Nos últimos cinco anos, a Receita Federal aplicou cerca de R$ 184 bilhões em autuações fiscais a contribuintes que teriam realizado operações consideradas ilícitas para economizar ou deixar de pagar impostos. São Paulo, responsável pela maior parte dessas autuações, respondeu por R$ 98 bilhões, em 1.264 autos de infração e 97 representações fiscais encaminhadas ao Ministério Público Federal (MPF) com fins penais.
Pelo perfil dessas autuações, sabe-se que a totalidade das operações fiscalizadas tem algum elemento internacional, com uso de offshores ou paraísos fiscais, presentes em cerca de 50% das operações.
De acordo com Márcia, buscar a economia de tributos não é ilegal, o que não seria permitido seria a "artificialidade" das estratégias adotadas e "abuso de forma". São justamente esses termos, aliados a conceitos como dissimulação, simulação e propósito negocial que podem levar a Receita Federal a desconsiderar operações de planejamento tributário de contribuintes.
O problema, porém, é que a interpretação e aplicação desses conceitos seriam muitas vezes subjetivas, segundo advogados. Principalmente porque não há definições legais para essas concepções.
Segundo a professora e coordenadora do núcleo de direito tributário da FGV-SP, Nara Cristina Takeda, as autuações são baseadas no artigo 116 do Código Tributário Nacional (CTN) e na Lei Complementar nº 104, de 2001, que preveem a possibilidade de o Fisco desconsiderar atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador do tributo. Apesar de existir há 15 anos, essa norma ainda não foi regulamentada.
Em vista disso, a professora avalia que o contribuinte está atualmente em um cenário tenebroso. "O contribuinte precisa sempre pensar na versão que contará para análise do Fisco, caso contrário ele correrá o risco de ser autuado", diz.
Até 1996, o que valia na avaliação da Receita era a chamada forma sobre a essência. Em outras palavras, se a lei não proibisse, não era vedado. Mas após esse período, passou a valer a essência sobre a forma que considera o propósito economico da operação. "Hoje para ter uma operação válida é preciso mostrar que não é só por motivos econômicos", afirma.
O professor de direito tributário da Faculdade de Direito do Mackenzie, Edmundo Emerson de Medeiros, diz que há a possibilidade de a Receita desconsiderar um planejamento, mesmo que ele seja legal. Por isso, segundo ele, não há um manual de procedimento para essas operações.
É também necessário observar critérios como abuso de forma (forma jurídica atípica usada para realizar o negócio), dissimulação (esconder algo que existe), simulação (aparentar algo que não existe), abuso de direito (exercício do direito sem motivo legítimo e excessos intencionais), além do propósito negocial. Este, segundo o advogado Eduardo Fleury, é um conceito forte e que está codificado em vários países.
O sócio do Lobo & de Rizzo Advogados, Alexandre Siciliano Borges, afirma que hoje há a análise pelo Fisco da intenção das partes ao realizar determinada operação. O que é complicado porque é uma interpretação que não está escrita em lugar algum. Aliado a isso está o fato de existir uma diferença de tempo entre a Receita e as operações das empresas.
Como o Fisco tem cinco anos para autuar uma empresa, muitas vezes o procedimento adotado, na época, era admitido pela Receita ou pelo Carf. Segundo Borges, há operações usadas na década de 90, baseadas em orientações aceitas na década de 80, que passaram a ser desconsideradas pela Receita Federal.
Por Zínia Baeta | De São Paulo
Fonte : Valor
Via Alfonsin.com.br
Nenhum comentário:
Postar um comentário