O Tribunal Superior do Trabalho, pela Subseção 1 Especializada em Dissídios Individuais, ao julgar incidente de recurso de revista repetitivo (IRR-190-53.2015.5.03.0090), definiu importante questão sobre a responsabilidade do dono da obra quanto a obrigações trabalhistas do empreiteiro.
Primeiramente, cabe esclarecer que o art. 455, caput, da CLT versa sobre os contratos de subempreitada, estabelecendo a responsabilidade do subempreiteiro pelas obrigações derivadas do contrato de trabalho que celebrar. Nada mais coerente, pois o subempreiteiro, como empregador, responde pelos direitos trabalhistas de seus empregados.
Como se nota, o empreiteiro, mesmo não sendo o empregador, responde pelo inadimplemento de obrigações trabalhistas dos empregados do subempreiteiro contratado. Tanto é assim que o parágrafo único do art. 455 da CLT ressalva ao empreiteiro, nos termos da lei civil, ação regressiva contra o subempreiteiro e a retenção de importâncias a este devidas, para a garantia das obrigações previstas no referido dispositivo legal.
Logo, apesar da responsabilidade do empreiteiro, a lei indica que o responsável principal, na realidade, é o empregador (subempreiteiro).
Observa-se que a responsabilidade do empreiteiro é subsidiária, pois o parágrafo único do art. 455 da CLT, ressalva o exercício do direito de regresso pelo empreiteiro que pagar o crédito trabalhista, em face do subempreiteiro, reembolsando-se, assim, da totalidade do valor pago, justamente porque este é devedor e o responsável principal. A mesma norma assegura o direito de retenção de importância a este devida.
Se a hipótese fosse de responsabilidade solidária, o pagamento pelo empreiteiro apenas acarretaria o direito deste exigir, do subempreiteiro, a sua quota, presumindo-se iguais, no débito, as partes de todos os codevedores (art. 283 do Código Civil).
Como a responsabilidade do empreiteiro surge somente se houver o inadimplemento pelo subempreiteiro, o patrimônio daquele responde, para a satisfação do crédito trabalhista, apenas na ausência de bens deste, que é o efetivo devedor e o responsável principal[1].
A rigor, o art. 455 da CLT, ao tratar da relação do empreiteiro com subempreiteiro, não prevê a responsabilidade automática do dono da obra, ou seja, daquele contratou o empreiteiro, quanto às obrigações trabalhistas pertinentes aos empregados deste último.
Eis a explicação para o que dispõe a Orientação Jurisprudencial 191 da SBDI-I do TST, com a seguinte redação:
“Contrato de empreitada. Dono da obra de construção civil. Responsabilidade. Diante da inexistência de previsão legal específica, o contrato de empreitada de construção civil entre o dono da obra e o empreiteiro não enseja responsabilidade solidária ou subsidiária nas obrigações trabalhistas contraídas pelo empreiteiro, salvo sendo o dono da obra uma empresa construtora ou incorporadora”.
Seguindo essa linha de entendimento, se a empresa, não sendo uma construtora nem incorporadora, apenas contrata o empreiteiro, por ser mera dona da obra, e não tomadora de serviços terceirizados, não responde automaticamente por obrigações trabalhistas pertinentes aos empregados do empreiteiro.
De acordo com a parte final desse verbete jurisprudencial, se o dono da obra for uma empresa construtora ou incorporadora, pode responder, de forma solidária ou subsidiária, pelas obrigações trabalhistas originadas de contratos de emprego mantidos pelo empreiteiro.
A ressalva se justifica porque, nesse caso, observa-se terceirização de serviço pela empresa construtora ou incorporadora, ao transferir parte de sua atividade ao empreiteiro.
Por isso, mesmo figurando como tomadora de serviço terceirizado licitamente, incide a responsabilidade subsidiária, conforme o art. 5º-A, § 5º, da Lei 6.019/1974, acrescentado pela Lei 13.429/2017, e a Súmula 331, item IV, do TST.
Tratando-se de mera intermediação irregular de mão de obra, por meio de empresa interposta, forma-se o vínculo de emprego diretamente com a empresa tomadora (Súmula 331, item I, do TST), desde que não se trate de ente integrante da administração pública (Súmula 331, item II, do TST).
Mais recentemente, o Tribunal Superior do Trabalho, no julgamento de incidente de recurso de revista repetitivo, fixou as seguintes teses jurídicas a respeito do tema:
“I) A exclusão de responsabilidade solidária ou subsidiária por obrigação trabalhista a que se refere a Orientação Jurisprudencial 191 da SDI-1 do TST não se restringe à pessoa física ou micro e pequenas empresas, compreende igualmente empresas de médio e grande porte e entes públicos (decidido por unanimidade);
II) A excepcional responsabilidade por obrigações trabalhistas prevista na parte final da Orientação Jurisprudencial 191, por aplicação analógica do artigo 455 da CLT, alcança os casos em que o dono da obra de construção civil é construtor ou incorporador e, portanto, desenvolve a mesma atividade econômica do empreiteiro (decidido por unanimidade);
III) Não é compatível com a diretriz sufragada na Orientação Jurisprudencial 191 da SDI-1 do TST jurisprudência de Tribunal Regional do Trabalho que amplia a responsabilidade trabalhista do dono da obra, excepcionando apenas ‘a pessoa física ou micro e pequenas empresas, na forma da lei, que não exerçam atividade econômica vinculada ao objeto contratado’ (decidido por unanimidade);
IV) Exceto ente público da Administração Direta e Indireta, se houver inadimplemento das obrigações trabalhistas contraídas por empreiteiro que contratar, sem idoneidade econômico-financeira, o dono da obra responderá subsidiariamente por tais obrigações, em face de aplicação analógica do artigo 455 da CLT e culpa in elegendo (decidido por maioria, vencido o Ministro Márcio Eurico Vitral Amaro)” (TST, SBDI-I, IRR – 190-53.2015.5.03.0090, Rel. Min. João Oreste Dalazen, j. 11.05.2017).
O maior destaque volta-se ao item IV, acima indicado, ao passar a prever que o dono da obra deve responder de forma subsidiária pelo inadimplemento dos créditos trabalhistas devidos pelo empreiteiro (quanto aos seus empregados) quando ficar demonstrada a inidoneidade econômica e financeira deste, com fundamento na analogia (arts. 8º, caput, e 455 da CLT) e na culpa do dono da obra na escolha do referido empreiteiro.
A solidariedade não se presume, por resultar da lei ou da vontade das partes (art. 265 do Código Civil), o que também deve ser aplicado, naturalmente, à responsabilidade subsidiária. Portanto, o mais adequado seria a responsabilidade do dono da obra decorrer de expressa previsão legislativa, respeitando-se, inclusive, o princípio da legalidade (art. 5º, inciso II, da Constituição da República).
[1] Cf. GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. Curso de direito do trabalho. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2017. p. 425-426.
Gustavo Filipe Barbosa Garcia
é professor Universitário e livre-docente pela Faculdade de Direito da USP.
Fonte: Genjuridico.com.br/
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