O revezamento na contratação de empresas para auditar demonstrações financeiras divide opiniões de especialistas. De um lado, há quem defenda a rotatividade em pró da análise isenta e objetiva dos números. Por outro, o argumento é que o conhecimento sobre o negócio se perde na trasnsição e acaba gerando custos maiores para as companhias. No caso do Brasil, há ainda o questionamento sobre a concentração nesse mercado, que também levanta questionamentos sobre os efeitos práticos do rodízio. Especialistas consultados pelo Estado dão sua opinião sobre o assunto. Deixe seu comentário e participe também da discussão.
Idésio Coelho
Hoje, no Brasil e em boa parte dos países, empresas de capital aberto são obrigadas a trocar periodicamente as firmas que auditam suas demonstrações contábeis. Os benefícios dessa prática, porém, são controversos, e um estudo norte-americano divulgado recentemente pela Federação Internacional dos Contadores (Ifac, na sigla em inglês) propõe uma abordagem diferente para avaliar a relação entre a duração desses mandatos e a qualidade da análise das demonstrações contábeis.
Batizado de The Effects of Auditor Rotation, Professional Skepticism, and Interactions with Managers on Audit Quality (Os efeitos do rodízio de auditor, ceticismo profissional e interação com gestores na qualidade da auditoria, em tradução livre), o estudo foi realizado pelos professores Kendall O. Bowlin, Jessen L. Hobson e M. David Piercey, respectivamente das universidades de Mississipi, Illinois e Massachusetts. O objetivo foi determinar o elemento-chave da dinâmica que, no mundo real, estabelece-se entre o auditor independente e o gestor de uma empresa auditada, o que envolveu o acompanhamento, em situação controlada de laboratório, de pares anônimos de auditores e gestores nas suas tomadas de decisões.
Até agora, havia apenas duas formas de enxergar a questão. Os apoiadores do rodízio argumentam que ele preserva a independência do auditor e melhora a qualidade da auditoria, ao impedir que a intimidade com o cliente aumente a predisposição a confiar nas informações fornecidas. Seus oponentes alegam que a rotatividade, além de acarretar custo alto para as empresas, faz com que conhecimentos específicos dos meandros do negócio se percam a cada mudança, prejudicando a qualidade técnica da auditoria.
O novo estudo torna a discussão um pouco mais complexa ao introduzir uma variável subjetiva à análise e concluir que o rodízio, em alguns casos, aumenta os riscos que se propõe a eliminar.
É natural que, com o passar do tempo, o ser humano ganhe confiança na sua capacidade de avaliar a veracidade ou não das informações que recebe em determinado contexto. No caso do auditor, isso tanto pode exacerbar a confiança quanto o ceticismo frente às informações apresentadas pelos gestores. O revezamento mina esse mecanismo psicológico de reforço, interferindo diretamente no resultado do trabalho do auditor. Se uma predisposição à confiança se estabelece, a ruptura é positiva. Mas, quando o ceticismo prevalece, o relacionamento mais longo favorece a qualidade da auditoria.
O saldo dessa descoberta para as empresas e o mercado é trazer à luz uma alternativa mais eficiente (e barata) para garantir a excelência da auditoria, que é a substituição dos custosos rodízios pelo privilégio ao ceticismo profissional, um pré-requisito na profissão de auditor independente. Se parecer subjetivo demais, o caminho do meio aponta para, no mínimo, uma ampliação significativa dos intervalos para essa rotatividade. No Brasil, atualmente, adota-se o rodízio a cada cinco anos. É muito pouco quando se pensa em conhecer a fundo operações que chegam a envolver milhares e milhares de transações a cada dia.
Idésio Coelho, presidente do Instituto dos Auditores Independentes do Brasil
Fonte: Jornal O Estado de São Paulo - 16/02/2016
Via Ibracon.com.br
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