Não pagar imposto é um negócio lucrativo no Brasil. A prática é desenvolvida pelo chamado “devedor contumaz”, aquele que até declara os tributos devidos, mas simplesmente nunca paga.
Para punir essa conduta seria necessário criar leis e regras coercitivas que impeçam quem a pratica de manter ou abrir novos negócios, ou que garanta a cobrança antecipada de impostos. Essa tese é defendida por juízes e especialistas em tributação, mas os questionamentos do Supremo Tribunal Federal (STF) vêm dificultando qualquer punição a essa prática que, perante a lei, nem crime é.
A Associação dos Juízes Federais de São Paulo e Mato Grosso do Sul (Ajufesp) é incisiva na defesa de ações específicas no tratamento dos devedores contumazes. “A Ajufesp tem defendido que, para esse tipo de devedor, é necessário um tratamento legislativo, um marco legal mais rigoroso, que permita medidas que, exatamente pela peculiaridade e pela diferença da situação, não seriam aplicáveis aos devedores que são ocasionais”, afirma Fernando Marcelo Mendes, presidente da Ajufesp.
“É preciso diferenciar o devedor temporário, que passa por dificuldades de mercado e por isso deixa de recolher tributos, daquele que opta por fazer do não pagamento de tributo uma forma de atuação”, acrescenta.
As perdas provocadas por essa prática são enormes, embora não seja simples dimensionálas, já que a dívida ativa não separa o devedor contumaz dos outros. Sabese, porém , diz Mendes, que dos cerca de R$ 1,4 trilhão que compõem a dívida ativa, aproximadamente R$ 900 bilhões estão concentrados em um número pequeno de devedores, entre 1 mil e 2 mil,
“ É nesse grupo que se encontram os contumazes, a dificuldade é caracterizálos. “Consumada essa caracterização, defendemos que essa conduta esteja sujeita a uma responsabilidade penal”, defende Mendes.
Segundo Godoy, entre os 500 maiores devedores do país, há vários que acumulam dívidas acima de R$ 1 bilhão. “Usam e abusam da morosidade da Justiça, da burocracia dos fiscos, valendose da jurisprudência tradicional do STF que proíbe ao Poder Público aplicar sanções políticas para cobrar tributos”, afirma. “Num momento de crise econômica e de grande déficit de arrecadação, combater o devedor contumaz é uma necessidade”, argumenta.
Nossa grande bandeira, diz Godoy, é que haja uma diferenciação entre o devedor contumaz e o devedor ordinário e que o primeiro passe a ser monitorado. “É preciso olhar para o devedor contumaz como alguém que prejudica o mercado. Não basta cobrar a dívida. É necessário uma medida mais dura, até o fechamento da empresa, porque esses valores são irrecuperáveis. As companhias não têm patrimônio, os sócios não têm patrimônio, são usados laranjas”, afirma.
De acordo com o presidente da Ajufesp, os Estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul concentram o maior número de devedores contumazes e o grande receio é que por trás disso possa haver uma estrutura de crime organizado.
Não por acaso, Estados do Sul e do Sudeste vêm buscando novos procedimentos de combate a esse tipo de devedor, sem trombar com a lei. “A mudança mais emblemática foi a do Rio Grande do Sul, que tem uma legislação específica, e que está sendo discutida no STF”, diz o presidente da Ajufesp.
Para Godoy, os setores mais atingidos são os de combustíveis e tabaco devido à alta carga tributária e baixa margem de lucro. “Então, qualquer centavo que não é pago em impostos gera uma grande possibilidade de avançar no mercado e destruir concorrentes de uma forma muito danosa”, afirma. Ele cita o maço de cigarros que é vendido a R$ 5,00, que tem em torno de 90% de tributos embutidos.
Para o advogado Hamilton Dias de Souza, o devedor contumaz tem ação consciente e sistemática sem explicação razoável e se organiza para não pagar tributos. Contra esse devedor, a legislação em vigor não tem dado resultado. “O Fisco deveria tomar medidas como caçar a inscrição fiscal ou criar um regime especial de fiscalização. Ou até deixar um fiscal na porta do da empresa ou mesmo exigir que a empresa apresente garantias para receber o talonário de notas fiscais”, sugere. No entanto, ressalva, essas são as medidas que normalmente a jurisprudência não concorda e são tidas como inconstitucionais
FONTE: Valor Econômico - Por Rosangela Capozoli / Para o Valor, de São Paulo
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