terça-feira, 6 de junho de 2017

O que mudou com a lei da terceirização

Tem-se discutido acerca da Lei 13.429/2017 que passou a viabilizar a terceirização para as chamadas “atividades-fim”, que são aquelas que compõem o objetivo principal da empresa, normalmente expresso no contrato social.

A referida legislação altera dispositivos da Lei nº 6.019/1974 que trata sobre o trabalho temporário e dispõe sobre as relações de trabalho na empresa de prestação de serviços a terceiros.

Para facilitar o entendimento, compilamos o que entendemos de mais importante sobre o tema. Confiram:

O QUE É TERCEIRIZAÇÃO?

A Terceirização é uma alternativa de organização estrutural, que ocorre quando uma empresa contrata outra (terceiros) para a realização de serviços específicos, denominados “serviços de meio”. Tais serviços não possuem relação direta com a finalidade principal do negócio, tão somente o auxiliam. Por exemplo, uma construtora que contrata serviços de segurança para seu estabelecimento.

Ciro Pereira da Silva, um dos juristas que tratam sobre o assunto, conceitua esse fenômeno como: “[…] a transferência de atividades para fornecedores especializados, detentores de tecnologia própria e moderna, que tenham esta atividade terceirizada como sua atividade-fim, liberando a tomadora para concentrar seus esforços gerenciais em seu negócio principal, preservando e evoluindo em qualidade e produtividade, reduzindo custos e ganhando competitividade. ”[1]

REGULAMENTAÇÃO

A Terceirização era “regulada” pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST), através da Súmula 331 de 2003, que orientava, com base na Lei nº 6.019/74, sobre a possibilidade de terceirizar somente quando não envolvesse a atividade finalística da empresa. O inciso primeiro desta Súmula diz expressamente que, salvo no caso de trabalho temporário, a contratação de trabalhadores por empresa interposta, ou seja, quem contrata a mão de obra, é ilegal, formando vínculo direto com o tomador de serviços.

Com o advento da Lei 13.429 de 2017, a contratação de mão de obra terceirizada foi “liberada”, não só para atividade-meio, como permitia o Tribunal Superior do Trabalho, mas também para as atividades-fim.

O objetivo principal foi autorizar a terceirização em todos os setores[2], justamente para regularizar o instituto da terceirização, trazer segurança jurídica para as relações terceirizadas já existentes, flexibilizar as relações de trabalho e, ainda, ajudar na criação de novas vagas de emprego, refletindo no desenvolvimento do país e na atual crise econômica.

A novidade, porém, tem gerado polêmicas e divergentes posicionamentos a respeito deste assunto.

PONTOS DE VISTA

Quem se posiciona de forma contrária, em tese, defende que a terceirização torna precárias as relações de trabalho, desqualificando a mão de obra, causando maiores demissões e afrontando diretamente os direitos previstos na CLT, tais como férias e 13º. Ademais, para eles, a redação não contém dispositivos para impedir a chamada “pejotização”.

Este fenômeno ocorre quando há transformações de trabalhadores celetistas em Pessoas Jurídicas, ou ainda em Microempreendedores individuais, com vistas a diminuir os gastos tributários.

De lado oposto, aqueles que são favoráveis à terceirização argumentam que será possível o aumento do dinamismo da economia, podendo ajudar como um freio ao desemprego que, em três anos, já atingiu mais de 12 milhões de pessoas. [3]

Afirmam ainda, que a mudança não retira nenhum direito e não viola a CLT, apenas beneficia a economia brasileira, por gerar maior segurança jurídica nos serviços terceirizados já existentes, como nas construções civis, podendo até trazer investimentos internacionais para o país.

Independe do lado escolhido, o mais importante é deixar claro que a Lei não aprovou a terceirização irrestrita, sem regras ou direitos. Estes estão garantidos pela Constituição Federal e Leis Trabalhistas, que devem ser aplicadas conjuntamente com qualquer norma.

O maior problema é que haverá um longo período de possíveis interpretações e insegurança jurídica, justamente por estarmos diante de um texto com várias lacunas e omissões, mas, que deverá ser analisado, reiteramos, em harmonia com todas as fontes do direito.

A liberdade para que as empresas possam se reorganizar é muito válida e para qualquer abuso, a justiça continua plena para aplicar a lei e evitar violações.

RESPONSABILIDADE PELAS VERBAS TRABALHISTAS

Pelo texto aprovado, a responsabilidade pelas obrigações trabalhistas é subsidiária para a empresa contratante.

A responsabilidade subsidiária consiste em uma faculdade permitida pela lei, que faz com que o credor, quando não receber o pagamento da dívida pelo devedor originário, possa exigir o pagamento a um responsável subsidiário. Ou seja, o trabalhador que não receber os valores referentes às verbas trabalhistas da empresa contrata (prestadora de serviços) poderá acionar a empresa contratante para a quitação da dívida, porém, somente após esgotadas as tentativas de acionar a empresa contratada.

VÍNCULO EMPREGATÍCIO

A lei prevê que, qualquer que seja o ramo da tomadora de serviços, não existe vínculo de emprego entre ela e os trabalhadores contratados pelas empresas de trabalho temporário. Também não se configura vínculo empregatício entre os trabalhadores ou sócios das empresas prestadoras de serviços com a empresa contratante.

No entanto, o projeto de terceirização não altera a CLT em seus artigos 2º 3º, 4º e 9º que estabelecem os requisitos de reconhecimento do vínculo empregatício, tais como a subordinação, pessoalidade, continuidade e remuneração.

Portanto, é perfeitamente possível extrair que, mesmo na vigência da nova lei, se existentes e comprovados os requisitos do vínculo de emprego com a empresa tomadora, a contratação via terceirizada seria invalidada.

TRABALHO TEMPORÁRIO E TERCEIRIZAÇÃO

Outro ponto importante para o entendimento da terceirização é a distinção entre o trabalho denominado “temporário” e a própria terceirização.

O trabalho temporário é regularizado pela lei 6.019/74, que o conceitua como “aquele prestado por pessoa física contratada por uma empresa de trabalho temporário que a coloca à disposição de uma empresa tomadora de serviços, para atender à necessidade de substituição transitória de pessoal permanente ou à demanda complementar de serviços. ”

Isso ocorre, por exemplo, quando uma funcionária da empresa sai de “licença-maternidade” ou até mesmo quando a demanda de serviços está muito alta em determinados períodos, situação em que, para não sobrecarregar os demais, ou substituir definitivamente o ausente, contrata-se um funcionário por período determinado de até três meses, podendo ser prorrogado por mais seis meses. Vencido esse período o contrato configura-se por tempo indeterminado.

O contrato de terceirização, ao contrário, não precisa ter prazo.

Além do prazo, a principal diferença entre esses dois institutos se dá no vínculo empregatício, uma vez que na terceirização a empresa contratada é a responsável pelos pagamentos, estando os funcionários subordinados apenas subsidiariamente com a empresa contratante.

Já no trabalho temporário, o trabalhador está subordinado à empresa contratante, com o vínculo sendo intermediado por uma empresa de trabalho temporário (ETT).

No mais, os funcionários terceirizados precisam ser especializados na área que irão atuar o que não acontece no trabalho temporário.

TERCEIRIZAÇÃO NO MUNDO

O Brasil é um dos poucos países que se preocupam com a distinção entre a terceirização para “atividade-meio” e ”atividade-fim”. Países como Alemanha, Bélgica, Peru, Colômbia, Japão, China e Austrália têm a terceirização aceita de forma geral, sem proibições, além de não possuírem uma legislação especifica para o tema, aplicando-se, no entanto, a legislação civil para reconhecimento dos contratos de prestação de serviços.

Para eles, a terceirização trata-se de uma estratégia de produção, que permite agregar uma maior especialização na cadeia produtiva.

O QUE ESPERAR DA NOVA LEI?

A Lei foi sancionada pelo presidente em 31 de março e, de acordo com o seu art. 3°, entrou em vigor na data de sua publicação. Nesse sentido, as empresas e os trabalhadores agora terão que se adequar à nova realidade, torcer e colaborar para que ela produza efeitos positivos, atingido os objetivos de sua criação.

Não há dúvidas de que empregados e empregadores passarão por um momento de transição e adaptação, principalmente diante de diferentes interpretações que ainda são extraídas da legislação. Todavia, não podemos esquecer que princípios e garantias, consagrados constitucionalmente, não podem ser retirados de nenhum cidadão, seja por Lei, decisão, convenção ou interpretação legislativa.

A colaboração e o bom senso de todos serão importantíssimos para o êxito dessa Lei.

[1] SILVA, Ciro Pereira da apud CARELLI, Rodrigo de Lacerda. Formas atípicas de trabalho. São Paulo: LTr, 2004, p. 44.

[2]com exceção do funcionalismo público, excluindo as carreiras de estado, como procuradores, auditores e juízes, e ainda quanto ao transporte e vigilância de valores.

[3]  Índice de desemprego: http://www.valor.com.br/brasil/4853298/desemprego-no-brasil-atinge-maior-taxa-desde-2012

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