Em 30 de setembro de 2015 foi publicada a Medida Provisória nº 694 que, dentre outras disposições, previa para o ano calendário de 2016 a suspensão dos incentivos fiscais à inovação tecnológica, dispostos nos artigos 19, 19-A e 26, da Lei nº 11.196 de 2005.
Esses incentivos fiscais tratam da possibilidade de dedução dos dispêndios com pesquisa tecnológica e desenvolvimento de inovação tecnológica para fins de apuração do IRPJ e CSLL, em montantes superiores aos efetivamente gastos. Ou seja, permitem deduções que variam de 160% a 250% dos dispêndios dessa natureza incorridos pela empresa.
Nos termos do art. 62, parágrafo 2º da Constituição Federal, as medidas provisórias devem ser convertidas em lei no prazo de 60 dias contados da sua publicação, prorrogável por igual período, suspendendo-se o referido prazo durante os dias de recesso do Congresso Nacional.
Em caso de rejeição ou perda da eficácia da medida provisória, cabe ao Congresso Nacional, por meio de decreto legislativo, disciplinar em até 60 dias os efeitos dela decorrentes no período da sua vigência. No entanto, se por qualquer motivo o referido ato não for editado, os negócios e atos jurídicos praticados durante a vigência da medida provisória permanecem por ela regidos.
Nesse sentido, considerando que a MP 694 não foi convertida em lei no prazo previsto pela Constituição Federal, aguarda-se a edição de decreto legislativo para regular os atos praticados durante a sua vigência, tida por encerrada em 10 de março deste ano.
De todo modo, no que se refere à suspensão dos incentivos fiscais à inovação tecnológica no período em que a MP 694 esteve vigente, há elementos que sustentam a inaplicabilidade de tal suspensão em relação ao IRPJ.
Isso porque o próprio art. 62 da Constituição Federal, em seu 3º, estabelece que a medida provisória que implicar instituição ou majoração de imposto, respeitadas as exceções constitucionalmente previstas ao princípio da anterioridade, apenas produzirá efeitos no exercício financeiro seguinte ao que for convertida em lei. Assim, uma vez que a MP 694 não foi convertida em lei no ano de 2015, a suspensão dos incentivos fiscais à inovação tecnológica não poderia produzir efeitos no ano calendário de 2016 para fins de apuração do IRPJ.
Ademais, conforme esclarece recente entendimento do Supremo Tribunal Federal (RE 564.225/RS), a revogação de benefício fiscal resulta em aumento indireto do tributo, de modo que o princípio da anterioridade deve ser observado. No caso concreto, ainda que se trate de suspensão e não de revogação de benefício fiscal, entendemos o mesmo raciocínio deve ser aplicado.
De outra parte, no que se refere à suspensão dos incentivos fiscais à inovação tecnológica para fins de apuração da CSLL, seria observada somente a anterioridade nonagesimal, conforme previsto no parágrafo 6º do art. 195 da Constituição Federal. O termo inicial em tal caso, consoante entendimento do Supremo (RE 790.861/RJ), deverá ser contado da data da publicação da medida provisória, desde que não tenha havido alterações relevantes em seu texto.
Nesse sentido, embora não deva produzir efeitos em relação ao IRPJ, a MP 694 poderá ser aplicada para fins de apuração da CSLL, no período compreendido entre 1ºº de janeiro e 10 de março de 2016, caso não seja editado decreto legislativo em sentido contrário. Essa dualidade trará maior complexidade para os contribuintes, que estarão obrigados a apurar o IRPJ e a CSLL a partir de bases de cálculo diferentes em relação aos incentivos fiscais à inovação tecnológica.
Ainda, no atual cenário de crise econômica, não parece desejável a aplicação da suspensão dos incentivos fiscais à inovação tecnológica no período em que a MP 694 esteve vigente, em razão do prejuízo à competitividade das empresas que aproveitam tal benefício.
Parece oportuno, portanto, que seja publicado decreto legislativo estabelecendo a inaplicabilidade da MP 694 aos atos praticados durante a sua vigência, tanto para fins de apuração do IRPJ quanto da CSLL, de modo a trazer segurança jurídica aos contribuintes, evitar a complexidade da apuração desses tributos com bases distintas e assegurar o adequado aproveitamento dos incentivos à inovação tecnológica pelas empresas brasileiras.
por Ana Gabriela Guilherme Marques Brandão é advogada e aluna do mestrado profissional da FGV direito SP
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Fonte : Valor
Via Alfonsin.com.br
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