Empresas do setor de cosméticos estão conseguindo reverter, na Justiça, os efeitos do Decreto nº 8.393 – que equiparou estabelecimentos atacadistas a industriais para a incidência do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). A norma foi publicada pelo governo federal em abril do ano passado como parte do pacote de ajuste fiscal anunciado pelo então ministro da Fazenda, Joaquim Levy.
Sob os efeitos do decreto, empresas de um mesmo grupo econômico, por exemplo, teriam de recolher o imposto na saída dos produtos das fábricas para os seus estabelecimentos de comercialização e também na saída das mercadorias desses estabelecimentos para os varejistas. A União projetava, somente com a alteração do IPI dos cosméticos, elevar a arrecadação de R$ 381 milhões para R$ 653 milhões a partir deste ano.
Ele considerou ainda que a equiparação do comerciante atacadista ao industrial deturpa o próprio imposto que se quer cobrar – já que esse tipo de estabelecimento teria como função somente a de comercializar os produtos adquiridos. A incidência de IPI, nesse caso, demandaria que a empresa realizasse alguma das etapas de industrialização.
E, por último, destacou a situação de dupla tributação. "Merece acolhida o pleito da impetrante [empresa] de reconhecer a ilegalidade e inconstitucionalidade ao tributar a saída do estabelecimento industrial e a saída do estabelecimento a ele equiparado", afirmou o juiz em sua decisão.
Segundo o magistrado, a pretensão do Fisco de cobrar pelas duas operações viola o princípio da isonomia, previsto na Constituição Federal, e também a norma descrita no artigo 4º da Lei nº 7.798, de 1989 – que trata sobre os produtos sujeitos ao imposto.
"Se prevalecesse uma legislação como essa, o que se teria, na verdade, é a transformação do IPI em um ICMS federal. E a União não tem competência para cobrar ICMS", diz o representante de O Boticário no caso, o advogado Júlio Oliveira, do escritório Machado Associados.
Outras grandes empresas do setor conseguiram, por meio de liminares, a suspensão da cobrança do imposto aos estabelecimentos atacadistas. Entre elas, Natura, L’Oréal, Nivea, Johnson & Johnson e P&G.
Para o tributarista Abel Amaro, do Veirano Advogados, está havendo a repetição de algo que já ocorreu no início dos anos 90. Ele lembra que a equiparação de produtos cosméticos foi estabelecida por uma medida provisória que foi convertida na Lei nº 7.798, de 1989. A norma motivou uma série de ações judiciais – assim como desta vez e com argumentos semelhantes. Por conta disso, afirma o advogado, o governo federal acabou publicando em 1994 o Decreto nº 1.217, que excluiu os produtos cosméticos que haviam sido submetidos à equiparação.
"O decreto de 2015 basicamente inclui o que havia sido excluído pelo de 1994. Eu acredito que vai se repetir a mesma situação porque o volume de decisões judiciais do começo da década de 90 foi enorme", diz o advogado. "E o fundamento continua sendo o mesmo. Como esse episódio ocorreu após a Constituição Federal, a tendência é pela repetição. Mais e mais empresas devem ajuizar ações e conseguir decisões favoráveis até que a norma seja novamente revista", acrescenta Amaro.
Procurada pelo Valor, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) afirma, por meio de nota, que o tema é relevante e está inserido no acompanhamento especial nacional do órgão. Informa ainda que tem convicção na sua tese de defesa, seja sob o enfoque da legalidade do decreto, seja no que tange a constitucionalidade da Lei nº 7.989, de 1989. "A argumentação suscitada pelos contribuintes não se sustenta, fiando-se a tese, dentre outros, no equivocado conceito da hipótese de incidência do IPI, não o produto comercializado, mas a própria industrialização – o que atenta contra a literalidade do texto constitucional e recentes decisões do STJ e STF sobre o tema – e na suposta ilegalidade do Decreto nº 8.393, de 2015, que apenas restabelece a incidência de IPI nos moldes da Lei nº 7.798, de 1989".
Por Joice Bacelo | De São Paulo
Fonte : Valor
Via Alfonsin.com.br/
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