As empresas ganharam uma nova esperança no caso tributário mais conturbado em tramitação no Supremo Tribunal Federal (STF): a exclusão do ICMS da base de cálculo da Cofins. Trata-se de uma disputa entre o Fisco e as empresas estimada em R$ 90 bilhões, que aguarda uma decisão da Corte desde 2006, quando começou a ser julgada.
O alento às empresas está em um despacho do ministro Celso de Mello, o decano do Supremo. No documento, o magistrado aceitou um pedido da Confederação Nacional dos Transportes (CNT) para determinar o retorno do julgamento de um recurso extraordinário no qual a empresa Auto Americano já tem maioria de votos – seis a favor dentre 11 possíveis.
O despacho é importante porque, após um pedido de vista no recurso da empresa, os ministros concluíram que o tema deveria ser decidido em outro processo – uma ação declaratória de constitucionalidade (ADC) ajuizada, em outubro de 2007, pela Advocacia-Geral da União (AGU). A questão, portanto, voltaria a ser discutida do zero.
Apesar da prioridade sobre o RE, a ADC nº 18 não começou a ser julgada. Como alguns ministros que votaram o caso em 2006 se aposentaram, o risco de a Corte decidir a questão na ADC de forma contrária às empresas é maior. Já no recurso, elas venceriam por seis votos a um. Falta colher apenas os votos que restam e declarar a vitória das companhias sobre o Fisco.
No despacho, o ministro Celso de Mello, que é relator da ADC, determinou que o recurso de 2006 seja enviado ao presidente do STF e retorne à pauta. Advogados devem esperar que o autal presidente, Joaquim Barbosa, deixe a Corte (ele já anunciou sua aposentadoria) para renovar esse pedido ao futuro presidente, Ricardo Lewandowski.
"Cumpre ressaltar, por relevante, que a existência de ADCs não impede que se julguem recursos extraordinários ou outras causas em cujo âmbito tenha sido instaurado idêntico litígio constitucional", afirmou o ministro. A diferença é que nas ADCs, a decisão do Supremo vale para todos os contribuintes, enquanto que, nos recursos extraordinários, a Corte julga o pedido de uma empresa específica e, depois, decide se amplia esse entendimento aos processos que questionam o mesmo fato.
"Tenho para mim que o pleito formulado pela CNT haverá de ser por ela dirigido, diretamente, ao excelentíssimo senhor ministro presidente do STF, a quem incumbe compor a pauta do plenário desta Corte e apregoar os processos cujo julgamento deva prosseguir", disse o ministro Celso de Mello.
O recurso extraordinário da Auto Americano, uma distribuidora de autopeças, que deve ser retomado chegou ao STF em 1998, mas começou a ser votado apenas oito anos mais tarde. O ministro relator Marco Aurélio Mello, Lewandowski, Cármen Lúcia e os hoje aposentados Carlos Ayres Britto, Cezar Peluso e Sepúlveda Pertence foram favoráveis ao contribuinte.
Os seis ministros seguiram a tese das empresas de que o ICMS não faz parte do faturamento das companhias e, portanto, não poderia ser incluído na base da Cofins. Apenas o ministro Eros Grau (hoje aposentado) foi a favor do Fisco. Gilmar Mendes pediu vista, adiando a proclamação da decisão. Além dele, faltam os votos de Joaquim Barbosa, Celso de Mello e de Rosa Weber.
Em 2007, a estratégia da AGU de ajuizar a ADC e tentar "anular" o julgamento do recurso extraordinário provocou revolta entre contribuintes e tributaristas que acompanham o Supremo, pois saíram de uma causa ganha para um cenário de incerteza absoluta.
A aposentadoria de Barbosa, que já foi anunciada pelo ministro e aguarda apenas a publicação no Diário Oficial, deve levar muitos tributaristas a fazerem novos pedidos ao Supremo para que seja retomada a análise da disputa a partir de recurso extraordinário. Como Barbosa dialoga pouco com os tributaristas, esses devem aguardar a posse de Lewandowski para pedir a inclusão do processo da Auto Americano na pauta a partir de agosto.
Um dos advogados da CNT, Fábio Andrade, do Andrade Advogados Associados afirma que está finalizando uma petição sobre o tema para ser enviada ao presidente do Supremo. O requerimento, entretanto, só deve ser analisado em agosto após o fim do recesso do Judiciário.
Andrade defende a tese de que o Supremo decida a questão pelo recurso extraordinário, que já começou a ser julgado pela Corte. "Ultimamente temos visto uma tendência do tribunal de privilegiar o julgamento da questão, pouco importando o instrumento processual", afirma.
A inversão da ordem de julgamento foi pedida também pela advogada da Auto Americano, Cristiane Romano, do escritório Machado Meyer Sendacz e Opice Advogados. Em junho, a representante da companhia requereu ao relator do recurso extraordinário, ministro Marco Aurélio, que o processo fosse retomado. No dia 13 de junho, o pedido foi reencaminhado ao gabinete do ministro Gilmar Mendes, mas não houve qualquer despacho em relação ao pedido.
Cristiane vê na publicação do ministro Celso de Mello a possibilidade de finalizar o caso no qual atua desde 1998. "Nada mais sensato do que continuar o julgamento em que já há sete votos dados", afirma.
Procurada pelo Valor, a AGU informou que ainda não foi notificada sobre o despacho.
Apesar de a discussão no Judiciário não ter se encerrado, a Receita Federal abriu, em outubro do ano passado, um parcelamento especial destinado aos débitos relacionados à discussão sobre a inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e da Cofins. A Lei nº 12.865 autorizou a redução de até 100% das multas e juros para os contribuintes que pagarem os débitos à vista. Para o parcelamento em até 60 prestações a redução das multas é de 80% e dos juros de 40%.
Contexto
A ADC nº 18 foi proposta pela União em 2007 como estratégia para tentar reverter a derrota iminente do Fisco na discussão bilionária sobre a exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS/Cofins. A ação foi proposta na época em que Dias Toffoli estava no cargo de advogado-geral da União, Atualmente no Supremo, Toffoli ocupa a cadeira que pertenceu a Sepúlveda Pertence e, portanto, estaria impedido de votar no recurso da Auto Americano. Se o caso for retomado em agosto, a partir da ADC, três ministros que foram a favor da tese das empresas – Ayres Britto, Celso Peluso e Pertence – não participarão por já estarem aposentados. Por outro lado, Eros Grau, que votou a favor do Fisco, também já não está na Corte. Com isso, na ADC, um suposto placar inicial seria de três votos (Marco Aurélio, Lewandowski e Cármen). Se o caso for retomado a partir do recurso extraordinário, os votos dos ministros que já se manifestaram continuam valendo.
Fonte: Valor | Por Juliano Basile e Bárbara Mengardo
Via Alfonsin.com.br
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