Anualmente são revistas pelo fisco estadual as bases de cálculo (tabelas de incidência) do IPVA (Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores) para que seja o tributo pago no início do exercício seguinte.
Na última sexta-feira (21/11) a Secretaria da Fazenda de São Paulo divulgou tais valores. São eles apurados mediante pesquisas feitas pela Fipe (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas da USP), que, em sua página na internet, informa que ela “expressa preços médios de veículos no mercado nacional, servindo apenas como um parâmetro para negociações ou avaliações”.
Todavia, na tabela que se divulgou foi adotado um critério pelo menos discutível, ao considerar que no exercício de 2014 teria ocorrido uma depreciação média de 4,2% no valor dos veículos usados. Esse percentual está totalmente em desacordo com a realidade do mercado, o que faz com que seja cobrado imposto a maior, tornando a tributação injusta.
Informa a Fipe em seu site que os valores levam em conta as condições de oferta e procura. Ora, a depreciação média de qualquer veículo nacional é de pelo menos 10% ao ano, mais que o dobro dessa adotada pelo órgão oficial. Tudo indica que as pesquisas de preço não são corretamente feitas ou não levam em conta as condições de oferta e procura.
O mercado automotivo no Brasil todo está em crise. Os pátios das montadoras estão repletos, a produção já caiu e o comércio de veículos usados está praticamente parado. Há, sem dúvida, mais oferta que procura. Não há razão, portanto, para que se mantenha um “critério” de avaliação que desconsidere tais fatores e ignore a depreciação que, em muitos casos, ultrapassa 10% ao ano.
Para que se tenha uma ideia disso, podemos citar o exemplo de um automóvel de uso particular, adquirido em 2007, com cerca de 50 mil quilômetros rodados, em excelente estado de conservação, cujo custo inicial foi de cerca de R$ 70 mil e hoje não alcança R$ 30 mil reais no mercado e que, segundo a Fipe, está avaliado em R$ 40 mil. Vê-se aqui o contribuinte pagando tributo a maior.
Registre-se que a tributação dos veículos no Brasil é uma fonte inesgotável de enganos e de múltiplas incidências. Já examinamos a matéria em artigo de 16 de fevereiro de 2009 (clique aqui para ler) quando demonstramos que o IPVA não deveria ter sido criado, por representar imposto de consumo, não de propriedade, que causa diversos problemas para o contribuinte.
Um dos problemas criados para o contribuinte (melhor dizendo, uma das injustiças que o fazem ser um imposto indecente) é o fato de ser cobrado em pequeno espaço de tempo, quando poderia ser dividido ao longo do ano em parcelas mais suaves. Como há empresas e mesmo famílias que possuem vários veículos, a cobrança deveria ser coincidente com o prazo do licenciamento, assim reduzida a burocracia do sistema.
Por outro lado, já está criada uma nova indústria nacional, a de lançamentos indevidos sobre veículos emplacados em outras unidades da federação que circulem eventualmente neste estado. Trata-se de lançamento feito por presunção e, pior ainda, muitas vezes sem o devido processo legal.
A jurisprudência, mesmo administrativa, rejeita o lançamento por presunção há muito tempo e também a doutrina o desacolhe. Para que se lance IPVA em veículo licenciado em outro Estado, há que se imputar fraude, o que não se pode presumir, mas deve ser comprovado.
Há diversas decisões nesse sentido, como mencionado na matéria publicada nesta ConJur em 5 de março de 2014 (clique aqui para ler), pois o contribuinte pode ter diversos domicílios e licenciar seu veículo onde lhe aprouver.
Os municípios recebem metade do valor do IPVA incidente sobre os veículos licenciados em seu território. Já há cidades do interior incentivando seus munícipes a isso. Por certo sua arrecadação cresceria mais se melhor cuidassem dos seus cadastros de IPTU.
Uma reforma tributária digna desse nome deveria eliminar o IPVA como parte de uma racionalização de todo o sistema, hoje uma enorme colcha de retalhos que prejudica o nosso desenvolvimento, inibe investimentos e estimula a sonegação, esta um excelente fertilizante para a corrupção.
por Raul Haidar é jornalista e advogado tributarista, ex-presidente do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB-SP e integrante do Conselho Editorial da revista ConJur.
Fonte: Conjur
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