No julgamento da ADI 4357 o Supremo Tribunal Federal (STF) declarou ser inconstitucional o índice TR para a correção dos precatórios, porém modulou os efeitos da decisão para a data de julgamento, em 25 de março de 2015. A partir dessa data os precatórios devem ser corrigidos pelo IPCA-E.
Na ocasião o Supremo também julgou inconstitucional por arrastamento a Lei 11.960/09, na parte em que estabeleceu a TR como índice de correção para as condenações impostas à Fazenda Pública. Ainda assim, o tribunal entendeu por bem levar o tema à julgamento em nova repercussão geral para que não houvesse dúvida quanto ao índice de correção aplicável no período anterior à expedição do precatório.
O tribunal não modula uma decisão de inconstitucionalidade com base em "coerência" com decisões anteriores
Entretanto, como tem sido praxe em discussões vencidas pelos contribuintes, a Fazenda Pública pleiteia em embargos declaratórios a modulação dos efeitos desta decisão. O STJ, ao julgar o mérito do Tema 905, já se adiantou e afastou o pedido de modulação dos feitos da decisão. Também no STF a Fazenda interpôs embargos de declaração no Tema 810 pedindo a modulação da decisão para a partir de 25 de março de 2015, tal como aplicado pelo tribunal para os precatórios, na ADI 4357. O pedido está pendente de análise.
Estes julgamentos serão importantes para todos os que litigam contra a Fazenda Pública, pois será definido o índice de correção monetária. O cerne da questão está no argumento utilizado pela Fazenda para requerer, tanto no STJ (já rechaçado) quanto no Supremo, a modulação dos efeitos da decisão a partir de 25 de março para, aparentemente, ser coerente com a modulação feita pelo STF no caso dos precatórios na ADI 4357.
Todavia, essa suposta coerência alegada pela Fazenda não autoriza a modulação da decisão por dois motivos. Em primeiro lugar porque o tribunal não modula uma decisão de inconstitucionalidade com base em "coerência" com decisões anteriores, mas sim quando presentes os requisitos para tanto, o que não ocorre no caso.
Em segundo lugar, não há alteração de jurisprudência, pelo contrário, o próprio Poder Público financia boa parte da sua dívida por meio de títulos indexados ao IPCA-E e historicamente os Manuais de Cálculo da Justiça empregam este índice na atualização monetária das condenações. Trata-se, portanto, de índice oficial comumente adotado nas relações econômicas e, por isso mesmo, já utilizado pelo Judiciário antes da alteração trazida pela lei 11.960/09, julgada inconstitucional pelo STF. Disso já se verifica a ausência dos demais requisitos para modulação da decisão, como interesse social, segurança jurídica, proteção da confiança e isonomia.
E citando a isonomia, impõe esclarecer inexistir qualquer dever de coerência do tribunal com a modulação feita na decisão da ADI 4357. Isso porque tratando-se de situações distintas – na ADI se julgou o índice de correção dos precatórios já expedidos e no Tema 810 se julga o índice de correção da conta de liquidação (período anterior à expedição do precatório) – as razões pelas quais o STF modulou a decisão da ADI 4357 não se aplicam à decisão do Tema 810.
No caso da correção monetária dos precatórios, o STF modulou a decisão para manter os critérios de correção dos precatórios já expedidos. Ou seja, modulou para evitar uma avalanche de precatórios complementares com a diferença do valor encontrada pela aplicação do IPCA-E ao invés da TR e também para não tumultuar o orçamento da União, que previa o índice TR. Este critério usado pelo STF para modular a decisão da ADI 4357 não está presente agora, pois estamos diante de período anterior à expedição do precatório. Ou seja, aplicar o índice IPCA-E não vai afetar o orçamento nem gerar precatórios complementares. Por tudo isso, a expectativa é que o Supremo negue o pedido de modulação feito pela Fazenda no Tema 810.
Os pedidos de modulação dos efeitos da decisão têm gerado dúvida e insegurança, quase como se fosse um novo julgamento do tema. Não se pode perder de vista que por vezes a modulação da decisão acaba violando justamente aqueles preceitos que deveria resguardar, em especial a segurança jurídica e a proteção da confiança.
Os jurisdicionados obtiveram suada vitória no STF e no STJ contra a adoção de índice de correção monetária que na realidade congelava o valor devido pelo poder público. Restringir os efeitos desta decisão é violar o direito fundamental de propriedade e incentivar a interposição de recursos protelatórios pela Fazenda, assoberbando o Judiciário e violando o direito da duração razoável do processo.
Ulisses Jung e Luiza Perez são sócios da Advocacia Ulisses Jung
Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações
Por Ulisses Jung e Luiza Perez
Fonte : Valor
Via Alfonsin.com.br/
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