terça-feira, 20 de janeiro de 2015

20/01 O desafio do profissional da contabilidade gerencial

Historicamente, a contabilidade gerencial sempre representou uma visão ou perspectiva diferente de apresentação das informações contábeis, com foco no suporte ao processo de gestão dentro das organizações, baseada na contabilidade tradicional – societária, financeira e de custos – e também nas técnicas de análise de balanços. Cabe salientar, no entanto, que, considerando o dinamismo do ambiente de negócios, o modelo embasado em informações essencialmente financeiras não atende mais às necessidades de apoio ao processo decisório.

A evolução do mercado e a complexidade dos modelos de negócios, caracterizados pela alta concorrência e pelas vantagens competitivas voláteis, têm exigido de todos os seus agentes uma revisão de estratégias, posturas e procedimentos adotados pelos gestores. A capacidade de gestão torna-se, cada vez mais, um elemento fundamental para o sucesso e a perenidade de uma organização. Decisões orientadas de curto prazo, mas, sobretudo, alinhadas a projeções de cenários futuros e à continuidade do negócio, considerando posicionamentos e estratégias de mercado, dependem de informações tempestivas e consistentes.

Paralelamente, é cada vez mais premente a necessidade de implementação e manutenção de práticas de Governança Corporativa. Consideradas um dos principais aspectos de discussão sobre gestão, tais práticas contemplam o processo decisório adotado pela alta administração das sociedades e o relacionamento com os seus diversos usuários (stakeholders).

Da mesma forma, a adoção das normas internacionais de contabilidade proporcionou um aumento no nível de responsabilidade das empresas como um todo, caracterizando um processo de gestão de mudança organizacional, que vem afetando diversos aspectos do ambiente interno e dos processos de uma empresa, muito além da simples apresentação e divulgação de demonstrações contábeis. A contabilidade financeira, que era muito questionada quanto à validade e à utilidade de suas práticas, passou a ter, em teoria, uma visão mais prospectiva e subjetiva, se aproximando da contabilidade gerencial no subsídio do processo de gestão dos negócios.

Nesse sentido, torna-se fundamental a reflexão quanto à oportunidade de uma maior inserção do profissional contábil no processo decisório das organizações. Os contadores têm sido exigidos a ampliar suas habilidades para atender de forma eficaz às demandas desse novo ambiente. Habilidades pessoais, entendimento do negócio e participação mais ativa no processo de gestão passaram a integrar o novo perfil do profissional contábil. Enfim, é fundamental que os profissionais contábeis passem a dedicar esforços às atividades de maior conhecimento e agregação de valor às organizações.

As novas dimensões da contabilidade formam e exigem um quadro geral de avaliação do desempenho, que não apenas tem poder explicativo sobre o estado atual das empresas, mas, também, permite projeções e simulações de cenários futuros, dando lugar à exploração de oportunidades e ao gerenciamento de riscos, ambos de vital interesse para os stakeholders de qualquer sociedade.

As novas dimensões e oportunidades de posicionamento e atuação do profissional contábil, sobretudo aquele dedicado à contabilidade gerencial, acabam esbarrando em aspectos culturais, decorrentes do desvio do foco gerencial e da subordinação aos interesses fiscais, que sempre fizeram com que ele se afastasse do ambiente decisório e se sentisse incapaz de participar e servir às finalidades da gestão empresarial.

De modo geral, historicamente, na visão da alta administração das organizações, a contabilidade deveria estar voltada para minimizar o grau de exposição tributária. Esta posição, além de praticamente restringir a importância que as demonstrações contábeis poderiam ter para a gestão, tem sido responsável pela projeção de uma imagem social extremamente desfavorável da figura do profissional contábil e de seu trabalho.

É óbvio que as decisões empresariais precisam de informações pertinentes e relevantes para dar-lhes fundamento e orientação. Como consequência, se os profissionais contábeis não demonstrarem interesse e não estiverem preparados para fornecer tais informações, outros especialistas irão, inevitavelmente, aproveitar a oportunidade e assumir essa função.

Com base em determinadas pesquisas sobre o perfil do profissional contábil, é importante destacar, de forma específica, a necessidade de mudança de perfil. A formatação do novo perfil dos profissionais da contabilidade, conforme o American Institute of Certified Public Accountants – AICPA (Instituto Americano de Contadores Públicos Certificados), órgão norte-americano equivalente ao Conselho Federal de Contabilidade – CFC, deve ser estruturada sob três esferas de competência: (i) funcionais – conhecimentos técnicos e práticos sobre modelos de tomada de decisões, análises de risco, modelos de mensuração, técnicas de reporte, capacidade e técnica de pesquisa e a capacidade de alavancar e usar tecnologia; (ii) pessoais – desenvolver modelos de comportamento profissional, capacidade de resolver problemas e tomar decisões, técnicas de relacionamento, liderança, comunicação, gerenciamento de projetos e capacidade de alavancar e usar tecnologia; e (iii) amplo entendimento de negócios – pensar de forma estratégica e crítica, ter conhecimentos segmentados por indústria, ter uma perspectiva e entendimento global e internacional, conhecer técnicas de gerenciamento de recursos, entender implicações legais e fiscais nos negócios, focalização em clientes e em marketing.

As pesquisas também apontaram que, de forma geral, o profissional contábil tem condições de manter adequado nível de comunicação e de capacidade na tradução de informações complexas em conhecimento crítico, pois são habilidades racionais, objetivas e que podem ser realizadas através da aplicação de regras, com baixo risco envolvido; porém, quanto à percepção e à criação de oportunidades para transformar ideias em realidade, devido ao alto grau de subjetividade e risco envolvidos, normalmente o profissional contábil apresenta dificuldades, pois a percepção de oportunidades externas ao contexto habitual de regras ou colocar em prática ideias inovadoras sem garantias de sucesso são ações que o profissional contábil tem predisposição a evitar, se não houver um argumento racional suficientemente forte para tolerar o risco.

Em síntese, o futuro da contabilidade gerencial é bastante promissor! Atualmente, podemos verificar a crescente valorização do profissional contábil, tanto do ponto de vista de remuneração quanto de envolvimento estratégico nas organizações. Cabe salientar, no entanto, que o sucesso está diretamente relacionado à superação de desafios, principalmente, quanto à “quebra de paradigmas” e à “mudança de cultura”, que estão, de forma substancial, relacionados à “zona de conforto” de atuação, tradicional e hermética.

por Contador Roberto Zeller Branchi - Coordenador do Grupo de Estudos de Contabilidade Gerencial do CRCRS


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