quarta-feira, 17 de maio de 2017

O NCPC e a eficácia vinculante dos precedentes no CARF

A coluna de hoje volta a abordar o instigante tema envolvendo a interação entre as normas do novo Código de Processo Civil (NCPC) e os processos administrativos-tributários. Para tanto, trazemos à análise acórdão proferido pela Câmara Superior de Recursos Fiscais (CSRF), que, por maioria de votos, decidiu que  “quando se tratar de atividades relacionadas aos serviços gráficos personalizados passíveis de tributação pelo ISS, é de se afastar a incidência de IPI, conforme inteligência promovida pelo art. art. 1º, § 2º, da LC 116/03.” (9303004.394).

Tal entendimento foi firmado a partir da verificação de que a matéria fática envolvida na discussão administrativa, assim como a tese jurídica apresentada pelo contribuinte, já havia sido objeto de inúmeros precedentes emanados pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), dando à aplicação do “Princípio da Eficácia Vinculante dos Precedentes“, explicitado que é pelo NCPC, em seus artigos 926 e 927, II.

Vale destacar que neste mesmo espaço e quanto a observação e aplicação do NCPC aos julgamentos levados a efeito pelo CARF, já tratamos de tal salutar prática processual em artigo intitulado “Responsabilidade tributária do contribuinte de direito” [1]

Na hipótese ora apresentada temos que Turma da CSRF debruçou-se sobre o seguinte questionamento: há incidência do IPI sobre cartões de crédito com tarja magnética confeccionados quando personalizados sob encomenda do contratante?

A decisão tomada por voto de qualidade e combatida em instância especial definira, em apertada síntese, que de acordo com a Lei Complementar 116/03 somente estava vedada a incidência sobre a mesma operação, tida como serviço, do ISS e do ICMS. Por outro giro, a contribuinte não resignada fundou seu apelo na afirmativa de que por se tratar de prestação de serviços personalizados sob encomenda não haveria a incidência do IPI, conforme, aliás, jurisprudência do CARF, do antigo Tribunal Federal de Recursos (TFR) e do STJ, com súmulas editadas sobre o tema nestes dois últimos Tribunais. Tudo isso somado, frisamos, com decisões judiciais proferidas sobre o mesmo tema e em favor de empresas posteriormente adquiridas pela própria contribuinte alvo da autuação.

De início, a corrente vencedora destacou a personalidade dos serviços gráficos prestados sob encomenda pela contribuinte, com especial atenção para “as atividades de confecção de impressos de segurança com tarja magnética como crachás e cartões plásticos” e “emissão, a migração de tecnologias customizadas, com o intuito de atender diferentes demandas“, estes prestados para clientes determinados.

E mais, consignou-se que a prestação de tais serviços estavam imbuídos de (i) perecibilidade, pois não verificado o armazenamento dos produtos confeccionados para venda; (ii) intangibilidade, uma vez que não podem ser os mesmos provados e vistos; (iii) heterogeneidade, em face de sua variação de cliente para cliente; e, (iv) simultaneidade, considerada a dinâmica entre produção e consumos daqueles produtos.

Encerrando a demonstração dos serviços sob encomenda prestados, asseverou-se “que os serviços customizados envolve interação direta com o cliente uma vez que a personalização do produto é alcançada de forma colaborativa entre a parte contratante e o contratado.“

Ato contínuo, promoveram os conselheiros julgadores a análise do dispositivo legal que regula o ISS (LC 116/03) sob a proteção e interpretação da jurisprudência; sendo a primeira do TFR que, já em 1983, veio a sumular o tema no sentido de que os “serviços de composição gráfica e impressão gráficas personalizadas previstos no artigo 8º, § 1º, do Decreto-lei n. 406, de 1968, com as alterações introduzidas pelo Decreto-lei n. 834, de 1969, estão sujeitos apenas ao ISS, não incidindo o IPI.“

Em seguida, debruçaram-se sobre jurisprudência do STJ firmada quando do julgamento de matéria em tudo semelhante à então submetida àquela Turma do CARF, com fechamento de tese pelo Tribunal Superior no sentido de que para empresas que produzem cartões magnéticos personalizados não há a incidência do IPI.

Concluída a exposição sobre o posicionamento jurisprudencial no sentido de não incidir o IPI para a prestação de serviços gráficos personalizados sob encomenda, e em reforço aos argumentos até então ali lançados, avocou-se para o encerramento dos debates a aplicação de regra processual contida no NCPC concernente a “eficácia vinculante dos precedentes” (artigos 926 e 927); considerado o estrito cumprimento à segurança jurídica, valoração a seus julgados e unicidade de interpretação, como reclamado pela própria Administração.

Por fim, é de se destacar a declaração de voto apresentada de modo apartado, com expressa manifestação de concordância com a aplicação do NCPC para a hipótese então examinada, considerando especificamente os fatos lá tratados, destacando por relevante que a observação a tal regra processual deverá ser reclamada com parcimônia pelo CARF, caso a caso e após minucioso confronto entre a situações fáticas e legais trazidas ao Tribunal Administrativo com aquelas reiteradamente apreciadas pelo Poder Judiciário.

Referência

[1] https://jota.info/colunas/coluna-do-carf/responsabilidade-tributaria-do-contribuinte-de-direito-18042017

Thales Stucky - Sócio da prática tributária do Trench, Rossi e Watanabe Advogados, LL.M. em Tributação Internacional pela New York University

Fonte: Jota.info/

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