Foi aprovado na Comissão de Finanças e Tributação da Câmara dos Deputados o projeto de lei nº 2557 que tenta instituir o Código de Defesa do Contribuinte em todo o território nacional.
A criação deste código de defesa representa uma inovação e uma evolução no modelo tributário nacional, uma vez que a relação entre os Fiscos e os contribuintes sempre foi regulada pelos princípios e normas oriundas do Direito Administrativo.
Isto porque, apesar de o direito tributário ser um ramo do direito público este regula uma matéria nuclear diferente da situação fática para qual o Direito Administrativo foi criado, uma vez que um quer aperfeiçoar as relações dos entes públicos entre si e perante todas as pessoas que tenham de se relacionar com eles, enquanto outro quer regular o direito arrecadatório do Estado.
O atual modelo tributário seguido em nosso país é regido pela Constituição Federal e pelo Código Tributário Nacional que buscou regular o direito arrecadatório do Estado, porém, este, quando foi criado, acabou por versar principalmente acerca dos instrumentos de cobrança e fiscalização do Estado para com os contribuintes.
Desta forma, na aplicação do direito tributário, percebe-se que por inúmeras vezes os Fiscos e os contribuintes ficam de fronte a algumas lacunas, como, por exemplo, o processo contencioso tributário que, por vezes, tem um rito e um foco diferente dos processos administrativos em geral, o que acaba por dificultar a aplicação das normas de direito tributário.
Assim, em âmbito nacional, esta legislação, se aprovada, representa uma evolução clara nas relações tributárias entre os entes públicos e os contribuintes que se sujeitam a eles.
Analisando o texto em discussão na Câmara dos Deputados percebemos que tal legislação origina-se com um escopo de atuação focado nos direitos e obrigações do contribuinte para com os Fiscos. Tais objetivos ficam evidentes quando observamos o art. 2 deste projeto de Lei que versa:
Art. 2º São objetivos do presente Código:
I – promover o bom relacionamento entre o fisco e o contribuinte, baseado nos princípios da lealdade, da cooperação, do respeito mútuo e da parceria, visando a fornecer ao Estado os recursos necessários ao cumprimento de suas atribuições;
II – proteger o contribuinte contra o exercício ilegal do poder de fiscalizar, de lançar e de cobrar tributo instituído em lei;
III – assegurar a ampla defesa dos direitos do contribuinte no âmbito do processo administrativo-fiscal em que tiver legítimo interesse;
IV – assegurar a adequada e eficaz prestação de serviços gratuitos de orientação aos contribuintes;
V – assegurar a manutenção e apresentação de bens, mercadorias, livros, documentos, impressos, papéis, programas de informática ou arquivos eletrônicos a eles relativos, com base no regular exercício da fiscalização.
Diante destes objetivos traçados, percebemos que esse código de defesa acaba por corroborar e evidenciar proteções aos contribuintes que, independentemente da aprovação dessa lei, deveria ser observado pelos Fiscos de todo o país.
Assim, são garantidos também ao contribuinte os seguintes direitos:
a) O adequado e eficaz atendimento pelos órgãos e unidades fazendários;
b) A identificação do servidor nos órgãos públicos e nas ações fiscais;
c) O acesso a dados e informações pessoais e econômicas que a seu respeito constem em qualquer espécie registro, informatizado ou não, dos órgãos integrantes da Administração Tributária Federal, Estadual, Distrital ou Municipal, salvo se comprometer atividades de inteligência, de investigação ou de fiscalização cujo teor seja objeto de procedimento fiscal efetivamente instaurado;
d) A retificação, complementação ou atualização de dados incorretos, incompletos, dúbios ou desatualizados e a eliminação de dados obtidos por meios ilícitos;
e) A certidão sobre atos, decisões ou pareceres constantes de registros ou autos de procedimentos de seu interesse, salvo se a informaçãosolicitada estiver protegida por sigilo, observada a legislação pertinente;
f) A efetiva educação tributária e a orientação sobre procedimentos administrativos;
g) O recebimento de comprovante descritivo dos bens, mercadorias, livros, documentos, impressos, papéis, programas de computador ou arquivos eletrônicos entregues à fiscalização ou por ela apreendidos;
h) A informação sobre os prazos de pagamento e reduções de multa, quando autuado;
i) A ciência formal da tramitação de processo administrativo-fiscal de que seja parte, a vista dos autos, no órgão ou repartição fiscal, e a obtençãode cópias, inclusive por intermédio de procurador regularmente constituído, mediante ressarcimento dos custos da reprodução;
j) A preservação, pela administração tributária, do sigilo de seus negócios, documentos e operações, exceto nas hipóteses previstas na legislaçãoespecífica;
k) O encaminhamento, sem qualquer ônus, de petição contra ilegalidade ou abuso de poder ou para defesa de seus direitos;
l) A utilização de meios eletrônicos que facilitem o exercício das obrigações de contribuinte e acompanhamento do processo administrativo fiscal;
m) A compensação, restituição, ressarcimento ou pagamento em espécie, em prazo razoável e economicamente eficaz, dos créditos de que seja titular em decorrência da legislação tributária;
n) A exclusão da responsabilidade pelo pagamento de tributo e de multa não previstos em lei;
o) A presunção relativa de verdade nos lançamentos contidos em seus livros e documentos contábeis ou fiscais, quando fundamentados em documentação hábil.
Compulsando as garantias elencadas ao contribuinte percebemos que essa legislação visa trazer um maior equilíbrio nas relações entre Fisco e contribuintes, bem como uma maior segurança jurídica nos próprios atos dos entes públicos na sua função de fiscalizar, já que todos esses direitos e garantias trazidos estão em conformidade com a Constituição Federal e com os princípios de direito processual e administrativo.
Vemos ainda que esta lei também se preocupou em trazer determinadas obrigações dos contribuintes para com os Fiscos, quais sejam:
I – O tratamento, com respeito e urbanidade, aos funcionários da administração fazendária do Estado;
II – A identificação do titular, sócio, diretor ou representante nas repartições administrativas e fazendárias e nas ações fiscais;
III – O fornecimento de condições de segurança e local adequado em seu estabelecimento, para a execução dos procedimentos de fiscalização;
IV – A apuração, declaração e recolhimento do imposto devido, na forma prevista na legislação;
V – A apresentação em ordem, quando solicitados no prazo estabelecido na legislação, de bens, mercadorias, informações, livros, documentos, impressos, papéis, programas de informática ou arquivos eletrônicos;
VI – A manutenção em ordem, pelo prazo previsto na legislação, de livros, documentos, impressos e registros eletrônicos relativos ao imposto;
VII – A manutenção, junto à repartição fiscal, de informações cadastrais atualizadas e verazes relativas ao estabelecimento, titular, sócios ou diretores.
Adentrando aos deveres imputados à Administração Fazendária nesta legislação, devemos destacar duas que nos chamam atenção: são as de que as respostas às consultas escritas deverão observar o prazo de 30 dias, respeitando-se a demanda de serviço dos servidores; e ainda que as certidões deverão ser fornecidas em até 10 dias após o seu requerimento.
Considerando todos estes pontos trazidos pela legislação, tal projeto tenta ainda criar um Sistema de Defesa do Contribuinte através da autorização para que as Receitas de cada ente federativo possam instituir conselhos de defesa de contribuintes que deverão ser compostos por Poder Público e de entidades empresariais, de classe e dos trabalhadores e tem por objetivo planejar, elaborar, propor, coordenar e fiscalizar a execução de políticas voltadas à proteção do contribuinte.
Diante de todas estas características apontadas no projeto de lei em trâmite na Câmara dos Deputados, percebemos que esta legislação vem tentar equilibrar as relações de convivência entre os contribuintes e o Fisco e, se for efetivada, poderá trazer maior proteção a todos os contribuintes para evitar possíveis abusos na relação que atualmente é bastante problemática e desigual.
por Sylvio César Afonso - Advogado e contabilista em São Paulo. Mestre em Direito Tributário pela PUC/SP. Auditor pelo IBRACON. Conselheiro do Conselho Municipal de Tributos de SP
Fonte: Jota
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