O resgate da credibilidade da política fiscal brasileira será uma das principais missões do futuro ministro da Fazenda, Joaquim Levy. O uso continuado da chamada "contabilidade criativa" por parte da equipe econômica que está deixando o governo provocou profunda desconfiança da sociedade em relação ao compromisso das autoridades com a obtenção das metas fiscais e com o equilíbrio das contas públicas. O governo chegou ao ponto de acabar, na prática, com qualquer meta fiscal para 2014.
Em seu primeiro pronunciamento como ministro indicado, Levy reafirmou o seu compromisso com a transparência de suas ações à frente do Ministério da Fazenda. Essa transparência seria manifesta, segundo disse, "no fortalecimento da comunicação de seus objetivos e prioridades e na divulgação de dados tempestivos, abrangentes e detalhados, especialmente das contas fiscais, que possam ser avaliados por toda a sociedade, incluindo os agentes econômicos".
No mesmo pronunciamento, Levy informou que o governo perseguiria, em 2015, uma meta de superávit primário de 1,2% do Produto Interno Bruto (PIB) e não menor que 2% do PIB para 2016 e 2017. Faltava ao governo formalizar essas novas metas, o que foi feito na quinta-feira da semana passada com o envio ao relator da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), senador Vital do Rêgo (PMDB-PB), do novo Anexo de Metas Fiscais.
O documento enviado ao Congresso provocou os primeiros ruídos na comunicação da futura equipe econômica com a sociedade. Primeiro, porque ele prevê elevação da carga tributária federal em 2015, 2016 e 2017. E os aumentos não serão pequenos. No próximo ano, por exemplo, o total arrecadado pela União vai corresponder a 25,99% do PIB, contra a previsão de 25,46% do PIB que consta da proposta orçamentária. Em 2016, a previsão é que a carga atingirá 27,03% do PIB e 27,36% do PIB em 2017. Não há explicação para os incrementos, sinalizando que o governo projeta aumentos de impostos nos próximos anos.
No mesmo documento, o governo anunciou um corte de R$ 30,7 bilhões na estimativa de receita primária da União para 2015. Essa decisão, segundo o texto da LDO, resulta da redução da receita primária de 2014, na ordem de R$ 43 bilhões, assim como do baixo crescimento da economia previsto para o próximo ano, de apenas 0,8%. Essa queda da receita para 2015, segundo o texto da LDO, "tornou imperiosa a revisão da meta de resultado primário".
Na primeira versão da LDO, o superávit primário do governo central foi fixado em 2% do PIB, podendo ser reduzido em R$ 28,7 bilhões por causa dos investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Com o desconto, o resultado cairia para 1,5% do PIB. Estados e municípios fariam 0,5% do PIB, de forma que o resultado primário ficasse, no mínimo, em 2% do PIB. O governo reduziu a meta de todo o setor público para 1,2% do PIB, sendo 1% do PIB para o governo central e 0,2% para Estados e municípios.
A nova versão da LDO acabou com a chamada "meta cheia", que é o resultado fiscal sem a redução dos investimentos do PAC. Por conta do desconto, o Brasil tinha uma espécie de "banda fiscal". Agora, o texto da LDO define apenas uma meta e diz, de uma forma pitoresca, que ela já considera "a redução do montante de R$ 28,667 bilhões, relativos ao PAC". Até agora, ninguém na Comissão Mista de Orçamento conseguiu entender a referência a esse desconto da meta que não existe.
Na nova versão da LDO, o governo promoveu uma redução no superávit primário no mesmo montante da queda da receita prevista, mantendo as despesas no mesmo nível da proposta orçamentária, de R$ 1,379 trilhão. Ou seja, a diminuição do superávit serviu apenas para manter os gastos inalterados. O valor do PIB de 2015 também foi substancialmente reduzido, com o objetivo de deixá-lo mais próximo daquele projetado pelos analistas do mercado, no boletim Focus editado pelo BC. Por causa disso, as despesas programadas no Orçamento do próximo ano vão crescer em proporção do PIB, de 23,96% do PIB previstos na proposta orçamentária para 24,98% previstos na LDO.
O governo projetou uma receita primária de R$ 1,306 trilhão para este ano. Este valor foi a base utilizada para estimar a receita primária de 2015, fixada em R$ 1,456 trilhão. Em novembro, o governo reduziu em R$ 61 bilhões a previsão para a arrecadação de 2014, que ficou em R$ 1,245 trilhão. Mesmo assim, cortou apenas R$ 30,7 bilhões na previsão da receita primária de 2015 (ver tabela abaixo). Com isso, o governo projetou um crescimento de 15,2% da receita do próximo ano, em comparação com 2014, sinalizando que trabalha com um forte aumento de impostos. Ou, então, a estimativa de receita para 2015 é inconsistente.
O mesmo anexo apresenta tabela com a trajetória para as dívidas bruta e líquida do setor público nos próximos três anos. Reportagem de Leandra Peres, publicada ontem no Valor, mostrou que para que as projeções se confirmem, o Tesouro não poderá emitir títulos para injetar recursos no BNDES, Banco do Brasil e Caixa até 2017. O presidente do BNDES, Luciano Coutinho, não considera isso possível.
Fonte: Valor Econômico
Via Sindafep.com.br
Nenhum comentário:
Postar um comentário