O governo de Santa Catarina prevê concluir em fevereiro um relatório sobre os incentivos fiscais existentes no Estado. A ideia é revisar e mudar a política de isenção diferenciando os produtos de consumo popular de produtos de primeira linha, valorizando a produção catarinense e a economia local. É a partir desse estudo que se buscará a redução prevista de R$ 750 milhões nos benefícios oferecidos em 2019.
A medida atende a lei orçamentária aprovada ano passado pelos deputados estaduais, que define a redução gradual da renúncia fiscal de 2019 até 2022, fixando limite máximo de 16% da receita bruta de impostos — hoje o índice é de 25%.
Em 2018, os benefícios fiscais concedidos em SC chegaram a aproximadamente R$ 5,8 bilhões, incluindo isenções, os créditos presumidos, reduções de base de cálculo e outros incentivos fiscais que reduzem o montante do tributo a ser arrecadado. Alguns dos chamados produtos supérfluos já perderam a vantagem, como filé mignon, salmão, azeite de oliva e vinho, e a situação deve se repetir com outros deles ao longo de 2019. A Secretaria da Fazenda diz que a redução dos incentivos nesses itens ocorrerá de maneira “progressiva e cautelosa”, sem especificar quais produtos.
Além dos supérfluos, serão revistos os benefícios fiscais que apresentam alguma distorção, seja porque as razões de sua concessão não subsistem mais nos dias de hoje, seja porque seu valor foi excessivo ou ainda porque ele não conseguiu atingir seu objetivo junto à sociedade.
— Estão sendo revisados todos os benefícios fiscais que ainda são concedidos, com objetivo de analisar a relevância social e econômica de cada item para decisão da continuidade ou não dos mesmos. A redução está sendo gradual, já iniciamos o processo no ano passado com itens considerados de primeira linha. Embora tenham os cortes nas isenções fiscais, é importante destacar que estamos trabalhando para valorizar a produção catarinense, fomentando a economia no Estado para gerar mais empregos e, assim, aumentar a arrecadação — destaca o secretário da Fazenda, Paulo Eli.
Preocupação do setor produtivo
Nesse sentido, decreto assinado ainda pelo então governador Eduardo Pinho Moreira (MDB), em dezembro, revogou a concessão de ICMS reduzido nos produtos da cesta básica. Com isso, o imposto incidente sobre produtos como feijão, arroz, macarrão, farinha e pão passa de 7% para 12%, com um aumento de 58,3%. O decreto só terá vigência no dia 1º de abril deste ano, obedecendo o período de “noventena”. Ao mesmo tempo, esse relatório das revisões previsto para fevereiro trará uma lista dos produtos que serão incluídos na cesta básica com ICMS de 7% para assinatura de um novo decreto. Portanto, a expectativa é de que ainda haja adequações nos itens da cesta básica.
Na semana passada, o presidente da Federação das Indústrias de Santa Catarina (Fiesc), Mario Cezar de Aguiar, se reuniu com o governador Carlos Moisés da Silva (PSL) e manifestou preocupação com os impactos dos decretos assinados em dezembro, pedindo a revogação das medidas. Segundo Aguiar, elas atingirão negócios já celebrados e aumentarão preços dos produtos de primeira necessidade para o consumidor final. Conforme a Fiesc, Moisés prometeu levar o tema ao comitê criado pelo governo para tratar do assunto.
— Sempre tivemos diálogo aberto com todas as entidades do setor produtivo no Estado. A publicação dos decretos foi necessária para que todos os itens voltassem a ter o mesmo percentual de ICMS para, em seguida, considerar em quais casos manteremos a renúncia ou não. É um trabalho minucioso, pois estão sendo analisados mais de 80 mil itens, caso a caso. Reiteramos que nosso objetivo é atender os preceitos da LDO, diminuindo o percentual de benefícios fiscais, contudo, sem prejudicar o setor produtivo nem os consumidores catarinenses — diz Eli.
Especialista defende estudo minucioso
Mestre em Desenvolvimento Econômico, o economista e professor da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) João Rogério Sanson destaca a importância do estudo minucioso por parte do governo estadual para avaliar onde e quanto é possível diminuir de incentivos. O especialista comenta que a tendência é se aprovar uma lei com benefícios desse tipo e depois “esquecer” dela, não fazendo revisões periódicas:
— Momentos de crise econômica e com mudança de governo é que acabam permitindo mexer nisso. O ideal, do ponto de vista técnico, é que você, ao conceder, já tenha a previsão de que a cada determinado período de tempo vai fazer uma reavaliação de cada produto.
Para Sanson, esta reavaliação precisa necessariamente passar pela análise do custo-benefício para a economia do Estado.
— Se dá (o incentivo) em nome da geração de emprego, tem que avaliar se gerou emprego; se é em nome de atrair novas empresas ao redor de uma ou daquilo que facilite a produção de outros bens, tem que acompanhar se está acontecendo o resultado e de que forma — exemplifica.
Sem padrão entre os Estados
Não existe uma política fiscal única para os Estados e a maioria deles também não têm _ou pelo menos não tinham até agora — critérios e controles claros em relação aos incentivos.
O governo do Rio Grande do Norte, por exemplo, buscará a partir deste mês saber quanto deixa de arrecadar com isenções fiscais concedidas às empresas ao longo do ano. Ao todo, o estado tem 216 benefícios de isenção de ICMS, além de outros programas com benefícios. A Secretaria de Tributação diz que hoje não tem o número da renúncia total porque o governo não tinha ferramentas de tratamento de dados que permitam fazer esse levantamento. Por isso, o RN busca um financiamento junto ao Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) para desenvolver o projeto Profisco 2, com objetivo de modernizar a estrutura tecnológica e de dados da tributação potiguar.
No Ceará, a administração estadual anunciou que está trabalhando para remodelar a política fiscal, que hoje contempla basicamente a indústria. A ideia é abranger as áreas de serviços como novas tecnologias e o pequeno empreendedor, com regras mais claras e justas.
No Paraná, depois de anos com as Leis de Diretrizes Orçamentárias (LDOs) trazendo apenas informações vagas e resumidas, o documento de 2018 com previsão para 2019 mostra detalhadamente os valores, que chegam a R$ 10 bilhões para este ano. O setor da alimentação é o mais beneficiado, com R$ 3,9 bilhões em renúncia de ICMS. Depois vem o incentivo de R$ 1 bilhão ao comércio.
No Rio Grande do Sul, a concessão de incentivos fiscais chegou a ser alvo de investigação do Ministério Público por falta de transparência nas informações. Após a ação, a Secretaria da Fazenda passou a publicar a lista com as empresas beneficiadas.
Bolsonaro também prevê revisão
A análise mais recente do Tribunal de Contas da União (TCU) sobre as contas do governo federal, de 2017, mostra que as renúncias fiscais somaram R$ 354,7 bilhões naquele ano. O montante equivale a 30% da receita líquida do governo no ano e supera os déficits da Previdência Social e do regime de aposentadorias dos servidores federais, que somaram R$ 268,8 bilhões em 2017. Segundo o TCU, 84% das renúncias têm prazo indeterminado, o que faz a perda de arrecadação ser incorporada às contas do governo.
A Lei de Responsabilidade Fiscal determina que cada renúncia fiscal seja custeada com alguma receita, seja com o aumento de outros tributos ou com a alta da arrecadação gerada pelo desenvolvimento da economia. O TCU, no entanto, constatou que 44% dos incentivos fiscais não são fiscalizados por nenhum órgão, o que levou o ministro Bruno Dantas a recomendar que os ministérios da Fazenda, do Planejamento e da Casa Civil montem um grupo de trabalho para verificar a eficácia das renúncias fiscais.
Agora, o governo de Jair Bolsonaro (PSL) tem na revisão de benefícios tributários um dos eixos para o reequilíbrio das contas públicas A equipe econômica trabalha com dois cenários: um corte linear de 10% em todos os benefícios tributários ou uma redução concentrada em cinco programas _ revogação completa da desoneração da folha de pagamento em 2019, redução de 15% da renúncia com o Simples Nacional (regime especial para micro e pequenas empresas) e o programa de Microempreendedor Individual, instituição de um limite para a dedução de despesas médicas no Imposto de Renda, diminuição das faixas de isenção para declarantes com mais de 65 anos e a redução dos tipos de produtos da cesta básica com isenção.
Fonte: Diário Catarinense
Via CRC/SC
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