Em que pese o tema sobre a ilegalidade da incidência do ICMS na tarifa de energia tenha sido objeto do artigo “Incidência do ICMS na tarifa de energia é ilegal”, o objetivo do presente texto é apresentar as recentes novidades acerca do assunto.
A conclusão do artigo anterior foi pela “ilegalidade da incidência do ICMS das parcelas estranhas à remuneração de energia elétrica (por exemplo Tusd e Tust)”.
Nesse sentido, o presente artigo tratará: (a) da publicação da Lei Estadual 16.886, de 21 de dezembro de 2018; e (b) do julgamento do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas 2246948-26.2016.8.26.0000 do Tribunal de Justiça de São Paulo.
(a) Lei Estadual 16.886, de 21 de dezembro de 2018
Em 22/12/2018, o estado de São Paulo publicou a Lei 16.886, de 21 de dezembro de 2018. A referida lei determinou a inclusão do parágrafo único no artigo 4º da Lei 6.374, de 1 de março de 1989. Vejamos:
Artigo 1º - Fica incluído no artigo 4º da Lei nº 6.374, de 1º de março de 1989, que dispõe sobre o Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS), o seguinte parágrafo único:
“Artigo 4 - ................................................................
Parágrafo único - Nas operações de fornecimento de energia elétrica a unidades consumidoras sujeitas à tarifa binômia, decorrentes da celebração de contratos com a concessionária de energia elétrica, não será exigido o recolhimento do imposto relativamente ao valor que corresponde à parcela referente à demanda de potência não utilizada pelo consumidor”.
Em uma leitura desatenta do referido dispositivo, pode-se concluir que a grande discussão acerca da incidência do ICMS na tarifa de energia tenha sido resolvida, o que, infelizmente, não é verdade. Vejamos:
Primeiramente, o dispositivo somente beneficia as “unidades consumidoras sujeitas à tarifa binômia”. Portanto, a primeira dúvida que surge é quem são os consumidores beneficiados?
Simples, são as “unidades consumidoras com fornecimento em tensão igual ou superior a 2,3 kV, ou atendidas a partir de sistema subterrâneo de distribuição em tensão secundária”, definidos como “Grupo A”, nos termos do artigo 2º, inciso XXXVII, da Resolução Normativa Aneel 414/2010.
Ou seja, a maioria dos consumidores não será beneficiada com o referido dispositivo.
Outra dúvida que surge é com a publicação da Lei 16.886, de 21 de dezembro de 2018. O ICMS somente incidirá na parcela relativa à energia elétrica?
Não, o parágrafo único, artigo 4º, da Lei 6.374/1989 somente afasta a incidência da demanda de potência não utilizada pelo consumidor, sendo, em regra, o referido montante insignificativo quando comparado com as demais rubricas da fatura de energia elétrica.
Do ponto de vista físico, a demanda de potência representa a garantia do consumidor de que a concessionária de distribuição irá fornecer a quantidade de energia elétrica contratada, por meio dos sistemas elétricos da distribuidora.
Deste modo, conclui-se que:
(i) em que pese a publicação da lei represente uma vitória aos consumidores, a redução obtida pela lei é irrisória;
(ii) embora o estado de São Paulo busque desvirtuar a aplicação da Súmula 391/STJ[1], já que a referida súmula foi confeccionada com base em decisões judiciais que afastaram a incidência do ICMS de parcelas estranhas à remuneração de energia elétrica, incluindo, mas não se limitando à Tarifa do Uso do Sistema de Distribuição (Tusd), à Tarifa do Uso do Sistema de Transmissão (Tust), à demanda contratada e aos encargos setoriais, a Lei 16.886, de 21 de dezembro de 2018, fortalece a ilegalidade da incidência do ICMS nas tarifas de energia; e
(iii) a inserção do parágrafo único, o artigo 4º da Lei 6.374/1989 beneficia os consumidores nas discussões judiciais, já que a natureza jurídica da demanda contratada não utilizada, assim como toda demanda contratada, Tusd e encargos setoriais não visam remunerar a energia elétrica.
(b) Do julgamento do IRDR do TJ-SP
Como já abordado no artigo anterior, a instauração de IRDR pelo TJ-SP e STJ foi equivocada, já que carece de requisitos legais, pois, segundo a disposição prevista no parágrafo 4º, artigo 976, do CPC, será incabível a instauração de IRDR nos casos em que já houver recurso afetado sobre a matéria.
No caso em tela a matéria já foi submetida e materializada pelas súmulas 166 e 391 do STJ.
Portanto, além de não observar os requisitos essenciais para instauração do IRDR, a decisão que instaurou o incidente não observou o sistema de precedentes implementado pelo Código de Processo Civil.
Nesse sentido, em continuidade ao IRDR estabelecido pelo TJ-SP, a Turma Especial de Direito Público do TJ-SP, no dia 8 de fevereiro, por maioria de votos, determinou a suspensão do IRDR e demais processos sobre o tema até a decisão da matéria pelo STJ (Tema 986).
Registra-se que, de acordo com o Código de Processo Civil, a referida decisão do TJ-SP e/ou o IRDR do STJ não impede a concessão de decisões favoráveis em 1ª e 2ª instância aos consumidores.
Por fim, em consonância com o exposto, destaca-se, ainda, que, na prática, o Poder Judiciário vem concedendo diversas decisões judiciais favoráveis aos consumidores.
[1] Súmula 391 – O ICMS INCIDE SOBRE O VALOR DA TARIFA DE ENERGIA ELÉTRICA CORRESPONDENTE À DEMANDA DE POTÊNCIA EFETIVAMENTE UTILIZADA.
Urias Martiniano G. Neto é sócio especializado na área de energia elétrica do Tomanik Martiniano Sociedade de Advogados.
Fonte: Conjur
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