quarta-feira, 15 de agosto de 2012

15/08 O lucro no século 21

Do ponto de vista dos utilitaristas, o lucro é resultado da combinação entre os fatores de produção “capital” e “trabalho”


Por Fabrício Pessato Ferreira* 

O que é lucro? Essas 5 letrinhas são a origem de tudo o que é bom e ruim em nosso sistema econômico. Mais do que isso: é o lucro que movimenta o mundo há pelo menos 200 anos. Neste exato momento, você está dentro de várias relações diretas com o lucro e talvez nem saiba! Quando você come, bebe, dorme, levanta-se, veste-se, calça-se, acessa a internet, fala ao telefone. Todas essas ações são diretamente ligadas ao lucro, porque sempre há alguma empresa vendendo algum bem ou prestando algum serviço em função do lucro. A teoria econômica não é unânime quando aborda o lucro, muito longe disso. Dependendo do ponto de vista, lucro pode ser tratado como um veneno ou como a melhor das maravilhas já criadas pelo homem.

A análise marxista, de um extremo, vê no lucro uma forma de exploração, semelhante ou até pior do que a escravidão. Nesse sistema, o dono dos meios de produção obtém, por meio do trabalho não pago, o excedente sobre a produção, a mais-valia. Fruto da troca entre o salário miserável pago ao trabalhador e a divisão do trabalho, surge o lucro, que tende a deixar o empresário cada vez mais rico e o assalariado cada vez mais pobre.

Do ponto de vista dos utilitaristas, o lucro é resultado da combinação entre os fatores de produção “capital” e “trabalho”. O empresário adquire a mercadoria “mão-de-obra” no livre mercado, como em uma espécie de feira, em troca do salário. O salário é, sob esta análise, o preço de uma mercadoria como outra qualquer. E o valor do salário é uma função da produtividade do trabalho: quanto maior a produtividade, maior tende a ser a remuneração.

A verdade está no caminho do meio. Sim, é fato que a busca descomedida pelo lucro é a fonte de muitas mazelas, como a destruição desenfreada do meio ambiente pela extração de matérias-primas, o envenenamento do solo, subsolo, rios e mares, emissões de gases nocivos à atmosfera e, enfim, a pauperização por baixos salários e a exclusão social. Assim como é fato que a concorrência empresarial potencializou o desenvolvimento da tecnologia em velocidade jamais registrada na história da humanidade, permitindo-se produzir cada vez mais com cada vez menos e possibilitando a fabricação de bens de consumo em larga escala para abastecer um número cada vez maior de pessoas.

Embora esses extremos ainda sejam abordados como verdades únicas, está claro que o século 21 será um período de grandes transformações para o sistema econômico. É óbvio que não é mais possível manter o padrão linear “produção-consumo-descarte” (PCD – production, consumption and disposal) que orienta a geração dos lucros até os dias de hoje. E apesar do discurso de sustentabilidade hoje praticado pela maioria das grandes empresas, é inegável que a prática não sustentável ainda é a tônica do sistema de produção, seja do ponto de vista ambiental, seja sob a ótica social.

Em algum momento do século 21, as práticas antiéticas não serão mais toleradas no universo empresarial. O grau de controle por meio da tecnologia da informação que o próprio sistema econômico desenvolveu, fundamentado no lucro, possibilitará à própria sociedade identificar quase imediatamente as práticas lesivas. A gestão do conhecimento organizacional será elevada a um patamar social, nacional e, enfim, global.

O trabalho será efetivamente remunerado pela produtividade. A tendência é que os trabalhos degradantes desapareçam e que as funções repetitivas, mas necessárias, passem a ser executadas por máquinas, não mais por humanos. Aliás, tenderá a ser cada vez menor a participação humana na simples execução de processos entediantes, o que obrigará os indivíduos a desenvolverem cada vez mais a capacidade intelectual para executar funções estratégicas e táticas, ao invés de operacionais. As pessoas trabalharão menos, mas produzirão cada vez mais. Sob este ponto de vista, a Educação deixará de ser mero direito e se tornará um dever de todos: a responsabilidade pela Educação será cada vez menor dos professores e cada vez maior da própria sociedade.

As empresas também terão responsabilidades cada vez maiores. A rotatividade de emprego deverá voltar aos níveis da década de 1960, não porque haverá intervenção estatal, mas sim porque o nível de conhecimento de cada funcionário será vital para a preservação da própria organização. Também não conseguirão mais praticar as “externalidades” de custos, ou seja, deixar de reconhecer aqueles custos não captados pela contabilidade, mas facilmente identificados quando se olha para o céu cinzento pela fumaça, ou para os rios mortos pelos resíduos industriais poluentes.

Enfim, o lucro no século 21 será muito diferente do que é hoje. Do ponto de vista estratégico, as empresas devem começar desde já a se prepararem para essa grande transformação. Aquelas que se atrasarem, poderão perder a nova onda que se aproxima e estarão inevitavelmente fadadas à extinção.

*Fabrício Pessato Ferreira é professor e coordenador dos cursos de Gestão Financeira e Ciências Contábeis da Metrocamp (Grupo Ibmec).

Fonte: INCorporativa

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