Abandonar significa deixar para trás, despreocupar-se da execução de uma determinada obrigação que, em tese, tem-se que por em prática no mundo fenomênico por consequência de alguma ligação direta ou indireta existente entre as partes interessadas. Podendo, é claro, ser também uma obrigação de um só. E mais, abandonar, no sentido literal da palavra, representa uma renúncia a algo. Já no sentido psicológico, demonstra a manifestação de uma vontade consciente ou inconsciente de não executar uma determinada obrigação unicamente pessoal ou que envolva outras partes.
Atraindo esse conceito para o Direito do Trabalho, mais precisamente dentro da relação de emprego, pode-se afirmar que o abandono de emprego retrata uma renúncia intencional do empregado para com as atividades que se propôs executar em prol de um determinado empregador, por meio de um contrato de trabalho.
Nesta linha, evidenciam-se dois elementos, o objetivo e o subjetivo. Quanto ao objetivo, este se caracteriza pelo abandono propriamente dito, é a configuração material do instituto. Já o subjetivo (animus abandonari), assinala-se pelo intuito que motiva o empregado a abandonar as suas atividades, qual seja, não querer mais continuar a relação de emprego.
Assim, é de fácil percepção que quando se trata de abandono de emprego, obrigatoriamente a conduta do empregado deverá ser voluntária, isto é, se for o caso de ausência justificável, por motivos de força maior, que gere ao obreiro uma situação em que não há escolha senão faltar ao trabalho, não há falar em abandono de emprego. Deste modo, a palavra chave para configurar o abandono é a voluntariedade.
Mesmo que esteja o trabalhador diante de uma situação que lhe obrigue a se ausentar do trabalho, ele deverá informar ao empregador tal situação, por medida de bom senso, comprometimento e responsabilidade. Até mesmo para evitar penalizações inoportunas.
Afora esses elementos, o abandono de emprego necessita de uma conformidade temporal que deixe claro as intenções do empregado em renunciar às suas atividades, isto é, necessário se faz que estejamos diante de faltas injustificadas que ultrapassem um limite razoável de tolerância. Mas qual seria esse limite? A CLT e a legislação trabalhista não trazem expressamente essa informação.
Por tal motivo, pela imprevisão legal acerca deste lapso temporal, é que a jurisprudência estabeleceu o número superior a trinta dias de faltas injustificadas como condição capaz de configurar o abandono. Tal entendimento materializou-se na súmula 32 do TST. Logo, havendo faltas injustificadas inferior ou igual a trinta dias não há falar em justa causa, pois somente após o trigésimo dia completo, isto é, se o empregado não aparecer no trigésimo primeiro dia é que se configura, para a jurisprudência, o abandono de emprego. Lembrando que os dias de faltas devem ser consecutivos.
Ainda, um ponto fundamental no estudo deste instituto é a publicação ou não em jornal de grande circulação a respeito da intenção do empregador em dispensar o empregado renunciante por justa causa por motivos de abandono de emprego.
Durante muito tempo foi dado eficácia a esta prática. Todavia, a jurisprudência é pacífica quanto à ineficácia dessa publicação, pelo fato de que, primeiro, o empregado não tem a obrigação de ler jornal, segundo, porque a partir do momento em que uma informação dessas se torna pública, estar-se-á vinculando informações particulares e expondo a vida privada. E em terceiro lugar, e a razão mais forte para não cometer esse erro, é pelo simples fato de que não há previsão legal impondo que para validar o ato de dispensa por justa causa em decorrência de abandono de emprego seja imprescindível a publicação em jornais de grande circulação. Além do mais, o empregador poderá utilizar de outros meios para notificar o empregado, seja por via postal, email, pessoalmente ou até mesmo pela via judicial. Lembrando, oportunamente, que tal prática, quando devidamente comprovada, gera direito a indenização por danos morais.
Portanto, é importante que a empresa notifique mais de uma vez o empregado ausente para explicar as inúmeras faltas injustificadas, dentro de um prazo hábil, solicitando o seu comparecimento para reassumir as suas atividades. Tal prática gera uma segurança para o empregador e garante o direito de defesa do empregado para expor os motivos da sua ausência.
Assim, estando presentes todos os requisitos acima, estar-se-á diante de uma situação de abandono de emprego.
Caracterizado o abandono de emprego, o efeito rescisório do contrato de trabalho por justa causa se perfaz, pondo fim as obrigações contratuais.
O artigo 482 da CLT taxa um rol de hipóteses em que o empregador poderá rescindir o contrato de trabalho por justa causa. Sempre lembrando que quando se trata de justa causa no Brasil, devemos ter sempre em mente que estamos diante de um rol taxativo, isto é, o empregador poderá dispensar por justa causa o empregado somente quanto este cometer qualquer conduta prevista nas alíneas do mencionado artigo. Caso contrário, não cabe a dispensa por justa causa.
Ainda, oportuno lembrar que somente a lei é fonte formal típica. Nem mesmo norma coletiva de trabalho poderá elencar e discriminar condutas que permitam a dispensa por justa causa além das elencadas no artigo 482 da CLT.
A justa causa do empregado tem implicações quanto aos direitos relacionados com a extinção do contrato. Despedido por justa causa, o empregado perde o direito à indenização, aviso prévio, 13º salário proporcional e férias proporcionais, recendo tão somente férias vencidas (se houver) e saldo de salário. O empregado sofre outra sanção: não poderá movimentar os depósitos do FGTS, que ficarão retidos para levantamento posterior havendo causa superveniente.
Sendo assim, o empregador deverá tomar as devidas precauções para evitar futuras ações trabalhistas com pedido de reversão da justa causa ou danos morais se for o caso, pois quando o assunto é justa causa o preenchimento de todos os requisitos de validade do ato obrigatoriamente deverá ser evidenciado.
E a maneira mais eficaz de prevenção e segurança na tomada de decisões na vida cotidiana empresarial é o investimento em advocacia preventiva, por meio de consultas prévias, com tempo hábil para o profissional advogado prestar os esclarecimentos necessários à obtenção do pretendido. Evitando, portanto, condenações trabalhistas desnecessárias.
De igual modo para o empregado, que consultando um advogado, poderá tomar ciência de seus diretos e deveres numa relação de emprego, evitando, também, situação que seja prejudicial a si e a seu empregador.
por Edgar Herzmann
Fonte: OAB/SC
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