terça-feira, 4 de novembro de 2014

04/11 Ativos regulatórios podem voltar ao balanço de elétricas

As empresas de distribuição de energia elétrica estão muito perto de conseguir uma mudança nos contratos de concessão para colocar de volta ativos e passivos regulatórios dentro de seus balanços.

A iniciativa, se tiver sucesso, não resolve o problema de caixa das companhias, que as obrigou a tomar empréstimos bilionários em uma linha emergencial estruturada pelo governo. Mas daria a elas um balanço mais saudável do ponto de vista de endividamento e ao mesmo tempo tiraria instabilidade da conta de lucros e prejuízos, que confunde investidores.

Conforme o Valor apurou, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) deve colocar hoje em audiência pública uma proposta de mudança nos contratos com as distribuidoras de energia, o que é o primeiro passo para a volta desse reconhecimento nos balanços societários (nos demonstrativos entregues à própria Aneel eles sempre forem reconhecidos).

Tanto o direito de faturar mais com reajuste da tarifa no ano seguinte, para compensar um eventual gasto maior com compra de energia mais cara no ano corrente, como o dever de reduzir a tarifa no outro exercício, para equilibrar um período de energia mais barata hoje, eram registrados como ativos e passivos nos balanços das empresas de distribuição de energia até 2009, antes da adoção integral do padrão internacional de contabilidade IFRS.

Isso atenuava, até 2009, o sobe e desce dos resultados das empresas do setor, que por garantia contratual não estão expostas ao risco de preço da energia, já que o ativo ou o passivo regulatório compensam o custo acima ou abaixo do previsto.

Dentro das regras do IFRS, entretanto, ativos e passivos regulatórios, como regra geral, não entram nos balanços.

O problema se agravou em 2014 por conta do tamanho das diferenças, já que o preço de energia de curto prazo disparou.

A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) já se manifestou publicamente mais de uma vez, por meio de sua área técnica, dizendo que as companhias poderiam usar um dispositivo previsto no próprio arcabouço do padrão contábil internacional que prevê que não se siga o que diz a regra contábil, caso a decisão de observá-la leve a um balanço "enganoso", ou fora da realidade.

A CVM entende que os direitos contratuais de reajustar a energia no ano seguinte atendem a definição de ativo que consta da estrutura conceitual do IFRS, já que é um recurso que está sob controle da entidade e provavelmente lhe gerará benefícios econômicos futuros.

Mas ainda que contem com apoio do regulador, as empresas têm receio de enfrentar os auditores independentes, que não têm a mesma visão que a CVM sobre o caso. Eles argumentam que o ativo regulatório não pode ser reconhecido porque o contrato prevê o ressarcimento apenas quando a energia for distribuída no ano seguinte e a tarifa maior cobrada, faltando, portanto, um desempenho da própria empresa para que ela tenha direito a receber. Dizem ainda que o contrato não é claro sobre o que ocorre com tais ativos em caso de interrupção da concessão por qualquer motivo.

O Conselho de Normas Internacionais de Contabilidade (Iasb) colocou em discussão em setembro um texto com inúmeras considerações sobre o tema de ativos e passivos regulatórios, já que esse problema afeta outros países no mundo, em uma linha que talvez leve à permissão do reconhecimento de alguns desses ativos ou passivos, a depender de dispositivos contratuais. Mas qualquer evolução sobre esse assunto não sairá antes de 2016. Antes disso, o Iasb chegou a emitir uma norma garantindo o registro desses direitos e obrigações para novos adotantes de IFRS - ainda que numa linha diferente do balanço -, de forma a atender um pleito do Canadá, o que deixou os brasileiros bastante contrariados.

Como os montantes a serem registrados são vultosos, e não há interesse em esperar até 2016, a saída imaginada pelos brasileiros foi tentar negociar com o governo uma maneira de deixar claro para todos - especialmente para os auditores - que a garantia de receber é efetiva. Ou seja, a regra continuaria prevendo o ressarcimento pelos custos maiores via tarifa no ano seguinte, mas deixaria claro que, se houvesse qualquer problema, o governo pagaria a conta - mesmo que fosse cobrar dos consumidores depois.

Se esse ajuste for feito, tais direitos passarão a ser reconhecidos como ativos financeiros, tal como é feito pelas empresas do setor de transmissão de energia, e não mais regulatórios.

Procurada para comentar sobre o assunto, a CVM divulgou nota informando apenas que existem discussões, no âmbito da autarquia, do Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC) e da Aneel, sobre o estudo do Iasb, que aceita comentários até 15 de janeiro.

Por Fernando Torres

Fonte: Valor Econômico

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