Embora o Fisco possa acessar diretamente dados de contribuintes, ele não pode usar tais informações para basear inquérito ou ação penal sem autorização judicial. Isso porque a Receita não tem autorização para compartilhar esses elementos com terceiros.
Com esse entendimento, o ministro do Superior Tribunal de Justiça Rogerio Schietti Cruz concedeu a ordem em Habeas Corpus para desentranhar de uma ação penal todos os dados de um contribuinte que foram usados pelo Fisco sem aval da Justiça. Com isso, Cruz determinou que o Tribunal Regional Federal da 3ª Região (SP e MS) analise se, sem essas provas ilícitas, é possível manter a condenação por sonegação tributária (artigo 1º, I, da Lei 8.137/1990).
Contudo, o sócio impetrou HC junto ao TRF-3, e a ação chegou ao STJ. Nesse remédio constitucional, o empresário disse “não saber as circunstâncias que chegaram os dados bancários à Receita Federal”. Na dúvida, não é possível garantir que essas provas são lícitas, alegou, apontando que não houve autorização judicial para a quebra de seu sigilo fiscal e bancário.
Ao analisar o caso, Rogerio Schietti Cruz citou que o Supremo Tribunal Federal decidiu recentemente que os órgãos da administração pública podem compartilhar dados sigilosos de contribuintes sem que isso implique quebra de sigilo. Entretanto, o ministro ressaltou que tais informações não podem ser divulgadas a terceiros sem que haja ordem de magistrado autorizando esse ato.
Dessa maneira, só é possível mover ação penal com base em dados confidenciais se houver aval judicial nesse sentido, destacou Cruz. “Notícia de crime não poderia abranger o compartilhamento de extratos bancários e documentos fiscais com conteúdo protegido por sigilo (declaração de imposto de renda, livros contáveis etc.). Repito, em benefício da clareza: apesar de, no âmbito fiscal, haver permissão para transferência de dados financeiros do contribuinte, as informações sigilosas obtidos durante o procedimento administrativo fiscal devem ser protegidas contra o acesso de terceiros e, assim, não podem ser compartilhadas para uso em persecução penal sem autorização judicial, pois, no âmbito penal, ainda permanecem sob reserva absoluta de jurisdição.”
Como a denúncia no presente caso foi feita com fundamento no livro-caixa da companhia e em valores de contas bancárias do empresário, o ministro entendeu que houve ilegal compartilhamento de dados fiscais e bancários dele.
Com isso, concedeu a ordem no HC e considerou ilícitas todas as provas derivadas dessas informações. Assim, Cruz determinou que o TRF-3 analise se, desentranhadas essas informações do processo, ainda há motivo para manter a condenação do empresário.
Sem quebra de sigilo
Por 9 votos a 2, o STF decidiu, em fevereiro, ser constitucional a Lei Complementar 105/2001, que permite aos órgãos da administração tributária quebrar o sigilo fiscal de contribuintes sem autorização judicial. Ficaram vencidos no julgamento os ministros Celso de Mello e Marco Aurélio. Saiu vencedor o entendimento de que a norma não configura quebra de sigilo bancário, mas transferência de informações entre bancos e o Fisco, ambos protegidos contra o acesso de terceiros.
Segundo o STF, como bancos e Fisco têm o dever de preservar o sigilo dos dados, não há ofensa à Constituição Federal. Na decisão também foi destacado que estados e municípios devem regulamentar, assim como fez a União no Decreto 3.724/2001, a necessidade de haver processo administrativo para obter as informações bancárias dos contribuintes.
Acesso direto
Em novembro, a 6ª Turma do STJ decidiu que a Polícia Federal não precisa pedir autorização judicial para usar informações prestadas ao Coaf. Como tais dados ficam à disposição de interessados, o uso pelo órgão não caracteriza quebra de sigilo.
A decisão vai na contramão do que o colegiado já decidiu no âmbito da operação faktor, que apurou suspeitas de lavagem de dinheiro e crimes contra a ordem tributária no Maranhão. Na ocasião, em 2011, a 6ª Turma entendeu que o único fator que motivou a quebra de sigilo dos investigados foi um relatório de movimentações atípicas fornecido pelo Coaf. Para os ministros, seriam necessárias outras diligências e mais provas para justificar a quebra de sigilo, e não apenas o relatório do Coaf. Assim, a operação foi considerada ilegal desde o início.
Além disso, a mesma turma avaliou que a quebra de sigilo bancário e fiscal fundada em relatório do Coaf não é ilegal. Isso porque as informações do órgão são confiáveis e justificam a medida.
Fonte: Conjur
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