Não são poucas as disputas judiciais e administrativas envolvendo o pagamento da Participação de Lucros e Resultados – PLR. Com efeito, disputas a respeito do tema envolvem tópicos relacionados ao direito trabalhista, previdenciário e tributário, não raras vezes resultando em decisões conflitantes.
Hoje abordaremos acórdão proferido pela Primeira Turma da Câmara Superior de Recursos Fiscais – CSRF, que acabou por afirmar o direito do Contribuinte, no âmbito do IRPJ, à “dedutibilidade de despesas com Participação de Lucros e Resultados – PRL”, por entender que tais despesas “submetem-se à regra geral do artigo 299 do Decreto nº 3.000/99”, decisão esta tomada à maioria de votos pela turma (Acórdão nº 91-1-003.082).
De acordo com a Fiscalização, tal dedutibilidade seria indevida em função da Contribuinte não ter cumprido as disposições da Lei nº 10.101/2000, legislação esta que trata justamente dos procedimentos indicados para fins de pagamento de PRL. No caso, a Fiscalização identificou que a Contribuinte supostamente não teria (i) comprovado a eleição de representante dos empregados no comitê executivo responsável pela estruturação do PRL para os referidos exercícios, assim como (ii) por ter verificado a ausência de representante indicado pelo sindicato da categoria dos empregados no referido comitê.
Em face das alegadas irregularidades, entendeu a Fiscalização pela ilegalidade do pagamento do PLR e, ato contínuo, considerou indevida a dedução tomada pela Contribuinte com tais valores da base de cálculo do IRPJ e CSLL apurados nos exercícios acima referidos.
A combater tal lançamento, justificou a Contribuinte que apenas um empregado teria manifestado interesse em compor o comitê responsável pela elaboração do programa PLR. Ainda, justificou que a integralidade dos funcionários teria aprovado o programa apresentado, razão pela qual qualquer vício de representatividade teria sido sanado a partir de tal aprovação unânime. Ademais, comprovou nos autos que o sindicato representativo da categoria profissional teria confirmado à Fiscalização a concordância com os termos do programa de PLR elaborado.
Ainda, além de sustentar a legalidade do PLR nos termos da Lei nº 10.101/2000, esclareceu a Contribuinte que a despesa, mesmo na hipótese de se considerar alguma violação à Lei nº 10.101/2000, ainda assim deveria ser considerada dedutível, pois o art. 299, inciso II do RIR/99, assegura o direito à dedutibilidade das despesas “usuais e necessárias da pessoa jurídica”, além de prever, em seu parágrafo terceiros, que dentre tais despesas devem ser consideradas as “gratificações pagas aos funcionários, seja qual for a designação que tiverem”.
Em primeira instância, as glosas foram mantidas, levando a Contribuinte buscar amparo no CARF, repisando os argumentos lançados em impugnação.
Ao analisar o recurso voluntário, tratou turma da Primeira Seção do CARF de esclarecer pela “ausência de antinomia entre a Lei nº 10.101/2000 e o art. 299 do RIR/99, este podendo servir de base para a dedutibilidade das despesas, independentemente do preenchimento das regras específicas daquela Lei”, cancelando o lançamento ao afirmar que “é despiciendo saber se houve ou não o cumprimento das normas técnicas relacionadas ao processo de instituição do PLR, pois o §3º do art. 299 do RIR/99 acolhe como dedutível as gratificações pagas aos empregados, seja qual for a designação que tiverem”, tendo essa decisão sido desafiada por Recurso Especial da Fazenda.
Após intenso debate sobre a admissibilidade do apelo fazendário, a conselheira-relatora tratou de reiterar algumas regras básicas, por vezes esquecidas, para tributação da renda, entre elas a de que “não basta tão somente a verificação das receitas auferidas”, mas sim que se “avalie o efetivo acréscimo patrimonial percebido”, o que só se afere propriamente com a consideração dos custos e despesas incorridos para realização de tais receitas.
Ato contínuo, o voto condutor tratou de lembrar que o artigo 299 do RIR/99 estabelece que para fins de dedutibilidade as despesas, além de não poderem ser computadas como custos, devem ser consideradas necessárias, o que se afigura a partir da verificação de que “minimamente possuam relação com as atividades da empresa ou sua fonte produtora”.
Nesta linha, destacou a conselheira-relatora que para fins de dedutibilidade, uma vez preenchido o requisito de necessidade, não é possível a “imposição de limitações subjetivas ao alcance da relação entre as despesas e as atividades da empresa”.
De igual maneira, no que tange ao requisito de normalidade da despesa, foi afirmado no voto condutor que o que se deve aferir é se tal despesa é “comum no ramo de negócio ou na espécie de transação ou operação objeto de análise”, ou seja, se a despesa incorrida pela empresa trata-se de uma despesa usualmente incorrida para atingimento dos fins sociais aos quais se dedica a sociedade.
Feitas tais considerações iniciais, concluiu a relatora-conselheira que quaisquer gratificações, entre elas, as despesas com PLR, preenchiam todos os requisitos elencados no disposto pelo art. 299 do RIR/99, para ser consideradas como dedutíveis, ante a sua necessidade e normalidade no curso dos negócios empreendidos pela Contribuinte.
Arrematando o raciocínio e confirmando o entendimento exposto no acórdão do CARF, conclui-se que eventuais violações às disposições da Lei nº 10.101/2000 no que tange à criação do programa de PLR da Contribuinte em nenhum momento poderiam, ante as disposições gerais do art. 299 do RIR/99, significar qualquer limitação à dedutibilidade em relação a tais despesas, na medida em que as únicas consequência de eventuais descumprimentos da Lei nº 10.101/2000 se dariam na esfera trabalhista, nunca no âmbito tributário.
Assim, restou vencedor o entendimento, de forma correta no entender deste colunista, que eventual descumprimento das condições impostas na Lei nº 10.101/2000 teria o único condão de reconhecer que os pagamentos feitos em favor dos empregados teriam natureza de remuneração ordinária e não PRL, atraindo todas as consequências reflexas trabalhistas e previdenciárias. Por outro lado, considerando que toda a remuneração, assim como eventuais gratificações pagas aos empregados são necessárias, usuais e normais às atividades da Contribuinte, não haveria qualquer antinomia entre o art. 299 do RIR/99 e a Lei nº 10.101/2000, não havendo que se falar em glosa de tais despesas, razão pela foi mantido pela CSRF, por maioria de votos, o acórdão que havia cancelado a glosa da referida despesa.
THALES STUCKY – Advogado, LL.M. em Tributação Internacional pela New York University e Ex-presidente do Instituto de Estudos Tributários – IET. Sócio de Trench, Rossi e Watanabe Advogados
Fonte: Jota.info/
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