terça-feira, 27 de março de 2018

Exame de Suficiência do CFC: um “selo de garantia” para o sucesso profissional?

Inicialmente, considerando tratar-se de um artigo denominado “artigo de opinião” ou “artigo opinativo”, é importante esclarecer que, diferentemente de um artigo científico, as conclusões são, em regra, apresentadas com base em experiências não necessariamente metódicas e, no caso, vivência acadêmica em cursos de graduação de Administração de Empresas e Ciências Contábeis.

O título escolhido tem, sim, caráter provocativo e, ao final da leitura, esperamos haver cumprido o propósito de responder o questionamento, isso de forma sustentada por referências apropriadas, como se verá.

Como se sabe, o exame de suficiência do Conselho Federal de Contabilidade (CFC), a partir de 2011, foi normatizado pela Lei 12.249/2010, especificamente em seu art. 12, que evidenciou a necessidade de aprovação no exame de suficiência para o exercício da profissão de contador, visto que o período anterior de existência do exame (2000 a 2004) fora suspenso. Em 17.09.2010, o CFC editou a Resolução 1.301/2010, alterada em alguns aspectos conceituais por meio da Resolução CFC 1.486, publicada em 15.05.2015, com a alteração mais recente pela Resolução 1.518/2016, exclusivamente para revogar o § 1.º do art. 12 da Resolução 1.486, sobre a questão do prazo para registro após a aprovação do exame.

No contexto do título aqui proposto, o art. 1.º da Resolução CFC 1.486 expressamente qualifica o exame como: “Exame de Suficiência é a prova de equalização destinada a comprovar a obtenção de conhecimentos médios, consoante os conteúdos programáticos desenvolvidos no curso de Bacharelado em Ciências Contábeis” (grifo nosso). Assim, conforme dispõe o CFC, é válido destacar duas expressões da Resolução em apreço: (1) “destinada a comprovar” e (2) “conhecimentos médios”, o que nos induz à compreensão de que não há no âmbito do exame de suficiência qualquer menção explícita e/ou implícita que possa sustentar a argumentação no sentido de que o mesmo (exame) existiria como instrumento legal impeditivo, em sua forma e essência, para o bacharel em ciências contábeis, ao prosseguir na carreira pretendida.

Resta ainda que respondamos ao segundo questionamento do tema: o exame do CFC pode ser considerado um “selo de garantia” para o sucesso do bacharel em ciências contábeis?

O que se pode inferir de imediato da segunda expressão destacada anteriormente (conhecimentos médios) é que se parte de uma premissa (que pode não ser absolutamente concreta) sobre os conteúdos programáticos desenvolvidos nos cursos de bacharelado existentes no território nacional brasileiro. Nossa compreensão é de que a aprovação no exame de suficiência do CFC possa ser a confirmação do “selo de garantia” para o sucesso, pois, para a aprovação no exame, é necessário que o bacharel esteja preparado sob duas óticas de análise: coletiva e individual, o que a seguir procuraremos esclarecer.

Quanto à preparação coletiva, o foco são os cursos ministrados pelas mais diversas Instituições de Ensino Superior (IES) no Brasil. Daí emerge uma questão: os cursos de ciências contábeis no Brasil têm conseguido formar profissionais (inclusas aqui as questões sociais… cidadania… e congêneres) aptos ao exercício da profissão? Se respondermos com base nos dados estatísticos publicados pela Fundação Brasileira de Contabilidade (FBC), explorando somente os dois exames de 2017, vamos constatar os seguintes resultados:

1º exame de 2017: Percentual de aprovação – índice geral: 35,87%;
2º exame de 2017: Dos 13 focos do exame (disciplinas), em somente 4 houve obtenção de aprovação acima de 50,0%: Legislação e Ética Profissional, Língua Portuguesa, Perícia Contábil e Princípios e Normas.

Mediante tais resultados, podemos inferir que disciplinas fundamentais para o curso de ciências contábeis, bem como outras de grande valia para o profissional contábil, não têm sido compreendidas com o grau de aprofundamento necessário para a aprovação no exame, aqui tratado como CONFIRMAÇÃO DO SELO DE GARANTIA para o contador. Ou seja, o “selo de garantia” é confirmado pelo exame do CFC, MAS A ESSÊNCIA DA GARANTIA É O SABER.

No sentido da provável insuficiência por parte das IES, no que tange à formação do bacharel em ciências contábeis, sábias são as palavras da Profa. Maria Clara Cavalcante Bugarim [et al.], em artigo publicado na Revista de Contabilidade e Organizações, n. 22, p. 60-71, 2014, quando nas considerações finais acerca dos dados tabulados (2000-2004 e 2011-2012), aqui parcialmente reproduzidas, expressa-se:

[…] os resultados apresentados neste estudo ganham importância pelas implicações que trazem, tanto para as entidades de fiscalização, no caso, os Conselhos Federal e Regionais, quanto para as Instituições de Ensino Superior, que têm como missão formar profissionais capacitados para uma atuação satisfatória na sociedade… constituem como um diagnóstico completo do desempenho no exame, apontando para áreas de maior fragilidade no ensino e que, para tanto, carecem ser mais bem exploradas na formação dos profissionais de contabilidade, como Noções de Direito e Matemática Financeira… Além disso, a realização de estudos que visem identificar as variáveis explicativas do desempenho desses profissionais no referido exame também se evidencia como essencial para auxiliar conselhos e instituições de ensino na construção de mecanismos que favoreçam o aprimoramento da formação do profissional contábil.

Somente por si, as considerações da pesquisadora nominada corroboram com nosso entendimento de que existe uma inconteste necessidade de aprimoramento das matrizes curriculares, no sentido de ainda mais preparar seu corpo discente contábil.

O que podemos também sugerir é que responsáveis (coordenadores, diretores e funções equivalentes) acompanhem as divulgações dos resultados dos exames do CFC, objetivamente quanto à aprovação dos candidatos, por IES. Isso pode ser um alerta aos responsáveis, a fim de implementar projetos apropriados ao curso, se tal se constatar necessário.

Quanto à outra ótica de análise citada (individual), sob nosso olhar empírico, inferindo também das experiências vividas em sala de aula, a impressão é de que os concluintes e bacharéis, em sua maioria, entendem erroneamente que tão somente os estudos desenvolvidos durante o curso, principalmente os cursos presenciais não integrais, sejam suficientes para o prosseguimento na carreira, após o exame do CFC.

Com relação aos cursos em regime EAD, a percepção (mesmo que indireta) é de que os alunos dos mesmos estágios que os presenciais não estão adequadamente preparados para o enfrentamento do exame e carreira profissional. Até porque não se constata que a maioria dos concluintes e formados nas duas modalidades (presencial ou EAD) não tem procurado estudos complementares ao bacharelado, tais como cursos preparatórios para o exame do CFC, a fim de resgatar conceitos vistos em fase inicial do curso e que, (também) por motivo do sistema cartesiano de ensino, foram esquecidos.

Finalmente, voltando ao título, podemos responder que o exame de suficiência do CFC NÃO É NEM TEM CARACTERÍSTICA IMPEDITIVA ao registro profissional da categoria. Também NÃO É UM “SELO DE GARANTIA”. Entendemos que o exame é a CONFIRMAÇÃO de um “selo de garantia” obtido por meio de estudos bem estruturados (responsabilidade das IES) e bem assimilados e continuamente exercitados (responsabilidade dos concluintes e bacharéis em ciências contábeis).

ALBERTO MANOEL SCHERRER
É professor executivo junto à Fundação Getulio Vargas (FGV), programa de pós-graduação (lato sensu) em Administração, atuando no módulo de Contabilidade Geral, na unidade de São José dos Campos (SP), conveniada Conexão Desenvolvimento Empresarial. É também professor de Contabilidade Geral, Contabilidade de Custos, Contabilidade Avançada e Perícia Contábil junto à Faculdade Anhanguera de São José dos Campos. Mestre em Planejamento e Desenvolvimento Regional, pós-graduado (lato sensu) em Gestão Contábil e bacharel em Ciências Contábeis. Consultor empresarial. Autor dos livros Contabilidade imobiliária: abordagem sistêmica, gerencial e fiscal e Como interpretar as questões do exame do CFC, publicados pelo GEN | Atlas.

Nenhum comentário:

Postar um comentário