sexta-feira, 6 de julho de 2018

Os laudos em discordância

Nós peritos, ora em vez, nos debatemos com um problema muito sério em nosso trabalho pericial, que seriam as discordâncias em relação às provas produzidas.

Num Estado de direito, é mister termos discordâncias, pois, ninguém se assume como dono da verdade, mesmo com todo os requisitos para ser considerado o mais apto a denotar uma evidência.

Fica normal e aceitável, alguns possuírem pontos de visões diferentes, e bases diferentes, o que pode levar a uma arrumação diversa daquela que se apresenta.

O problema do laudo pericial é que ele não é mera opinião, ele se constitui sim, como prova, ou OPINIÃO TÉCNICA, destarte, não pode ser tratado como qualquer coisa.

O laudo pericial não é opinião política, não constitui por assim dizer numa peça que ampara a um dos lados, que defende partidariamente uma pessoa, mas se alberga ao lado da verdade, ao posicionamento da demonstração, e claro, à ostentação da evidência lógica dos termos que devem ser aclarados conforme as dúvidas contábeis inerentes ao processo.

A discordância pode existir especialmente por algumas das partes que se sente prejudicada em quantidades ou qualidades de interpretação.

Geralmente, afeta mais ao setor das quantidades (casos de apuração de dívidas, de avaliação de ativos, de revisões de contrato, de cálculos de juros, de cálculos de ressarcimento, de casos de execução, etc), muito difícil é haver discordâncias de respostas, porém, sim dos valores, mas pode existir interpretações diferentes também em relação aos fatos. Ou seja, discordância qualitativas, existem. É o caso por exemplo de respostas vagas, sem sentido, sem um panorama adequado para esclarecimento. Respostas que giram e não chegam a lugar nenhum. Repostas sem objetividade. Todas estas pode ser solicitadas uma nova revisão do laudo, e uma nova proposta de esclarecimento, além de poder vir a exigir discordância automática.

No setor das quantidades é muito mais comum aparecerem quizilas sobre as mensurações, como diferenças de cálculo, de resultado, técnicas utilizadas, de soma, de números. Valores finais que podem ser discordantes. E também defeitos de metodologia. Embora o laudo pericial seja opinião técnica poderá ter escolhas de métodos, e neste interim, alguma metodologia pode não ser a mais apropriada para aquele caso. São fatos que podem vir a acontecer, mesmo assim a opinião do perito deve ser respeitada, porque dela que provêm o sanear da prova, e a posição geral de resolução da problemática.

Respostas que são confusas são trocadas muitas vezes em laudos complementares, ou melhor, mais bem esclarecidas, e os cálculos são também revisados.

Porém, muitas vezes o que se escolhe geralmente é fazer um laudo diferente, isto é, discordante.

O LAUDO DISCORDANTE é quando uma das partes faz um parecer diferenciado da outra, todavia, muitas vezes não se discorda de tudo mas de algumas partes.

No caso, o advogado do réu tem o direito de solicitar um assistente técnico, e do autor também, ambos podem ter laudo discordante.

Quando a perícia é feita em conjunto – caso muito raro -, o laudo em discordância é de algum perito que saiu do grupo para apresentar um resultado absolutamente diferente, ou mesmo com algumas minucias discrepantes daquelas feitas pela equipe de peritos.

É muito raro os três peritos trabalharem juntos. Mas quando acontece uma discordância alguém sai e faz o seu parecer.

O laudo em discordância é o mesmo parecer, só que a prova em resultado se diferencia daquela apresentada, pela equipe, ou pelo perito do juiz, embora todas as peças têm que ostentar a verdade.

É um problema muito sério, a questão de pareceres em discordância com “gosto do consumidor”. A pessoa contrata um profissional, e este infelizmente, aliado a interesses financeiros, deixa de ser técnico em suas afirmativas. Claro que este tipo de parecer é derrubado facilmente. Pareceres sem lógicas não podem persistir, no caso, este tipo de peça, facilmente, é contestada e desconsiderada em sua totalidade com muita velocidade.

A discordância portanto deverá ser com tratos de estilos nos quais se vai fazer as respostas, ou na qualidade das respostas, ou mesmo na quantidade que se encontrou, isto é, no resultado dos cálculos.

Um bom laudo em discordância é o que sabe discrepar da opinião alheia sem necessariamente atingir ao colega.

A discordância tem que ser de ideias e não de pessoas.

Discordância técnica não tem nada haver com pessoas, na política é diferente as ideologias se marcam com pessoas, e muitas vezes as críticas advêm com insultos pessoais, todavia, no parecer pericial jamais.

Vamos entender que apresentar o mero “discordo” não funciona em prova técnica, se não se demonstra o que realmente poderia estar diferenciado.

Discordar pelo discordar é fator de POLÊMICA, não tem nada que ver com QUALIDADE TÉCNICA.

Já vimos casos nos quais haviam discordâncias com pareceres nossos, todavia, não se apresentava o que discordava, apenas o DISCORDO.

Ou seja, DISCORDÂNCIA SEM CAUSA, é DISCORDÂNCIA VAZIA, é o mesmo que gritar no vácuo para alguém ouvir.

Logo, deve-se apresentar o discordar com a demonstração do que realmente deveria ser considerado, aí sim, teremos um sentido técnico.

Muitos peritos discordam e ficam discordando, com peças que não podem nem ser chamadas de periciais. É o que mais acontece. Aqui teríamos então um problema. A perícia fica sendo a ré, e o debate inócuo, fica girando em polêmicas do tipo “eu falei” e “você não falou”. Esta forma de pseudo-trabalho não chega a lugar nenhum.

É muito mais adequado, técnico, e ocular, apresentar a discordância em estilo superior, como: “temos uma visão diferente daquela apresentada pelo nobel colega”, “com uma visão dispare do conjunto”, “mesmo com uma observação unilateral, pensamos...”, “soa uma breve discordância, porque em nossa demonstração...”, “percebemos conteúdos diferentes...”, “há uma pequena discrepância em nossa interpretação...”, “entendemos diversamente...”, “nos permitimos pegar outra via...”, ou seja, no texto o estilo deve ser técnico e não pessoal. JAMAIS atinja o colega, pois, que bate vai ter que esperar o rebater, podendo virar uma discussão entre perito, o que não é positivo de modo algum para a solução do litigio, e o bom ambiente dos trabalhos.

As observações do tipo: “discordamos do perito”, “discordo”, “discordamos”, “discordamos do apresentado”, sem propor soluções, são vazias, vagas, débeis e sem sentido, não chegam a lugar nenhum. São errôneas por este motivo.

Às vezes por hábito e costume, o juiz tem que ainda atender a dúvida, ou a discordância vaga, para não dizer que ele estaria favorecendo a um dos lados. Todavia, sabemos claramente que este tipo de laudo não presta para trazer contribuições ao processo. Ele o faz para permitir o contraditório e neste decidir bem, todavia, a discordância sem fundamento e esclarecimento, é o mero urrar sem pronúncia de palavras.

Como dissemos: o mais correto seria a discordância com a apresentação da solução do problema, se tivermos a dúvida sem apresentação da resolução, fica praticamente um debate superficial, para se “ganhar tempo” e tentar gerar uma “intimidação” que não chega a lugar nenhum. Perícia não é debate É MOSTRAÇÃO DA VERDADE, portanto, é PROVA, não é adequado achar que perícia é mera opinião política por causa disso, pode girar numa peleja desnecessária entre peritos.

Obstante, o mais correto seria apresentar a discordância com a demonstração da prova, para resolver e aclarar melhor a temática, e não só apresentar polêmicas sem sentido. 

Por este fato que laudos em discordância são necessários e adequados para ajudar a esclarecer a verdade pertinente no processo, considerando aquilo que falamos antes; ninguém é dono da verdade, por este motivo seria impossível pensar que numa prova mesmo tecnicamente perfeita, não haja pontos a serem melhorados, ou até elementos que poderiam ser melhores esclarecidos, ou omissões mínimas. Isso pode existir mesmo em pareceres considerados bastante completos, ou com respostas bastante analíticas e minuciosas.

Além deste problema, podemos afirmar que no processo jurídico o juiz poderá decidir com base na leitura de um parecer, ou até mesmo com base na leitura geral, ele poderá usar o laudo em discordância ou não, ele tem liberdade para escolher, usando uma peça como fundamental, ou mesmo analisando todas elas para tirar uma conclusão.

O bom da discordância, como dissemos, está em clarear a verdade, e não necessariamente dispor de pontos de visões chulos, ou que tendem a favorecer a balança de um dos lados propositalmente. A linguagem do perito deve ser neutra. E sua tessitura argumental absolutamente técnica. Se isso não acontecer o laudo é tendencioso, prejudicando totalmente a prova, aliás se transforma num laudo que não é prova coisíssima nenhuma.

Ora em vez é normal se deparar com laudos em discordância, o mais importante é saber discordar e não simplesmente apresentar o discordar, se há diferenças que se apresente quais resultados se está chegando, ou qual seria o possível resultado na ótica que pensa estar mais adequada, senão, fica um tipo de “bate e volta” ou disputa sem sentido o trabalho pericial.

Todo perito deve estar preparado para a discordância, e obviamente, mostrar as razões do seu trabalho técnico, e se possível melhorá-lo pela dialética de novos âmbitos, que podem fazer o seu trabalho muito mais respaldado que antes da crítica.   

Rodrigo Antonio Chaves Silva é contador, especialista em gestão econômica das empresas, Professor universitário, perito judicial, consultor, analista e auditor, ganhador do prêmio internacional de contabilidade financeira Luiz Chaves de Almeida, e de história da contabilidade Martim Noel Monteiro, imortal da academia mineira de ciências contábeis, e possui 20 livros escritos.

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