Mesmo depois de afirmar que havia recuado na tributação retroativa de dividendos das empresas, a Receita Federal não desistiu de cobrar pelo menos parte do imposto e a Medida Provisória (MP) nº 627, que trata do assunto, pode aumentar a insegurança jurídica para as empresas que ainda não distribuíram esses resultados, segundo avaliação de tributaristas.
A disputa entre o Fisco e os contribuintes tem origem na diferença entre o lucro fiscal, apurado de acordo com as normas contábeis vigentes até 2007, e o lucro contábil, que segue as regras internacionais para elaboração de balanços. Entre 2008 e 2013, as empresas fizeram os balanços e pagaram dividendos sobre o lucro registrado de acordo com IFRS. Mas a Receita Federal entende que a distribuição do dividendo só é isenta até o limite do lucro fiscal. Sobre o “excedente” distribuído, segundo as regras societárias, deveria ser pago Imposto de Renda.
A Medida Provisória nº 627, editada em novembro do ano passado, estabeleceu que as empresas que tivessem distribuído dividendos “excedentes” até a edição do normativo estavam isentas de qualquer tributação sobre esse valor. Mas aquelas que ainda não tivessem feito a distribuição, teriam que pagar o imposto quando o fizessem.
O relator da MP no Congresso, deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), ampliou o benefício tributário para as empresas. A primeira versão do relatório estabelece que o lucro “excedente” é isento de tributação desde que tenha sido pago aos acionistas até a publicação da lei, ou seja, até a data de votação da MP pelos parlamentares.
Além disso, o relator acabou com a exigência feita pela Receita de que as empresas necessariamente aderissem às regras de tributação criadas pela MP 627 já em 2014, e não apenas em 2015, para terem direito à isenção sobre os dividendos.
“O que acontece se a empresa distribui o resultado segundo a lei aprovada e depois a presidente Dilma Rousseff veta esse artigo? O ideal é que se estabeleça uma data limite posterior à sansão da lei para que as empresas possam decidir o que fazer”, explica a advogada Andrea Bazzo, do escritório Mattos Filho.
A votação da MP 627, apesar dos esforços do governo, não será suficiente para encerrar as disputas jurídicas sobre a tributação de multinacionais brasileiras com empresas controladas ou coligadas no exterior. O sócio diretor da Andrade Advogados, Andre Martins de Andrade, avalia que a discussão sobre como serão tributados os resultados de empresas sediadas em países com os quais o Brasil tem tratados para evitar a bitributação continuará no Judiciário.
“A preocupação legítima da Receita Federal de evitar o uso dos tratados internacionais como forma de elisão fiscal levou a uma solução que não se sustenta juridicamente. Melhor seria se o Fisco tivesse regras específicas para coibir a elisão em vez de tratar todos os casos da mesma forma”, explica Andre Martins.
A Receita, grosso modo, transforma a renda obtida no exterior em renda da empresa no Brasil, por meio de uma figura técnica chamada de parcela de ajuste no valor do investimento. Com isso, tributa o resultado obtido fora do país independentemente de haver ou não regras específicas para evitar a dupla tributação.
O Fisco argumenta que regras para defender a base de tributação são uma tendência mundial e a MP 627 apenas reforça esse movimento. A Receita Federal foi consultada sobre as mudanças feitas pelo relator da MP nas regras de tributação dos dividendos, mas informou que “não se pronunciaria no momento”.
Por Leandra Peres
Fonte: Valor Econômico
Via CFC
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