições vieram para ficar e já mudaram os rumos da nossa história, cite-se: a LRF/2000; a criação da CGU/2001; a Lei de Transparência/2009; a vitoriosa Lei de Acesso à Informação/2011; a Lei Anti-Corrupção/2013 e a nova Lei da Delação Premiada/2013.
Pela via internacional, merece destaque o protagonismo nacional no movimento Open Government Partnership/2011 e a adesão nacional ao esforço G20/OCDE, no combate a erosão fiscal (BEPS).
A transparência é inexorável. Fisco federal, estadual, municipal e empresas privadas ainda se ancoram ao que restou do sigilo fiscal para proteger e ocultar privilégios tributários que não resistem à luz do dia e não encontram sustentação para além das dobras da formalidade jurídica.
O projeto de descentralização da tributação sobre o consumo no Brasil, advindo há 50 anos com a EC 18/1965, naufragou. A “Máfia do ISS em São Paulo”, a “Máfia do ICMS” deflagrada pela operação Zinabre e a operação Zelotes são apenas pequenos indícios do que ainda está por vir, especificamente, para o IPI e para o PIS/COFINS.
Falta direito porque sobra direito. A hipertrofia do direito tributário é um fenômeno que decorre da lógica de corrupção do sistêmica jurídico pelo sistema político. O sistema eleitoral, além de caro, é inepto para conter lobbies voltados unicamente para obter benefícios fiscais, regimes especiais e isenções que travestidos nas mais diversas formas jurídicas não se sujeitam ao controle social, sempre em nome do sigilo fiscal.
O resultado desse processo de corrupção política é um sistema tributário casuístico, imediatista e orientado especificamente para beneficiar empresas e setores, no presente, mas sem visão de longo prazo para o futuro do Brasil.
O problema da corrupção fiscal no Brasil é causado por esse sistema legal que perdeu a referência da legalidade. Perdeu contato com a referência lícito/ilícito. O problema não é o Fisco federal, estadual e municipal. O problema não é o CARF, aparece no CARF porque é o órgão mais transparente e democrático. O problema não é o processo administrativo. O problema não é o STF e o STJ. O problema não é a Execução Fiscal. A solução não é a execução administrativa.
O problema não é o direito formal.
O problema é o direito material tributário vigente, complexo e corrompido por mais 50 anos de exposição às 3 esferas de poder federativo. O que trava nossa economia é, pois, a tributação sobre o consumo: a mais ampla e relevante base tributária para arrecadação, para o ambiente de negócios e para a competitividade de nossas exportações.
REFORMA DO PIS/COFINS E O BRASIL EM 2030
O dever ser é o instrumento por excelência para construir o futuro.
O mundo não será o mesmo daqui a 15 anos. Em 2030, a população do Brasil atingirá o ápice de 208 milhões de habitantes (IPEA)[1]. Projeção do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos indica que a economia brasileira será a 6ª maior do mundo em 2030, ultrapassando França e Reino Unido, que hoje estão à frente do país, alcançando o PIB de U$ 4 trilhões, significativo, mas 8 vezes menor que o PIB americano que será de U$ 24,8 trilhões.
A reforma do PIS/COFINS deve ser o primeiro passo na agenda da reforma nacional de convergência da tributação sobre o consumo que deverá integrar IPI, ICMS e ISS numa mesma visão de futuro. SIMPLICIDADE, TRANSPARÊNCIA E ISONOMIA devem ser os diretivos desse novo modelo nacional.
A não-cumulatividade reflete na variabilidade da própria base de cálculo do tributo, portanto, para garantir SIMPLICIDADE, TRANSPARÊNCIA E ISONOMIA o novo PIS/COFINS deve ser não-cumulativo com crédito financeiro e, por decorrência, incidir sobre a base de cálculo do valor agregado à mercadoria ou do serviço.
As alíquotas devem ser uniformes para todos os fatos geradores e todos os setores da economia. A uniformidade da alíquota garante a solidez e estabilidade do tributo, pois exige ampla base política para aumentá-lo ou reduzi-lo. Garante, sobretudo, a ISONOMIA de todos perante o novo PIS/COFINS e a transparência do tributo para o consumidor final.
A alíquota dever ser “por fora”. Conforme advertiu Isaias Coelho[2]: “Não existe nenhuma razão técnica ou de política pública que recomende o cálculo de impostos “por dentro”. Tampouco esse tipo de cálculo é encontrado em qualquer dos mais de 150 países que têm imposto geral sobre vendas do tipo valor adicionado (IVAs), gênero do qual ICMS, IPI, PIS e COFINS são espécies. A única explicação plausível é que sua adoção no Brasil foi feita para criar a percepção entre os contribuintes de que alíquota não é tão elevada. Isso é o que se chama, na economia política da tributação, de ilusão fiscal ou ofuscação fiscal, o oposto de saliência fiscal ou tributária.
O uso da tributação “por dentro” é feito para gerar opacidade onde deveria haver transparência; numa palavra, para iludir, enganar o contribuinte. No caso brasileiro, essa disposição de iludir foi tão forte a ponto de o engano ser erigido ao patamar de preceito constitucional (Constituição de 1988 art. 155 § 2º, XII, i, ex vi da Emenda 33 de 2001)”. Magister dixit.
Como regra geral, não deve haver isenção ou desoneração no novo PIS/COFINS, exceto em relação às operações de exportação para as quais deve-se garantir pronta e imediata restituição do tributo pago em operações anteriores. A tecnologia do Sistema Público de Escrituração Digital (SPED) e a demanda da competitividade dos produtos nacionais não admite créditos acumulados onerando nossos produtos no mercado externo.
Não é aceitável que o novo PIS/COFINS seja proposto ou alterado por medida provisória. Desde a Constituição de 1988 já editamos 2.916 medidas provisórias. Para além da EC 32/2001, que restringiu ainda mais os requisitos de relevância e urgência na edição de MPs, é bom lembrar que a situação atual do PIS/COFINS se degradou especialmente em razão dos múltiplos “jabutis” inseridos de afogadilho por esse instrumento legal de questionável vocação democrática.
Nesse sentido, a Carta do Min. Levy dá bons sinais. Amanhã, dia 18/08/2015, o Ministro deverá, ainda, participar de debate sobre o tema da reforma do PIS/COFINS, no primeiro encontro da série “Diálogos Estratégicos”, promovidos pela Escola de Direito de Brasília – EDB/IDP: o futuro do Brasil começa agora!
[1] http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=15747
[2] http://www.conjur.com.br/2013-ago-08/isaias-coelho-calculo-icms-dentro-indefensavel
Por Eurico Marcos Diniz de Santi - Professor, Coordenador do NEF/FGV Direito SP, autor do livro Kafka, Alienação e Deformidades da Legalidade e Diretor do Centro de Cidadania Fiscal - CCiF
Fonte: Jota
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