A implementação dos “International Financial Reporting Standards” (IFRS) pelas empresas brasileiras, a partir de 2008, sem dúvida alguma, aumentou a qualidade das suas demonstrações financeiras. Por outro lado (ou por consequência), resultou no aumento da quantidade das informações, situação que foi criticada pelos agentes do mercado, como noticiou o Valor Econômico em algumas oportunidades (lembro das seguintes matérias: “Grupo tenta melhorar e reduzir notas explicativas”, de 29 de outubro de 2013, e “CVM quer mais qualidade e menos volume”, de 28 de fevereiro de 2014).
Ganhou corpo, então, a preocupação com a redação das notas explicativas, até porque o excesso de quantidade poderia comprometer a qualidade das demonstrações financeiras.
Sensíveis a essa preocupação, o Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC) juntamente com o Comitê de Orientação para Divulgação de Informações ao Mercado (Codim) criaram o Grupo de Estudos sobre Notas Explicativas, no âmbito da Fundação de Apoio ao CPC. Esse grupo foi liderado por Haroldo Levy que, tal como Danny Ocean (George Clooney) em “Onze homens e um segredo”, foi recrutando profissionais de diversas áreas para contribuir na discussão e na redação de um documento sobre a redação das notas explicativas.
Tive o privilégio de compor esse seleto grupo, desempenhando o papel de Livingston Dell (Eddie Jemison), o especialista em vigilância que, por sua ansiedade, põe em risco o projeto. Como único advogado do grupo, meus comentários, muitas vezes, foram feitos sob as amarras da lei.
Com mais de dois anos de estudos e discussões, finalmente foi aprovada pelo Conselho Federal de Contabilidade (CFC) e pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) a Orientação OCPC 07, que trata da redação das notas explicativas. Apesar de certa hesitação sobre a sua necessidade, haja vista que as demais normas contábeis dispõem sobre o assunto, a conclusão do próprio mercado foi por sua confecção.
De alguma maneira, as impertinências do advogado se justificaram: na cultura jurídica brasileira, por enquanto, a edição de uma norma jurídica, ainda que infralegal e esclarecedora (didática), mostra sua utilidade.
Em resumo, as notas explicativas devem contar as informações que sejam relevantes aos usuários da contabilidade das empresas (“stakeholders”), primordialmente os sócios (acionistas ou quotistas), investidores e credores de toda ordem. E somente a informações relevantes devem ser apresentadas nas notas explicativas. Com isso, a redução da quantidade permite o foco na qualidade.
Considerando a subjetividade inerente ao conceito de relevante, caberá ao administrador da empresa (gestor), em grande parte dos casos, determinar qual informação deverá ser prestadas nas notas explicativas. A responsabilidade pelas notas explicativas e pela caracterização da sua relevância é do administrador (gestor), ao lado do profissional da área contábil, ambos que assinam as demonstrações financeiras.
O conjunto das informações poderá ser julgado pelos órgãos de controle e fiscalização da empresa (conselho de administração, conselho fiscal e comitê de auditoria) e pelos agentes do mercado, como os analistas e o regulador, cujas contribuições moldarão a pertinência do conteúdo das notas explicativas.
Nesse particular, discussão que surge é quanto ao papel a ser desempenhado pelo auditor independente. A função do auditor independente não é escrever as notas explicativas, mas certificar que as demonstrações financeiras estão de acordo com as normas jurídico-contábeis (e seria também identificar possíveis fraudes?).
Essa questão é ainda bastante sensível, porque a divergência do auditor, que pode resultar em ressalva das demonstrações financeiras no seu parecer, ainda é, praticamente, um tabu no Brasil, o que não ocorre em outros mercados do exterior.
Enfim, o trabalho realizado pelo Grupo de Estudos sobre Notas Explicativas deve ser parabenizado. Espero, sinceramente, que estejamos inaugurando uma nova época em termos de demonstrações financeiras e notas explicativas. Mesmo porque a OCPC 07 já vale para as informações referentes ao ano calendário de 2014, que serão divulgadas ou publicadas a partir de 2015.
por: Edison Fernandes
Fonte: Valor Econômico.
Via Notícias Fiscais
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