Boa parte das negociações entre supermercados e indústria ainda se baseia no mark up. Mas adotar a margem de contribuição em valor ajuda a tomar decisões mais assertivas
Utilizar o mark up (cálculo do preço de venda a partir do valor de compra da mercadoria) pode trazer um ganho "ilusório". A melhor alternativa é adotar a margem de contribuição, que parte do preço de venda e desconta as despesas associadas ao item, como as operacionais e os tributos. Segundo os especialistas, essa análise deve considerar sempre a margem em valor e não em percentual.
A ideia é saber quais produtos trazem uma boa massa de dinheiro e, a partir daí, calibrar as decisões. Porém, mesmo quando o varejista está ciente disso, encontra dificuldades de levar a margem de contribuição para as negociações.
Enquete realizada pelo Portal SM, da qual participaram 100 varejistas, revelou que mais da metade (54%) afirma que os fornecedores não utilizam essa metodologia. "Isso acontece porque é mais difícil realizar os cálculos para chegar à margem de contribuição", diz Haroldo Monteiro, professor da Ibmec/RJ. Também dificultam a abordagem práticas como a cultura do imediatismo e a concentração de compras no fim do mês.
Os principais benefícios
O grande trunfo da margem de contribuição é trazer para a negociação maior clareza sobre a lucratividade em valor dos produtos. Rodney Wernke, consultor de custos e finanças, explica as vantagens tanto para o varejo como para a indústria
- Redefinir as compras identificando em quais SKUs o volume pode ser reforçado para elevar o lucro e em quais deve ser reduzido, por não garantir resultados tão bons
- Identificar os produtos que podem gerar maior lucro a partir de promoções em função do aumento das quantidades vendidas
- Definir metas comuns e mais realistas de lucratividade entre indústria e varejo
- Definir o portfólio ideal da indústria dentro de cada empresa varejista
- Alterar layout de exposição, dedicando os locais nobres da gôndola para itens que geram maior massa de lucro
- Identificar os itens que responderão melhor a iniciativas, como degustação
Atenção a giro e volume
A margem de contribuição não pode se resumir ao cálculo sobre preço de venda, descontados os custos. É preciso analisar volume e giro de estoque do item para aferir o lucro com precisão
É comum, para quem já adota a margem de contribuição, resumir a operação ao cálculo sobre o preço de venda com os devidos descontos. Mas Frederico Zornig, CEO da Quantiz Pricing Solutions, lembra que a metodologia deve contemplar também duas outras variáveis importantes: o volume de vendas e o giro de estoque.
Se um produto tem alto volume de vendas, o lucro total em valor será superior ao de um item que tem margem de contribuição maior, mas as vendas são inferiores. Um item que gera, por exemplo, margem de contribuição de R$ 3 e vende 100.000 unidades, vai render R$ 300 mil. Já outro que oferece margem de R$ 7, mas tem volume de 25.000, renderá R$ 175 mil.
O giro do estoque também deve ser agregado ao cálculo para garantir maior precisão nos resultados e decisões. "Caso o produto gire quatro vezes no mês, a margem de contribuição total se multiplicará por quatro", ressalta. No exemplo do item que gerou lucro de R$ 300 mil, se considerarmos um giro de 4 vezes, o resultado se transformará em R$ 1,2 milhão no fim do mês. Zornig afirma que não compensa investir tempo na negociação de itens que giram pouco e não garantem boa lucratividade.
Lá na frente, diz ele, esse produto levará o varejo a mobilizar capital de giro, pois o prazo de pagamento ao fornecedor costuma ser inferior ao giro. Outro risco é ter de realizar promoções para queimar estoque, o que implica reduções drásticas de margem. Quando isso acontece, o fornecedor também perde, pois as próximas negociações ficam prejudicadas.
Apesar das vantagens que a análise conjunta de margem de contribuição, volume e giro traz aos negócios, ainda é difícil implementá-la. Para Zornig, as barreiras são maiores entre o médio e pequeno varejo, que, com frequência, não contam com as ferramentas necessárias – sobretudo softwares de gestão. Ele cita o caso de uma rede de cinco lojas em que o conceito não foi implementado pela falta de dados confiáveis de estoques.
Cuidados a serem tomados
Identificar o preço de venda correto pode não ser simples, mas é essencial para o sucesso do cálculo. Vale sempre considerar o preço praticado no mercado local
Um dos desafios da indústria e do supermercado no uso da margem de contribuição é a identificação correta do preço de venda. Ari Kertesz, sócio da consultoria McKinsey, afirma que se o preço de referência estiver errado, a margem de contribuição calculada será "teórica". Ele explica que os equívocos acontecem dos dois lados.
Pelo lado da indústria, é comum chegar com uma sugestão de preço inadequada por adotar um valor nacional ou regional, sem considerar as particularidades do cliente. Já os supermercados, muitas vezes, decidem trabalhar com margens muito elevadas, que prejudicam o giro de itens sem pesquisa de preços.
Para evitar as distorções, Kertesz explica que o ideal é tomar como base de cálculo o preço praticado no mercado local. Essa informação deve ser compartilhada com a indústria. A partir dela, é possível deduzir os custos e identificar a margem proporcionada pelo item. Isso permite chegar a uma melhor estimativa do custo adequado da mercadoria, o que poderá nortear a negociação.
Assim é possível ter um preço ao consumidor que gere um bom volume de vendas, garantindo boa rentabilidade final para os dois lados.
Deve-se ainda ter atenção ao cálculo da margem de contribuição quando o produto é bonificado. Segundo Alfredo Pinto, sócio da consultoria Bain & Company, à cifra final da margem de contribuição devem ser somados os valores referentes às verbas recebidas. Por exemplo: se a margem do produto for de R$ 30 mil e o varejista tiver recebido uma bonificação de R$ 10 mil do fornecedor pela participação no tabloide e outra de R$ 7 mil pela presença numa ponta de gôndola, o ganho total será de R$ 47 mil. "A indústria e o varejo precisam trabalhar com as informações consolidadas", explica o executivo. Dessa forma, conseguem identificar os diferentes componentes de lucratividade.
Virar a chave das negociações para a margem de contribuição pode não ser fácil, mas é importante implementar a mudança passo a passo, e de maneira consistente, para lucrar mais lá na frente.
Fonte: SM
Nenhum comentário:
Postar um comentário