terça-feira, 6 de dezembro de 2016

Novo Código Comercial vai à votação

O projeto do novo Código Comercial, que reúne normas para regular os direitos e obrigações das empresas, deve ter avanços nos próximos dias. Uma nova – e última – versão está prevista para ser votada na quarta-feira por uma comissão especial na Câmara dos Deputados. A proposta foi construída a partir de negociações com entidades empresariais que se mostravam resistentes ao texto atual.

Se aprovado, o projeto será encaminhado para a apreciação do plenário da Câmara. O presidente da comissão especial, deputado Laércio Oliveira (Solidariedade-SE), que também é vice-presidente da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), acredita que a pauta seja concluída e encaminhada ao Senado ainda neste ano. "O alinhamento com o setor produtivo foi feito e o entendimento das questões mais difíceis está construído", afirma.

Em discussão no Congresso há cinco anos, o Projeto de Lei (PL) nº 1.572 – que cria o novo código – deveria ter sido votado pela comissão no início do semestre. Acadêmicos do meio jurídico e parte do empresariado, no entanto, pediram que a tramitação fosse suspensa. Havia divergências sobre a versão que seria apreciada pelos deputados.

O novo texto, que irá à votação na próxima quarta-feira, prevê tanto alterações na redação de artigos como a inclusão e a retirada de textos que não estavam sendo vistos com bons olhos por parte do setor empresarial. Uma das mudanças previstas é a inclusão de um artigo que possibilita a aplicação do Código de Defesa do Consumidor (CDC) às relações entre micro e pequenos empresários e as empresas de porte maior. Essa era uma questão que constava no projeto original, mas acabou sendo retirada ao longo da tramitação no Congresso.

A reinclusão desse ponto específico foi um dos pleitos da Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp). Diretora executiva jurídica da entidade, Luciana Freire entende a aplicação do CDC como necessária porque, nesses casos, há uma parte hipossuficiente na relação. "Os contratos são geralmente impostos pelos grandes aos pequenos, sem uma justa negociação", diz.

Uma outra questão polêmica, que também deverá ser alterada, trata da falência transnacional. A proposta do substitutivo prevê duas mudanças. Uma delas é a supressão do texto relacionado à legitimidade ativa do Ministério Público para pedir a falência transnacional de uma companhia. O outro modifica parte da redação do artigo que trata sobre os credores estrangeiros.

A proposta que deverá ser levada à votação prevê que estrangeiros com créditos constituídos fora do país possam concorrer junto com os credores quirografários (aqueles que não têm garantias) nos processos de falência de empresas brasileiras. Pela versão original, os estrangeiros teriam de entrar no fim da fila (depois dos quirografários).

Segundo os legisladores, a medida seria uma segunda opção ao procedimento atual. Hoje, afirmam, estrangeiros com créditos constituídos fora do Brasil teriam de ingressar na Justiça do país de origem e, após obter a condenação da empresa, pedir ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) que homologue a decisão. Só depois desse procedimento é que poderiam ter acesso aos bens da companhia no Brasil.


Para advogados que atuam na área, no entanto, não é o que ocorre na prática. Detentores de bonds (títulos de dívida), que é um dos mais comuns nos processos de falência, não precisariam ingressar com ação fora e passar por todo o trâmite da homologação no STJ para poder cobrar a dívida no Brasil. Segundo especialistas em recuperação judicial e falências, não há hoje nenhum filtro para que esses credores participem do processo. Pela prática atual, basta que ele apresente o título, sem diferenciação de nacionalidade.

"Eu não conheço nenhum caso, em processo concursal, que tenha havido discriminação de crédito pelo fato de o credor ser estrangeiro. Hoje, no Brasil, não se discrimina", destaca o advogado Bruno Poppa, sócio do escritório Tepedino Migliore Berezowski Poppa Advogados. "Seria uma xenofobia jurídica. Se ele é credor de uma empresa brasileira e obtiver garantia, não poderá executá-la pelo simples fato de ser estrangeiro? Isso traz insegurança jurídica ao mercado. Os impactos econômicos são evidentes", acrescenta.

Há ainda um outro tema espinhoso do projeto: registro civil de pessoa jurídica. A nova versão deve estabelecer que os registros de sociedades profissionais sejam feitos em cartório. Já as demais sociedades simples e as sociedades empresárias devem ter registro em Junta Comercial. Essa questão que trata dos registros foi incluída no projeto por meio de um substitutivo e já passou por algumas mudanças.

Hoje, pela lei vigente, todas as sociedades simples têm registro em cartório e somente as empresárias ficam nas Juntas. Quando foi incluída no projeto, a proposta previa repassar todas as sociedades – incluindo as profissionais – para as Juntas Comerciais. Depois, em um outro substitutivo, definiu que tanto as simples como as empresárias poderiam escolher em qual local fazer o registro.

Representante da Associação dos Notários e Registradores (Anoreg), Paulo Rego entende como mais justa a versão atual do projeto. Ele diz que os cartórios têm estrutura para fazer os registros tanto de sociedade simples como empresárias e que estão preparados para concorrer de forma igual com as Juntas Comerciais.

Já a possibilidade de uma nova versão para a matéria preocupa. Segundo Paulo Rego, poderia provocar a quebra de cartórios pelo país. Ele chama a atenção que os cartórios têm divisões de atribuição por especialidades. "Há os que são só de registro civil de pessoa jurídica. Se tirarem os serviços que os remuneram, é claro que vão fechar as portas."

Essa nova versão, porém, foi um das reivindicações do setor empresarial. Algumas entidades argumentaram que a competitividade entre cartórios e Juntas Comerciais – como consta no artigo 768 do projeto atual – poderia gerar uma confusão na questão dos registros.

"Tecnicamente falando, ele [o projeto] está sendo bastante evoluído", afirma Luciana Freire, da Fiesp. Ela diz, por outro lado, que não há ainda um posicionamento empresarial de apoio ao novo código. A reunião que tratará sobre o tema – entre a presidência da entidade e os sindicatos – ainda será realizada. É possível que o assunto seja pautado para o último encontro do ano, marcado para o dia 15.

Se aprovado na Câmara Federal, o projeto do novo Código Comercial ainda terá de ser analisado pelo Senado. Presidente da comissão especial na Câmara, o deputado Laércio Oliveira acredita, porém, que o trâmite na outra Casa será mais rápido. "Não será um assunto desconhecido", diz. "O Senado já tem um estudo sobre o novo código e o corpo de juristas que assessorou as duas Casas é muito parecido", justifica.

Por Joice Bacelo | De São Paulo

Fonte : Valor

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