O julgamento que avalia a validade de uma cobrança de R$ 188 milhões pela Receita Federal do jogador de futebol Neymar da Silva Santos Jr foi suspenso ontem pelo Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). A análise foi interrompida antes de qualquer conselheiro votar. O caso está na 2ª Turma da 4ª Câmara da 2ª Seção do órgão.
O Fisco cobra do atleta o Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF) referente aos anos de 2012 a 2014. Do total, R$ 64 milhões são valores do imposto que a Receita considera devidos, R$ 10 milhões são juros de mora, R$ 95 milhões de multa de ofício e R$ 19 milhões da multa isolada.
Para o Fisco, o atleta e os responsáveis solidários – seus pais e as três empresas que administram – teriam atuado em conjunto para deslocar a tributação da pessoa física para as empresas, em busca de tributação mais favorável. O valor pago pelo Barcelona foi considerado um bônus de contratação pela fiscalização, por isso, teria natureza trabalhista, demonstrando vínculo entre o atleta e o clube.
Na sessão, o advogado do jogador, Marcos Neder, do escritório Trench, Rossi e Watanabe, afirmou que a fiscalização não demonstrou que as empresas tinham uma estrutura dissimulada, já que não há prova de que o dinheiro entrou na conta do jogador. Tampouco que ele tenha registrado beneficio econômico com a estrutura.
Além disso, segundo o advogado, a abertura das empresas seria necessária para administrar a imagem, para que o jogador pudesse se dedicar exclusivamente à atividade esportiva e não a mais de cem contratos. "Essa é a acusação, de que as empresas são uma casca, e ele, sozinho, exerce a atividade", afirmou Neder, na sessão.
Ainda segundo a defesa, a autuação deveria descontar o valor de IR pago pela pessoa jurídica, que teria sido de cerca de R$ 30 milhões. Além disso, desde 2014 Neymar não é residente no Brasil, mas continua pagando IR por meio das empresas.
Já a procuradora da Fazenda Nacional, Lívia da Silva Queiroz, afirmou na sessão que, conforme a fiscalização verificou, a estrutura adotada tentava diminuir o pagamento de tributos. "A empresa era vazia, não tinha um funcionário sequer durante o período analisado", afirma.
Os pagamentos destinados a NR Sports deveriam ter sido pagos à pessoa física, segundo Lívia. O valor pago pela transferência ao Barcelona também foi intermediado por uma pessoa jurídica artificial, que não tinha nenhum funcionário na época, segundo a procuradora.
O julgamento foi suspenso por um pedido de vista logo depois, ainda na análise de aspectos processuais. No total, foram apontados cinco pontos processuais. Somente a relatora, conselheira Bianca Felicia Rothschild, representante dos contribuintes, votou, contra o pedido processual do jogador. Para Bianca, não seria possível declarar a nulidade da autuação por causa de eventual erro na indicação do destinatário da cobrança. O conselheiro que votaria na sequência, Ronnie Soares Anderson, representante da Fazenda, pediu vista. O processo deve voltar a ser julgado em fevereiro.
Além da esfera administrativa, Neymar também enfrenta um processo criminal por sonegação fiscal e falsidade ideológica. O processo está suspenso, por uma liminar, e só poderá voltar a tramitar se Neymar perder a disputa no Carf. Mesmo após a decisão da Turma, o atleta ainda poderá recorrer no próprio Conselho, para levar a análise à Câmara Superior do órgão administrativo.
Neymar não é o único atleta a enfrentar o Fisco. Pelo menos 405 esportistas e artistas foram autuados pela Receita Federal desde 2003. O valor total supera meio bilhão de reais, segundo dados de 2016 da Receita. Apesar de várias autuações, a tese em discussão no processo do Neymar é nova no Carf, segundo advogados que acompanham a instância administrativa.
Depois de 2005, o uso de pessoas jurídicas para receber pagamento de direitos de imagem costuma ser justificada pelos atletas com base na Lei nº 11.196, de 2005, que permite a abertura de pessoa jurídica para o recebimento de remuneração por prestação de serviços intelectuais, inclusive de natureza personalíssima. Advogados de atletas entendem que é possível fazer os pagamentos na pessoa jurídica, mas há autuações quando o Fisco entende em sentido contrário.
Em novembro, a Câmara Superior do conselho julgou um caso envolvendo o ex-tenista Gustavo Kuerten, porém, a autuação era anterior à Lei nº 11.196, de 2005. O ex-tenista foi condenado a pagar Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF) sobre contratos de patrocínio referentes ao período de 1999 a 2002 e informou, na época, que iria recorrer à Justiça.
Por Beatriz Olivon | De Brasília
Fonte : Valor
Via Alfonsin.com.br/
Nenhum comentário:
Postar um comentário