segunda-feira, 1 de junho de 2015

01/06 É hora de acelerar?

O americano Tom Peters, guru da gestão empresarial do século passado, escreveu um dos mais importantes livros sobre crise. No início dos anos 1980, ele publicou o trabalho “In Search of Excellence” (“Em busca da excelência”, em português), que se tornou consulta obrigatória de executivos que procuram uma saída para os tempos difíceis. Suas oito ideias-chave (veja quadro) atravessaram mais de três décadas e servem de guia para navegar em períodos de incerteza econômica. Como lição principal, os executivos têm de olhar para o todo e separar o seu negócio do setor.

Do contrário, estarão cometendo um erro de gestão e reforçando o comportamento de manada. A distância em relação ao que os concorrentes estão fazendo contribuirá pra o surgimento de novas ideias e de soluções para os problemas. Mas, na situação atual de recessão do Brasil, parece difícil se desvencilhar da correria contra o abismo. Alguns setores, como o de construção e o imobiliário, caminham para dois ou três anos de crise. Outra expectativa de analistas é que, quando o fundo do poço chegar, no início do segundo semestre deste ano, muitas companhias serão atropeladas pela falta de caixa e erros cometidos na gestão.

“É preciso adequar a estrutura a esse novo Brasil, mexer no negócio, reposicioná-lo e, se for o caso, investir”, diz Glauco Abdala, sócio da consultoria Galeazzi & Associados. “O principal é não perder tempo e achar que a crise é cíclica e tem prazo para acabar. É preciso sobreviver com o menor prejuízo possível.” Mais do que preservar o caixa, é preciso preservar a qualidade dos produtos e serviços e, em consequência, os clientes. É o que está fazendo no Brasil a montadora sul-coreana Hyundai, que detém 7,6% de participação num dos setores mais atingidos pela crise.

O mercado automobilístico recuou 6,9% no ano passado, o pior desempenho em 12 anos. Neste ano, o cenário começou ainda pior. A queda de 26% nas vendas no primeiro trimestre levou a maior parte dos fabricantes a decidir pela demissão, layoff ou férias coletivas de milhares de funcionários. Na contramão da concorrência, porém, a fábrica da Hyundai em Piracicaba, no interior de São Paulo, vai continuar trabalhando em três turnos e, ao contrário da maior parte de seus pares, o CEO William Lee não prevê cortes de pessoal. Lee projeta estabilidade neste ano, recuperando-se da queda de 6,9% registrada nos primeiros meses de 2015 (resultado muito menor do que a média setorial).

“Produtos de qualidade e durabilidade estão mantendo os níveis ou até crescendo no mercado brasileiro. Prova disso são as marcas consideradas de luxo, como as alemãs ou mesmo a Hyundai e as concorrentes japonesas”, diz Lee. “O atual momento de crise que a economia atravessa mostra que, para manter-se saudável no mercado, é preciso ter produtos e marcas com uma boa imagem perante o consumidor.” A fábrica da japonesa Honda, na cidade paulista de Sumaré, confirma a visão de Lee de que, em períodos de crise, a soma de qualidade, inovação e confiança do consumidor fazem diferença. Com trabalho intenso em dois turnos, hora extra e aumento da produção, a montadora tenta dar conta de uma fila de espera de 100 dias para o utilitário esportivo HR-V, lançado em março deste ano.

Com preço de entrada de R$ 70 mil, o SUV consegue se destacar mesmo num setor em baixa. Em períodos de economia fraca, é preciso saber usar suas principais armas. A operadora Claro, por exemplo, acelerou sua política de comunicação. Num mercado de margens estreitas, guerra de preços e competição acirrada, a estratégia seria perfeitamente lógica e compreensível num cenário de crescimento econômico e aumento de renda. Mas a empresa, que faz parte do grupo do bilionário mexicano Carlos Slim, colocou essa tática em exercício no ano passado, quando o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro cresceu irrisório 0,1% e a rentabilidade média foi corroída por uma inflação de 6,4%.

A Claro apostou forte em sua marca e aumentou em 104% o investimento em mídia, para R$ 340 milhões. O resultado desse empenho foi alcançado no segundo semestre, quando a companhia foi superior às suas principais concorrentes. Ela registrou expansão três vezes maior que a Vivo e quase o dobro da TIM na conquista de clientes, além de ter melhorado sua participação de mercado no período. Se tivesse escolhido a retranca na comunicação, a Claro não perderia a terceira posição no ranking das maiores empresas de telefonia celular. No entanto, não se trata apenas de manter posições – em determinadas situações, simplesmente não perder o que foi conquistado já é uma vitória. No caso da operadora mexicana, a aposta não está sendo feita para o curto prazo.

A visão é embalar os negócios para crescer quando a economia brasileira se recuperar. Quando isso acontecerá? Ainda é difícil dizer ao certo. Mas a Claro adotou a postura que os especialistas costumam pedir para as empresas em tempos de incerteza: a preservação da marca é a melhor saída para que o consumidor não esqueça o seu produto no futuro. “Na crise, a decisão de investimento em comunicação deve ser do CEO, que não deve promover um excesso de corte”, diz Eduardo Tomiya, diretor-geral da consultoria Millward Brown Vermeer para Brasil e América do Sul, parceira da DINHEIRO no anuário As Marcas Mais Valiosas do Brasil. “Do contrário, no futuro a empresa terá de reparar um erro e fazer investimentos adicionais.”

Colaborou: Hugo Cilo

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