domingo, 17 de setembro de 2017

ISS. Não incidência do imposto

A não incidência do imposto é o fato de o objeto considerado estar fora do campo abrangido pela tributação. É a chamada não incidência pura que se contrapõe à não incidência legalmente qualificada que representa uma restrição à hipótese de tributação, ou seja, implica modificação parcial da norma definidora do fato gerador da obrigação tributária. Este artigo objetiva examinar essa segunda hipótese de não incidência juridicamente qualificada.

Dispõe o art. 2º da Lei Complementar nº 116/2003:

“Art. 2º O imposto não incide sobre:

I – as exportações de serviços para o exterior do País;

II – a prestação de serviços em relação de emprego, dos trabalhadores avulsos, dos diretores e membros de conselho consultivo ou de conselho fiscal de sociedades e fundações, bem como dos sócios-gerentes e dos gerentes-delegados;

III – o valor intermediado no mercado de títulos e valores mobiliários, o valor dos depósitos bancários, o principal, juros e acréscimos moratórios relativos a operações de crédito realizadas por instituições financeiras.

Parágrafo único. Não se enquadram no disposto no inciso I os serviços desenvolvidos no Brasil, cujo resultado aqui se verifique, ainda que o pagamento seja feito por residente no exterior”.

A hipótese do inciso I já abordamos em artigo anterior, quando criticamos o disposto no parágrafo único do art. 2º que aniquila a não incidência prevista na norma ao confundir o resultado com o efeito.

O inciso II sob comento promove uma mistura generalizada entre a não incidência pura de que falamos, com a não incidência legalmente qualificada que implica restrição parcial da norma definidora do fato gerador da obrigação tributária. Quem presta serviço com vínculo empregatício já está fora do campo de abrangência do fato gerador do ISS sendo desnecessária a expressa previsão de não incidência que só serve para gerar dúvidas e confusões. É como definir o não crime, ao invés de limitar-se a definir os crimes. Realmente, o empregado é a pessoa física que presta serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário (art. 3º da CLT). Não está, portanto, abrangido pela norma definidora do fato gerador do ISS que pressupõe contrato de prestação de serviço com livre pactuação do preço do serviço prestado.

Diferente o caso dos trabalhadores avulsos que são aqueles que prestam serviços de natureza urbana ou rural, a diversas empresas mediante paga, mas sem vínculo empregatício, porém, com intermediação obrigatória do órgão gestor de mão de obra (art. 9º, VI da Lei nº 8.630/93).

Os diretores exercem função de representação da sociedade ou da fundação, praticando atos de gestão para cumprimento de suas finalidades, nos limites previstos no contrato social ou estatuto. Os membros do Conselho Consultivo opinam sobre matérias específicas, ao passo que, os membros do Conselho Fiscal fiscalizam os atos da administração da sociedade, mediante o exame de seus livros e papéis, submetendo à Assembleia-Geral o parecer sobre os negócios e operações sociais do exercício em que serviram, com base no balanço patrimonial e no balanço de resultado econômico. Os sócios-gerentes são os titulares da sociedade por cota de Responsabilidade limitada, que prestam serviços à sociedade mediante percepção de pro labore em valor fixado no respectivo contrato social. Gerentes-delegados são pessoas que não sendo sócias exercem a atividade empresária, de forma permanente, em sua sede, filial ou sucursal em razão de sua contratação pela sociedade.

Em todas essas hipóteses, não há prestação de serviço remunerado por um preço ajustado entre as partes no contrato que versa sobre a obrigação de fazer. De fato, empregados não percebem preços, mas salários; diretores e Membros do Conselho Consultivo ou Fiscal percebem pro labore que não se confunde com preço, inerente à atividade de venda de mercadorias e serviços. Gerente-delegado não passa de um empregado contratado para gerenciar a sociedade. Recebe, pois, salário e não preço.

O inciso III incorre no mesmo vício do item anterior misturando hipóteses diferentes.

A primeira parte do inciso legal sob comento, que se refere à não incidência do ISS sobre o valor intermediado no mercado de títulos e valores mobiliários, representa uma restrição à norma do subitem 10.02 que tributa a atividade de “Agenciamento, corretagem ou intermediação de títulos em geral, valores mobiliários e contratos quaisquer.” Em outras palavras, o preço decorrente de intermediação no mercado de títulos e valores mobiliários fica excluído da tributação na prestação de serviços a que se refere o subitem 10.02 da lista de serviços anexa à Lei Complementar nº 116/03.

Quanto ao valor dos depósitos bancários, o principal, juros e acréscimos moratórios relativos a operações de crédito realizadas por instituições financeiras nem seria necessária dispor sobre a não incidência tributária, pois tais valores não representam contraprestação pecuniária (preço) pela realização de operações de crédito por instituições financeiras, atividade que sequer consta da lista de serviços nos diversos subitens do item 15 pertinente às atividades do setor bancário ou financeiro.

por Kiyoshi Harada - Jurista, com 32 obras publicadas. Acadêmico, Titular da cadeira nº 20 (Ruy Barbosa Nogueira) da Academia Paulista de Letras Jurídicas.  Acadêmico, Titular da cadeira nº 7 (Bernardo Ribeiro de Moraes) da Academia Brasileira de Direito Tributário. Acadêmico, Titular da cadeira nº 59 (Antonio de Sampaio Dória) da Academia Paulista de Direito. Sócio fundador do escritório Harada Advogados Associados. Ex-Procurador Chefe da Consultoria Jurídica do Município de São Paulo.

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