Da recente jurisprudência do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) destacamos a formalização de três acórdãos, da 1ª, 2ª Turma e 3ª Seçōes do tribunal administrativo.
Três temas foram enfrentados no acórdão 1402-002.203, da 1ª Seção do Carf, a saber: a possibilidade – ou não – da dedutibilidade das despesas com ágio, a responsabilidade solidária, e o reestabelecimento de multa agravada em revisão de recurso de ofício.
No caso concreto, as operações que fizeram surgir o ágio foram realizadas por empresas de um mesmo grupo econômico, controladas pelas mesmas pessoas, sem a participação de terceiros não relacionados. Estes fatos e a especificidade da operação levaram os conselheiros a desqualificar a geração do ágio, pois não verificada a ocorrência do ônus em sentido estrito.
Outro ponto observado pela decisão em exame é o fato de que não teria havido qualquer desembolso pelas partes envolvidas na operação, mas, tão somente, a disposição e transação com contas de participação.
De outro giro temos o provimento parcial ao apelo voluntário interposto, reconhecida para a matéria responsabilidade solidária, afastada que foi sob o entendimento de que a solidariedade não é um instrumento de escolha de responsável tributário, mas apenas de graduação da responsabilidade daqueles sujeitos que já o compõem. Na questão examinada, a autoridade fiscal sustentou “a responsabilização de sócios com a descrição de irregularidades tributárias que implicaram na formalização do auto de infração contra a pessoa jurídica, inclusive com multa qualificada,” deixando de fazer a identificação da infração supostamente cometida pelos solidários e o respectivo enquadramento legal.
E, ao fim, temos o reestabelecimento da multa agravada verificado com a análise e provimento de recurso de ofício.
Para tanto, o colegiado, em um primeiro momento e ainda no julgamento do recurso voluntário, acolheu fundamento escorado na argumentação de que a conduta dolosa surgiu com a geração de ágio artificial. Na análise concreta do apelo de ofício, sustentou-se ter havido fraude, na conformidade do artigo 72 da Lei 4502/64, pois não restou demonstrada a dedução de custos ou despesas referentes às operações que geraram os valores de ágio que se pretendiam deduzir.
Seria prematuro afirmar, dado a natureza específica da operação objeto do acórdão aqui apresentado, ser terminativa na esfera administrativa a decisão nele consubstanciada, mas não é possível olvidarmos o fato de que a mesma está a cerrar fileira com entendimento – à qualidade – já manifestado pela Câmara Superior de Recursos Fiscais, citando neste sentido e a título exemplificativo aquela constante do acórdão 9101-002.300.
Segunda Seção
O destaque é a publicação do acórdão 2402-005.346 que, entre outras matérias, concluiu que a “participação nos lucros e resultados (PLR) paga a diretores e administradores, efetuada com base no artigo 152 da Lei 6.404/1976, tem a natureza de retribuição pelos serviços prestados à pessoa jurídica, ensejando a incidência de contribuição previdenciária“, e mais, que se porventura “ganhos com os planos de ‘stock options’ sejam tomados como remuneração, consideram-se ocorridos os fatos geradores na data em que o beneficiário possa dispor das ações sem restrição.”
E assim decidiu para o exame do tema PLR, pagos aos diretores e administradores e a consequente incidência de contribuições previdenciárias sobre tais valores, temos que a decisão colegiada ainda consignou que “o mero fato contábil, (…), de que as participações dos administradores ou diretores tenha sua origem em fração do lucro, não subverte a realidade fática segundo a qual a razão de tal pagamento ou crédito efetivar-se é a prestação de serviço à empresa, no caso, por parte dos diretores não empregados.”
Tal conclusão, aliás, deu-se após o voto condutor passar ao exame de dispositivos da Constituição, de matéria sumulada pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST), de legislações ordinárias, e por aspectos fáticos e contratuais apresentados e firmados pela contribuinte/recorrente.
Para a análise dos planos de ‘stock options’ destacaram os julgadores que “os planos de opções de ações disponibilizados por empresas aos seus empregados e colaboradores, possuem, de uma maneira geral, ínsito caráter remuneratório e não de “operação mercantil”“. Para os julgadores, econômica, financeira e contabilmente, tais opções são ativos perfeitamente precificáveis e negociáveis, não se transmutando em mera expectativa de direito e sem valor concreto.
Para o momento do fato gerador, vencido o julgador relator, ratificou o colegiado julgamento anterior (acórdão 2402-005.011) no sentido de que em o bem não se incorporando ao patrimônio, o fato gerador não pode ser considerado como ocorrido, só o podendo nas hipóteses em que as ações exercidas e disponíveis para venda poderiam ser consideradas na apuração da base de cálculo das contribuições.
Nosso interesse pelo acórdão analisado deu-se pelo fato de que, com certo ineditismo, aquele colegiado proferiu decisão que perpassou dois temas ainda bastante controversos naquele CARF e em uma mesma assentada, quais sejam: a PLR e os planos de ‘stocks options’.
Aguarda-se posicionamento conclusivo sobre tais matérias na esfera administrativa, o que reclamará minucioso exame dos casos em suas especificidades e complexidades.
Terceira Seção
Neste expediente fazemos sobressair decisão consubstanciada no acórdão 3401-003.171, no sentido de que cabe “à autoridade fiscal apresentar as provas dos fatos imputados em auto de infração, sendo a carência probatória ensejadora de improcedência da autuação.”
A partir de representação formulada pela autoridade fiscal originária, na qual constava denúncia oferecida pelo Ministério Público Federal por meio de provas colhidas por operação deflagrada pelo Departamento da Polícia Federal, verificou-se que o contribuinte/recorrente comercializou produtos importados através de um grupo constituído por diversas ‘tradings’, via interposição fraudulenta, cujo objetivo era ocultar o real adquirente daquelas mercadorias importadas.
No caso então examinado definiram majoritariamente os julgadores que não poderiam ser consideradas válidas para o processo administrativo provas que o Poder Judiciário tempos depois declarou ilícitas, provas essas que foram carreadas de modo emprestado pela fiscalização; sendo que, para as provas remanescentes e autônomas produzidas pela mesma fiscalização tributária, temos que as mesmas foram consideradas insuficientes, uma vez que no contexto em que apresentadas não foi possível definir que houvera o alegado adiantamento de recursos entre empresas por conta de operações de importação realizadas, nem ao menos para declarações registradas de importação e entre empresas terceiras.
O tema “prova emprestada” tem sido enfrentado pelo CARF em suas diferentes seções sob análises específicas e próprias, como no acolhimento de tal meio probatório, que não deve ser único e desde que garantido o direito à ampla defesa e o contraditório ao contribuinte (acórdãos 2201-003.098, 1103-000.823 e 3102-002.372); ou ainda quando no emprego da apresentação de laudos sobre produtos importados de identidade recíproca (acórdão 3302-003.077); consignando, por óbvio, que a utilização e os elementos de prova emprestada têm de ser corroborados pelos trabalhos autônomos da autoridade fiscalizadora competente (acórdão 3201-002.122), tudo, frisamos, para a finalidade de legitimar e validar o lançamento a ser levado a efeito.
Por Dalton Cesar Cordeiro de Miranda
Advogado e consultor em Trench, Rossi e Watanabe Advogados
Fonte: Jota
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