Contribuintes vêm recorrendo ao Judiciário para forçar o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) a julgar de forma mais rápida os seus recursos. Um deles, cujo o processo estava parado há mais de três anos, sem sequer ter sido distribuído, por exemplo, obteve recentemente uma liminar para que o julgamento ocorra em até 30 dias. Com a decisão, o caso foi pautado para a sessão de hoje.
Na prática, no entanto, raramente é cumprido. Um levantamento divulgado no site do próprio Carf mostra que o tempo médio para julgamento nas turmas extraordinárias, por exemplo, que analisam os casos de menor complexidade e baixo valor, é de seis anos e um mês.
Nas turmas ordinárias, o prazo é menor do que nas extraordinárias, mas ainda fica acima do previsto na legislação. São, em média, dois anos e dez meses até o julgamento. Já na Câmara Superior, para onde são direcionados os processos quando há decisões divergentes sobre um mesmo tema nas turmas, leva-se aproximadamente um ano e dois meses.
A empresa que há poucos dias obteve liminar para que a análise do seu recurso ocorra em, no máximo, 30 dias aguarda desde agosto de 2015 por uma resposta do Carf. O caso trata de um pedido de restituição por tributos que foram pagos de forma indevida ao governo. São cerca de R$ 1,5 milhão envolvidos.
O juiz da 14ª Vara Federal Cível do Distrito Federal, Waldemar Claudio de Carvalho, que julgou esse caso, levou em conta os 360 dias previstos na legislação e também a Constituição Federal para conceder a liminar (processo nº 1023233-96.2018.4.01.3400).
"Ainda que se reconheça que o órgão encontra-se sobrecarregado com o número de demandas apresentadas, o artigo 5º da Constituição Federal resguarda ao cidadão o direito à duração razoável do processo", afirma o magistrado na decisão.
Após a decisão da Justiça, em fevereiro, o recurso do contribuinte (nº 35476.001355/2007-99) foi distribuído para a 2ª Turma da 2ª Câmara da 2ª Seção do Carf e pode ser julgado hoje.
A empresa busca a restituição de valores referentes a tributos que foram consideradas indevidos em uma ação judicial movida na década de 90. A discussão, já finalizada e que gerou o crédito ao contribuinte, envolvia o pagamento de contribuição previdenciária sobre a remuneração de administradores e funcionários autônomos.
Esse caso voltou ao Carf porque a Receita Federal negou o pedido de restituição de tais valores. Para o órgão, a decisão da Justiça autorizava somente a compensação (o uso do crédito para quitar tributos) e não a restituição. A delegacia regional, primeira instância administrativa, concordou com essa argumentação e o contribuinte, então, apresentou recurso ao Conselho.
"É um crédito razoável para a empresa e o recurso estava lá parado há mais de três anos e sem data prevista para a análise. Se não tivéssemos entrado com a ação judicial certamente levaria ainda muito mais tempo", afirma o representante do contribuinte no caso, o advogado Washington Lacerda, do escritório Piazzeta, Rasador e Zanotelli Advocacia Empresarial.
Uma outra empresa, no fim do ano passado, também obteve decisão da Justiça em razão da demora nos julgamentos do Carf. A liminar, proferida pela 6ª Vara Federal do Distrito Federal, determinava a análise imediata de três recursos que estavam parados há mais de cinco anos no Conselho (mandado de segurança nº 1014280-46.2018.4.01.3400).
O contribuinte, nesse caso, buscava a aplicação, pelos conselheiros, de decisão definitiva da Justiça que lhe garantia crédito presumido de IPI sobre todas as aquisições de insumos produzidos por pessoas físicas, cooperativas e outros fornecedores não contribuintes de PIS e Cofins.
Especialista em direito tributário, Marcelo Annunziata, do escritório Demarest, diz que é bastante comum ver esse tipo de ação judicial em relação aos pedidos de recuperação de crédito que estão pendentes de análise ainda na primeira instância administrativa. "Porque lá também costuma levar anos até que o contribuinte tenha uma resposta. E, por tratar de recuperação de crédito, tem impacto no caixa das empresas", afirma.
É pouco provável que a Justiça não atenda o pedido do contribuinte nos casos em que a espera se estende por anos, observa a advogada I Jen Huang, do escritório Siqueira Castro. Isso porque o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já se manifestou, em caráter repetitivo (REsp nº 113 8206), pela aplicação do prazo previsto no artigo 24 da Lei nº 11.457. "Há jurisprudência consolidada em relação ao cumprimento dos 360 dias pela administração pública e deve ser seguida pelos magistrados."
A decisão em repetitivo do STJ foi proferida em um processo do Rio de Janeiro, em que o Fisco do Estado havia levado aproximadamente 12 anos para julgar, de maneira definitiva, uma ação administrativa.
O Carf informou, por meio de nota ao Valor, que não se manifesta sobre processos específicos de contribuintes. Afirmou, no entanto, que "o tempo de julgamento é resultado do número de processos em seu acervo e da capacidade limitada de julgamento" e frisou que vem trabalhando para cumprir a sua missão e adotando medidas para se tornar mais eficiente, como a criação das turmas extraordinárias, em 2017.
"Quando comparamos as horas dos processos julgados em 2018 com as de 2016, identificamos que o Carf julgou 63% a mais do que em 2016. Comparando com 2017, julgamos 25% a mais. Ou seja, estamos efetivamente reduzindo o estoque de processos em termos de horas de julgamento, julgando dentro da nossa capacidade máxima", diz.
Por Joice Bacelo | De Brasília
Fonte : Valor
Via Alfonsin.com.br/
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