segunda-feira, 11 de março de 2019

Imbróglio das compensações financeiras só se resolve com reforma tributária

Um tema que merece reflexão e que ganhou destaque nos últimos dias é a questão da compensação financeira aos estados, por causa da desoneração das exportações. O assunto se tornou um verdadeiro imbróglio.

A Lei Complementar 87/1996 (Lei Kandir), em seus artigos 3º, II, e 32, I, dispõe que o ICMS não incide “sobre operações que destinem ao exterior mercadorias, inclusive produtos primários e produtos industrializados semielaborados, bem como sobre prestações de serviços para o exterior”. Ou seja, por meio dessa regra, os estados devem desonerar as exportações ocorridas em seus territórios.

Por outro lado, o anexo da própria Lei Kandir prevê a possibilidade de compensação financeira pela perda de arrecadação decorrente das desonerações. Em 2003, o montante a ser repassado era de R$ 3,9 bilhões.

Em 2004, o repasse passou a depender de negociação entre estados e União (ou seja, não há um valor prefixado). O artigo 91 do ADCT (Ato das Disposições Constitucionais Transitórias) dispõe que o montante a ser repassado deveria estar previsto em lei complementar, que estabeleceria os critérios, prazos e condições para o repasse.

A primeira questão é: foi editada lei complementar que regulamente o repasse? Não. Mas o Supremo Tribunal Federal, na ADO 25/DF, julgada em 2016 (aqui), estabeleceu um prazo de 12 meses para que a legislação fosse editada pelo Congresso Nacional. Em caso de descumprimento do prazo, a própria corte constitucional fixou que o Tribunal de Contas da União deveria intervir e fixar o montante e os critérios para o repasse.

A segunda questão é: o prazo foi atendido? Não. Mas tramita, ainda, o Projeto de Lei Complementar 511/2018, que está pronto para votação no Plenário da Câmara. A proposta prevê o pagamento do valor de R$ 39 bilhões aos estados.

Conforme vem sendo noticiado, contudo, a área técnica do TCU afirma que a União não deve ressarcir os estados. Apesar disso, o próprio tribunal, em notícia publicada em seu site, avocou para si o dever de definir o montante a ser repassado e os critérios para tanto. Mas o próprio TCU reconhece que não é competente para definir regras sobre tal matéria.

Por outro lado, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM), sugere que as regras da desoneração das exportações pelo ICMS sejam revogadas, dando maior liberdade aos estados de tributarem ou não as saídas para o exterior, observado um período de transição. Maia ainda informou que solicitara ao STF prorrogação do prazo de 12 meses, já expirado, para a resolução do imbróglio.

As soluções que se afiguram até o momento não são das melhores.

O Projeto de Lei Complementar 511/2018 prevê dispêndio considerável de valores pela União. Isso pode comprometer o combalido orçamento federal (a regra orçamentária é que os valores não serão considerados despesas de caráter continuado). Em suma, se os estados estão quebrados, o cobertor da União é curto.

Ainda, se o TCU confirmar a desnecessidade de repasse da União aos estados — o que é pouco provável —, o drama estadual tomará novas proporções.

Por outro lado, a revogação da regra da desoneração do ICMS nas exportações é péssima para os contribuintes. A medida ainda pode gerar novos conflitos interfederativos. Isso porque os estados serão colocados em posição de atrair investimentos, por meio da desoneração das exportações, concedidas na legislação interna de cada ente federativo.

A solução menos trágica para o passado não é a desoneração das exportações, e sim a aprovação do PLP 511/2018, de acordo com o artigo 91, do ADCT. Até porque, de fato, o TCU não tem a competência originária para resolver a solução.

Então, apesar de a decisão do STF ter sido bem clara, espera-se que a corte conceda uma dilação de prazo para edição da lei complementar, sem abrir margem para novas propostas que tendam a prejudicar os contribuintes.

De todo modo, a melhor saída para o futuro deve vir do governo: reformar o sistema tributário e unificar os impostos do consumo (com a extinção do próprio ICMS). Não adianta discutir o déficit causado pela desoneração das exportações do ICMS se não considerarmos que o próprio sistema tributário, do jeito que está, prejudica a arrecadação dos estados e o bolso dos contribuintes. Ou seja, é melhor que tudo mude, para que não tenhamos mais retrocessos pela frente, como pode ocorrer, caso as exportações sejam tributadas.

João Vitor Kanufre Xavier da Silveira é advogado tributarista do Viseu Advogados.

Fonte: Conjur

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