O FGTS serve de fundo para financiamento de diversas atividades de interesse público. Este caráter institucional e parafiscal tem servido de argumento para alguns juízes julgarem improcedentes as ações que buscam a recomposição das perdas inflacionárias, argumentando que a conta vinculada compõe um fundo nacional, não se caracterizando apenas como um patrimônio individual do trabalhador.
Nos últimos meses, vem circulando pela internet notícias dando conta acerca do direito de recomposição das contas vinculadas do FGTS, em razão de perdas inflacionárias decorrentes da utilização da Taxa Referencial - TR como índice de correção monetária. Segundo tais notícias, este direito teria sido reconhecido por decisão do Supremo Tribunal Federal, o que traria considerável certeza de sucesso em eventual ação judicial visando reparar os prejuízos sofridos pelos trabalhadores.
Diante do excesso de informações e do imediato furor de trabalhadores que, em parte, demonstram considerar a certeza do direito de reparação de suas contas vinculadas ao FGTS, tornam-se convenientes alguns breves esclarecimentos sobre o tema.
Prima face, é relevante observar que o entendimento do Supremo Tribunal Federal acerca da inconstitucionalidade da utilização da TR como índice de correção monetária não é recente. Ao contrário, foi inicialmente proferida no julgamento da ADI 493 em 24/06/1992 que trata genericamente da questão envolvendo este índice. Recentemente, instado a se manifestar novamente sobre o tema, desta feita relacionada à correção monetária de precatórios, o Tribunal reiterou o entendimento sobre o assunto nos autos da ADI 4347. Nenhuma destas decisões, entretanto, refere-se especificamente à utilização da TR para correção monetária da conta vinculada do FGTS.
Isso não significa, em absoluto, afirmar que o pleito relativo ao FGTS seja indevido, mas sim que não há decisão definitiva do STF reconhecendo o direito de recomposição do saldo da conta vinculada, uma vez que se pronunciou tão somente genericamente acerca da inconstitucionalidade da utilização da TR como índice de correção monetária.
Convém rememorar que a TR foi introduzida em 1991, através da Lei nº 8.177 e teve como objetivo, entre outras tantas medidas, provocar a desindexação da economia, passando a incumbir ao Banco Central divulgar tal índice de correção monetária.
Por sua vez, o FGTS é disciplinado pela Lei n. 8.036/90 prevendo em seu artigo 13º que os depósitos efetuados nas contas vinculadas devem ser corrigidos monetariamente com base nos parâmetros fixados para atualização dos saldos dos depósitos de poupança e capitalização de juros de (três) por cento ao ano. Em outras palavras o saldo deve ser capitalizado em 3% ao ano e atualizado mensalmente conforme a TR divulgada pelo Banco Central.
Ocorre, todavia, que a TR é afetada pela taxa básica de juros (SELIC), sendo que a partir de 1999 referida taxa foi sendo paulatinamente reduzida e, consequentemente, pressionando a TR para baixo, afetando diretamente a correção monetária das contas vinculadas ao FGTS. Por outro lado, como é cediço, a inflação manteve patamares constantes, criando um gap entre a correção monetária do FGTS e a inflação, representando sensível perda ao trabalhador. Apenas a título de ilustração estima-se uma diferença anual aproximada de 5% (cinco pontos percentuais) ao ano entre o índice que mede a inflação (INPC) e a correção monetária efetivamente aplicada às contas vinculadas.
Contudo, conforme dantes citado, o STF considerou inconstitucional a utilização da TR como índice de correção monetária, o que leva a conclusão lógica de que a taxa não poderia ser utilizada como índice de atualização das contas vinculadas ao FGTS. Por este motivo as notícias dão conta que os trabalhadores possuem direito de serem ressarcidos das perdas inflacionárias, animando grande parte a buscar o Poder Judiciário com este objetivo.
Há que se considerar, porém, que o FGTS tem caráter tipicamente parafiscal. Vale dizer que serve de fundo para financiamento de diversas atividades de interesse público, como é o caso do sistema financeiro de habitação e saneamento básico. Este caráter institucional tem servido de argumento para alguns juízes de primeira instância julgarem improcedentes as ações que buscam a recomposição das perdas inflacionárias, argumentando que a conta vinculada compõe um fundo nacional, não se caracterizando apenas como um patrimônio individual do trabalhador.
Além disso, ainda é prematuro dizer como se comportará o STF quando instado a se pronunciar especificamente sobre a questão envolvendo o FGTS, uma vez que as decisões relacionadas a temas de grande repercussão econômica são alvo de grande pressão, especialmente por parte do Governo Federal. Prova disso é o tema envolvendo as perdas inflacionárias dos planos econômicos, que ainda aguardam julgamento final.
Não se pretende, todavia, desestimular a busca pela reparação das perdas inflacionárias do FGTS. Parece-nos bastante fundamentada a tese de que os trabalhadores fazem jus à recomposição da conta vinculada do FGTS em razão da defasagem entre o índice inflacionário e a correção monetária através da TR. É necessário reconhecer, porém, que não há garantia de êxito, sendo essencial esclarecer as notícias que circulam pela internet, pois há um longo caminho a ser percorrido até que a questão esteja definitivamente resolvida.
Desta forma, compete aos trabalhadores, em primeiro lugar, obter um extrato de sua conta vinculada do FGTS e buscar um advogado de sua confiança, para que possam avaliar, em conjunto, os valores que podem ser pleiteados e os riscos da ação, sempre levando em consideração a necessária prudência evitando frustrar expectativas.
Autor: Fabio P. Silva
- Sócio da Weigand & Silva Advogados - Consultor Tributário - Professor de Contabilidade Tributária - Mestrando em Ciências Contábeis da FEA - USP - Especialista em Direito Tributário pela FGV - Especialista em Direito Empresarial pelo Mackenzie - Advogado e Contador
Fonte: APET
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