Vez por outra, como agora, o governo federal tenta criar regras para facilitar a repatriação de valores mantidos por brasileiros no exterior e não declarados previamente ao fisco no Brasil. A reação contrária a essas regras é forte e imediata e o principal argumento é que elas são injustas com os contribuintes que recolhem regularmente impostos sobre bens e valores mantidos no Brasil e no exterior. No limite, argumenta-se que tal providência seria “imoral”.
A questão da “moralidade” deve ser também analisada em cotejo com a conduta do próprio Estado. Durante anos o contribuinte brasileiro viveu na total insegurança sobre qual seria a carga tributária a ser adotada no ano fiscal seguinte, o que certamente era um estímulo à evasão fiscal mediante transferência dos ganhos tributáveis para algum paraíso fiscal.
Além disso, na esteira de governos de viés autoritário foram adotados “choques” fiscais sem aviso prévio. Um desses choques, por exemplo, foi perpetrado pelo governo Collor que aumentou substancialmente a carga fiscal sobre a renda das pessoas físicas e jurídicas nos primeiros dias de sua gestão. É evidente que esse tipo de política cria um clima de insegurança que se torna um tremendo estímulo à sonegação.
Ocorre ainda que as exigências burocráticas para a internalização de bens e valores oriundos do exterior são uma via crucis mesmo para bens previamente declarados pelo contribuinte ao fisco brasileiro. Por exemplo, a transferência de valores oriundos de contas bancárias no exterior mantidas e declaradas pelo contribuinte no Brasil. O banco privado ou estatal no Brasil adota regras estapafúrdias para apurar a origem do dinheiro que se pretende internalizar. E não adianta o contribuinte declarar “sob as penas da lei” que a origem é lícita. Isto porque o banco brasileiro tem receio de ser responsabilizado por eventuais irregularidades nas declarações do interessado. Mesmo os grandes bancos só operam com pessoas e empresas deles conhecidas.
Uma providência elementar é retirar do banco brasileiro a obrigação de verificar a origem dos recursos a serem internalizados. Essa prova deve ser suprida pela declaração do próprio titular de que os recursos são de sua propriedade, cabendo-lhe a responsabilidade por qualquer prévia irregularidade. É assim que funciona o princípio da presunção da veracidade. Manter no banco a responsabilidade pela apuração da licitude dos recursos a serem internalizados é um entrave burocrático praticamente insuperável.
De resto, o maior interessado na repatriação de recursos do exterior é, como se sabe, o próprio governo brasileiro que com isso aumenta suas reservas em moeda estrangeira.
Por João Geraldo Piquet Carneiro
Presidente do Instituto Helio Beltrão e Sócio de Piquet Carneiro, Magaldi & Guedes Advogados
Fonte: Jota
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