No Brasil, o método PRL (Preço de Revenda Menos Lucro) é definido como a média aritmética ponderada dos preços de venda, no país, dos bens, direitos ou serviços importados, em condições de pagamento semelhantes e calculados conforme a metodologia estabelecida no inciso II do artigo 18 da Lei nº 9.430/96.
Em síntese, na apuração do preço parâmetro pelo método PRL são utilizadas as seguintes variáveis: (i) preço líquido de venda; (ii) percentual de participação dos bens, direitos ou serviços importados no custo total do bem, direito ou serviço vendido; (iii) participação dos bens, direitos ou serviços importados no preço de venda do bem, direito ou serviço vendido; e (iv) margem de lucro, conforme setor econômico da pessoa jurídica sujeita ao controle de preços de transferência.
Para as empresas brasileiras sujeitas ao controle de preços de transferência, que exercem atividade de construção civil ou que comercializam produtos e/ou serviços envolvendo contratos a longo prazo, tais como empresas de navegação, equipamentos pesados, dentre outras, a utilização do custo orçado (ou custo estimado) e de receita estimada (ainda sujeita a reajustes), conforme definido na legislação brasileira do Imposto de Renda, gera distorções na apuração do preço parâmetro pelo método PRL, e não há previsão para que a referida apuração seja refeita e/ou ajustada após a constatação dos custos efetivos e das receitas auferidas ao final do projeto ou empreendimento.
Contudo, a questão que se coloca neste artigo é que a legislação brasileira de preços de transferência não admite a adoção de custos orçados (ou estimados) e de preços líquidos de venda presumidos no cálculo do preço parâmetro pelo método PRL. Nesse passo, entendemos que a legislação brasileira do Imposto de Renda, que dispõe sobre o reconhecimento de receitas e despesas por estimativas em contratos a longo prazo, não pode ser aplicada por analogia no cálculo do preço parâmetro pelo método PLR, como passamos a demonstrar.
Método PLR e Contratos a Longo Prazo
Nos termos do artigo 407 do Regulamento do Imposto de Renda (Decreto nº 3.000/99), contrato a longo prazo é aquele com prazo de execução superior a um ano e com preço pré-determinado. A apuração do resultado tributável do contrato a longo prazo é realizada por estimativas, conforme o disposto no próprio artigo 407 do RIR/99. Confira-se:
“Art. 407. Na apuração do resultado de contratos, com prazo de execução superior a um ano, de construção por empreitada ou de fornecimento, a preço pré-determinado, de bens ou serviços a serem produzidos, serão computados em cada período de apuração:
I – o custo de construção ou de produção dos bens ou serviços incorridos durante o período de apuração;
II – parte do preço total da empreitada, ou dos bens ou serviços a serem fornecidos, determinada mediante aplicação, sobre esse preço total, da percentagem do contrato ou da produção executada no período de apuração.
- 1ºA percentagem do contrato ou da produção executada durante o período de apuração poderá ser determinada:
I – com base na relação entre os custos incorridos no período de apuração e o custo total estimado da execução da empreitada ou da produção; ou
II – com base em laudo técnico de profissional habilitado, segundo a natureza da empreitada ou dos bens ou serviços, que certifique a percentagem executada em função do progresso físico da empreitada ou produção.
- 2º Na apuração dos resultados de contratos de longo prazo, devem ser observados na escrituração comercial os procedimentos estabelecidos nesta Seção, exceto quanto ao diferimento previsto no art. 409, que será procedido apenas no LALUR.
(…)”
Para fins de reconhecimento pelo regime de competência de despesas envolvendo contratos a longo prazo, a legislação brasileira autoriza a adoção do custo orçado correspondente a cada período de apuração, segundo o qual a empresa opta por utilizar laudo para apurar o percentual da obra já executada em cada período. Neste caso, o custo orçado é estimado, ou seja, incerto, não definitivamente apurado e sujeito a ajustes futuros.
Do mesmo modo, as receitas envolvendo contratos a longo prazo são igualmente reconhecidas pelo regime de competência com base em valores estimados. Tal como os custos, nos contratos a longo prazo o reconhecimento de receita pela empresa também se dá ao longo de um período de tempo, antes mesmo da entrega do serviço e da transferência da posse e/ou propriedade do bem, e independentemente do seu auferimento.
Assim, a lógica que norteia a apuração fiscal envolvendo contratos a longo prazo, tendo em vista o regime de competência, é o emparelhamento entre receitas e despesas durante o período de execução do projeto ou do empreendimento. Os valores reconhecidos pela empresa a cada período de apuração devem ser proporcionais ao estágio do projeto ou empreendimento. E, ao final do contrato, são realizados os ajustes decorrentes de eventual descasamento entre receita estimada e receita auferida, e custo orçado e custo real, não acarretando qualquer prejuízo em termos de arrecadação tributária.
Contudo, e de maneira absolutamente diversa, a legislação brasileira de preços de transferência não admite a adoção de custos orçados (ou estimados) e de preços líquidos de venda presumidos no cálculo do preço parâmetro pelo método PRL, ainda que o serviço e/ou produto controlado envolva contrato a longo prazo.
Com efeito, o §1º do artigo 18 da Lei nº 9.430/96 determina que os custos incorridos (e não custos orçados ou custos estimados) durante todo o período de apuração da base de cálculo do Imposto de Renda é que devem ser considerados para efeito de cálculo do preço médio ponderado a ser utilizado como parâmetro pelo método PRL.
Por sua vez, o inciso II do artigo 18 da Lei nº 9.430/96 determina que o preço líquido de venda é uma das variáveis da fórmula de apuração do preço parâmetro pelo método PRL. Além disso, o §15 do artigo 18 da Lei nº 9.430/96 determina que: “No caso de ser utilizado o método PRL, o preço parâmetro deverá ser apurado considerando-se os preços de venda no período em que os produtos forem baixados dos estoques para resultado”.
A legislação brasileira de preços de transferência exige a exatidão de todas as variáveis que compõem a fórmula de apuração do preço parâmetro pelo método PRL, principalmente no que diz respeito a despesas (custos) e receita (preço líquido de venda), o que não se verifica na utilização de custos orçados (ou estimados) e de receitas presumidas.
Além de afrontar o princípio da estrita legalidade em matéria tributária, a não utilização de variáveis exatas e imutáveis (ou seja, a não utilização do custo efetivo e da receita auferida) também conduz à apuração de um preço durante o período de execução do contrato que não teria sido pactuado entre partes independentes em condições normais de mercado, distanciando-se do princípio arm’s length.
De fato, a experiência tem demonstrado que a utilização de custo orçado e de receita estimada gera distorções na apuração do preço parâmetro pelo método PRL, tendo em vista as oscilações a que estão sujeitos os custos e as receitas no curso do próprio ano-calendário, e também a impossibilidade de neutralização futura no eventual descasamento de despesas (custo orçado x custo efeito) e receitas (receita estimada x receita auferida).
Nesse aspecto, o custo orçado e a receita estimada não constituem índices seguros para a determinação do preço parâmetro pelo método PRL. Na apuração do preço parâmetro pelo método PRL, os custos e as receitas devem ser incorridos, efetivos e reais, e não estimados ou presumidos. Daí porque o regime de reconhecimento de despesas e receitas, previsto no artigo 407 do RIR/99, ainda que admitido do ponto de vista fiscal, não deve ser simplesmente transportado para a apuração do preço parâmetro pelo método PRL, pois não se coaduna com a legislação brasileira de preços de transferência.
Dessa forma, em se tratando de contratos a longo prazo, a rigor, as empresas somente conseguirão obter com exatidão os valores dos custos e das receitas ao final do projeto ou empreendimento, quando, então, estarão perfeitamente delimitadas as variáveis para a correta apuração do preço parâmetro pelo método PRL.
Portanto, entendemos sustentável aguardar o encerramento do contrato a longo prazo para realizar o controle individual dos serviços e/ou produtos importados, efetuando-se, se o caso, o ajuste a título de preço de transferência, e não adotar o regime de reconhecimento de custos e receitas previsto no artigo 407 do RIR/99.
Conclusão
Primeiramente, repisamos que não há autorização legal para a apuração do preço parâmetro pelo método PRL com base em custos orçados e receitas estimadas, não se aplicando, desse modo, o artigo 407 do RIR/99 no controle a título de preços de transferência. Portanto, sob a ótica da estrita legalidade em matéria tributária, os custos orçados e as receitas estimadas não devem servir de variáveis para a apuração do preço parâmetro pelo método PRL.
Não bastasse, a utilização de custos orçados e receitas estimadas na apuração do preço parâmetro pelo método PRL gera distorções definitivas, pois não há previsão para revisão e/ou correção posterior do cálculo com base nos custos efetivos e nas receitas auferidas, afastando a legislação de preços de transferência do seu real propósito, que é o controle de operações entre empresas ligadas e a indevida transferência de lucros.
Assim, para atender as regras da legislação brasileira de preços de transferência as empresas devem utilizar informações exatas, especialmente no que diz respeito aos valores dos custos incorridos e das receitas auferidas no período de apuração, ainda que se trate de contrato a longo prazo, o que só é possível, a rigor, na conclusão do projeto ou empreendimento. Dessa forma, entendemos que o cálculo dos preços de transferência deverá ser realizado no ano-calendário da conclusão do projeto ou empreendimento, momento em que será possível a determinação de todos os custos incorridos e das receitas auferidas relativamente ao contrato a longo prazo.
Por Júlio M. de Oliveira - Mestre e Doutor em Direito Tributário pela PUC/SP, professor nos cursos de especialização da USP, IBET e GVlaw e sócio do escritório Machado Associados.
Luís Rogério G. Farinelli - Especialista em Direito Tributário e sócio do escritório Machado Associados.
Renato Silveira - Mestre em Direito pela PUC/SP, Especialista em Direito Tributário pela PUC/SP e pelo IBET e sócio do escritório Machado Associados.
Fonte: Jota
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