Recentemente, a Receita Federal do Brasil (RFB) mudou seu entendimento com relação à natureza tributária dos serviços de oferecimento de plataformas de computação em nuvens (cloud computing) nas suas mais diversas modalidades — como data centers, storage as a service, software as a service (SaaS), infrastructure as a service (IaaS), entre outras — quando estas estão em local diverso do Brasil. Essa mudança poderá ter impactos financeiros vultosos e alterar a estratégia de mercado de várias empresas nacionais. Necessário, portanto, analisar as alterações ocorridas e desenhar uma melhor estratégia visando evitar custos além do estritamente necessário.
Com o objetivo de unificar seu entendimento, a RFB emitiu a Solução de Divergência Cosit 6/2014, que estabeleceu que a atividade de disponibilização de data centers localizados em outros países para residentes no Brasil não possui natureza de locação de bens móveis (visto que não há a efetiva entrega da coisa locada), mas natureza de uma típica prestação de serviços. Nesse sentido, sobre as remessas para pagamento dos serviços prestados por data center devem incidir o Imposto sobre a Renda Retido na Fonte (IRRF), a Cide/royalties e as contribuições PIS-Importação e Cofins-Importação, nos termos da legislação aplicável.
Isso acarretará impactos tributários imediatos. Todavia, a arquitetura dos serviços de cloud computing deve ser levada em consideração. Afinal, definir o que é bem móvel ou prestação de serviços é uma tarefa árdua, principalmente quando se trata de serviços de cloud. Storage é apenas serviço? E o hardware? A contratação de aplicações como ERP e CRM é um serviço? Há a transferência de tecnologia em um contrato desse tipo?
Uma vez que não é passível, para efeitos tributários, de segregação os equipamentos e a gestão dos serviços de apoio que compõem a oferta de software, ela pode ser tributada como serviço? E o serviço de processamento de dados? É possível fazer a segregação entre o que é serviço de hardware, serviço de software e serviço de processamento de dados?
Para a RFB, a atividade de prestação de serviço por um data center, tendo em vista sua própria natureza, não é passível de segregação para efeitos tributários entre os equipamentos e a gestão dos serviços de apoio que a compõem, pois estes se subsumem naqueles.
Corroborando a posição pretérita, a RFB ratificou esse entendimento, e também modificou retroativamente as decisões contrárias emitidas acerca do mesmo assunto. Tal ADI é vinculante para futuras decisões e fiscalizações.
Todavia, esse entendimento traz inúmeras controvérsias, eis que não deixa claro quais são esses serviços. O texto diz apenas que "as remessas para o exterior em pagamento pela utilização remota de infraestrutura para processamento de dados e armazenamento de informações em alta performance (data center) constituem remuneração pela prestação de serviços técnicos e estão sujeitas à incidência de IRRF, Cide/royalties e PIS/Cofins".
Anteriormente, havia dúvida se a disponibilização de data centers para residentes no Brasil deveria ser tributada (i) como uma locação de equipamentos para armazenamento e/ou processamento de dados ou (ii) como um serviço. Tal discussão trouxe interpretações divergentes no âmbito da Receita.
Contudo, as consequências dessa distinção são relevantes na aplicação da legislação tributária federal, visto que o pagamento a um residente no exterior pela prestação de serviços está sujeito à incidência do Imposto sobre a Renda Retido na Fonte (IRRF), da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) e das Contribuições sobre a Importação (PIS/Cofins-Importação), ao passo que o pagamento a não residentes no Brasil pela locação de bens móveis está sujeito exclusivamente ao IRRF.
As contribuições sobre a importação serão calculadas mediante aplicação da alíquota de 1,65% para o PIS-Importação e 7,6% para a Cofins-Importação, sobre o valor remetido para o exterior, antes da retenção do Imposto de Renda, acrescido do ISS incidente sobre a importação do serviço e do valor das próprias contribuições.
Há de se defender, como feito anteriormente pela Superintendência da 8ª Região Fiscal (São Paulo), que as remessas relativas ao contrato pelo aluguel dos servidores não sofrem a incidência do PIS-Importação nem da Cofins-Importação, por ausência de previsão legal; também não haveria a incidência dessas mesmas contribuições sobre as remessas em pagamento pela prestação de serviços necessários ao "bom funcionamento dos servidores locados", constantes de outro contrato, porque seriam serviços cujos resultados se verificam no exterior.
Como também é possível a defesa da não incidência da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide), incidente sobre valores remetidos ao exterior, instituída para apoio ao desenvolvimento tecnológico brasileiro, pela Lei 10.168 de 29 de dezembro de 2000, alterada pela Lei 10.332 de 2001 e, mais recentemente, pela Lei 11.452 de 2007, eis que essa contribuição somente é devida nos casos em que haja transferência de tecnologia, o que não é o caso da contratação dos data centers, diga-se.
por Gabriela Coutinho Frassinelli é coordenadora das áreas tributária e societária do Opice Blum, Bruno, Abrusio e Vainzof Advogados Associados.
Fonte: Conjur
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