terça-feira, 6 de março de 2018

Dissolução irregular de sociedade e aplicação do art. 135 do CTN

Examinaremos de forma objetiva e sucinta a tese da aplicação da responsabilidade pessoal do contribuinte (art. 135 do CTN), nas hipóteses de dissolução irregular de sociedade ltda.

Vejamos o que diz o art. 135 do CTN in verbis:

“Art. 135. São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos:


  • as pessoas referidas no artigo anterior;
  • os mandatários, prepostos e empregados;
  • os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado”.

Pela simples leitura ocular deste dispositivo verifica-se com lapidar clareza que é caso de responsabilidade das pessoas aí referidas por créditos tributários resultantes de atos praticados com excesso de poder, contra a lei e contra o contrato social ou estatuto. Não há, nem pode haver responsabilidade que surja do nada.

A palavra resultantes significa, originários, decorrentes, ocasionados etc. Em outras palavras, o crédito tributário decorre da obrigação tributária, e esta decorre da ocorrência in concreto do fato gerador. E o fato gerador somente ocorre no mundo fenomênico, quando alguém pratica uma conduta tipificada na norma de imposição tributária (dispositivo legal que define o fato gerador do tributo).

Fácil de verificar que nenhuma legislação tributária (federal, estadual, distrital ou municipal) elege a dissolução irregular de sociedade limitada como fato gerador de obrigação tributária, pela simples razão de que o fenômeno da tributação deve recair sobre signos presuntivos de riqueza. E é difícil de acreditar que a dissolução irregular de sociedade, decorrente da situação de insolvência, represente, por si só, um sinal de riqueza.

Mas, para efeito de responsabilização dos sócios ou do administrador da sociedade ltda., o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula de 435 do seguinte teor:

“Presume-se dissolvida irregularmente a empresa que deixar de funcionar no seu domicílio fiscal, sem comunicação aos órgãos competentes, legitimando o redirecionamento da execução fiscal para o sócio-gerente”.

Partiu do pressuposto que a falta de comunicação é um ato ilegal a acarretar a responsabilidade pessoal do sócio ou administrador pela totalidade dos tributos em aberto.

O difícil, senão impossível, na prática, é fazer a comunicação do novo domicílio fiscal que no caso de encerramento da atividade por insolvência, obviamente não existirá.

Outrossim, no sistema informatizado da administração tributária não há espaço para inserir a comunicação de paralisação temporária ou definitiva das atividades empresariais. Na maioria das vezes o interessado sequer consegue protocolar na repartição fiscal competente a notificação de encerramento da atividade empresarial por escrito, por conta de “n” empecilhos opostos pelo burocrata da Fazenda. Vivemos hoje sob a ditadura da informatização, onde a discussão ou diálogo com os computadores não é possível.

A baixa da sociedade limitada no Registro de Comércio, também é inviável, tendo em vista a impossibilidade de apresentação das certidões negativas.

Nesse cenário, a aplicação da Súmula 435 do Superior Tribunal de Justiça, para alcançar os bens dos sócios ou administradores da sociedade ltda. inativa, implica aplicação da teoria da responsabilidade objetiva que a ordem jurídico-tributária positiva, com certeza, não a abrigou, apesar de existir no âmbito de Código de Defesa do Consumidor e da Lei nº 12.846/13, denominada Lei de Combate a Corrupção.

E mais, implica confundir pessoa jurídica com a pessoa dos sócios que a compõem. Essa regra que estava expressa no art. 20 do Código Civil de 1916 não foi reproduzida no Código Civil de 2002, porém, a distinção continua existindo como se pode verificar do art. 50 do Estatuto Civil vigente que prevê a desconsideração da personalidade jurídica em caso de abuso caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, hipótese em que o Juiz, mediante provocação, pode determinar que os efeitos de certas relações obrigacionais sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios das pessoas jurídicas.

Mas, não pode o Juiz, com base do art. 135 do CTN, imputar as obrigações tributárias das sociedades ltda. a seus sócios ou administradores a pretexto de que houve dissolução irregular da sociedade. Este procedimento da jurisprudência, data vênia, implica legislar sobre o fato concreto com o fito de proceder à arrecadação tributária, sem observância do princípio constitucional do devido processo legal.

2-3-18

Kiyoshi Harada

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