Embora o ICMS tem em sua essência a permissão da compensação do imposto pago na entrada com o débito gerado na saída, isto nem sempre ocorre ficando as empresas impossibilitadas desta compensação e com saldo credor acumulado de ICMS.
INTRODUÇÃO
O sucessivo acúmulo de saldo credor acumulado de ICMS, constitui um dos mais graves problemas tributários das empresas brasileiras sujeitas a este imposto, uma vez que ao suportar o ônus integral do Imposto estas empresas acabam perdendo em competitividade pois não conseguem compensar o imposto pago em suas compras.
Neste trabalho vamos abordar, de forma bastante sucinta, as diferentes hipóteses de formação de saldo credor acumulado de ICMS e seu tratamento a luz da Constituição Federal, comparando com as modificações efetuadas pelos Estados através dos seus regulamentos estaduais.
ORIGEM DO ICMS
O ICM – Imposto sobre Circulação de Mercadorias, foi criado pela Emenda Constitucional número 18, no ano de 1965, tendo a Constituição de 1988 lhe acrescentado alguns serviços, e uma letra ao fim da sigla, passando a denominar-se o que hoje conhecemos como ICMS – Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços;
O Artigo 155 da Carta Magna de 1988 autoriza os Estados e o Distrito Federal a instituírem este imposto, cujo princípio fundamental está definido no Inciso I, Parágrafo Segundo do mesmo artigo, que determina que este imposto:
“ I – será não cumulativo, compensando o que for devido em cada operação relativa a circulação de mercadorias ou prestação de serviços com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou outro Estado ou pelo Distrito Federal.”
SISTEMÁTICA DE APURAÇÃO
A principal característica deste tributo, portanto, trata-se justamente do direito de compensar por ocasião da incidência do ICMS nas vendas ou saídas do estabelecimento, o imposto anteriormente pago nas operações anteriores de compra. Devendo ser repassado aos cofres públicos, por ocasião da escrituração fiscal do ICMS, apenas a diferença entre:
i) os débitos de ICMS, destacados nas notas fiscais por ocasião das vendas.
ii) os créditos de ICMS, destacados nas notas fiscais de compras dos fornecedores.
Este alcance da compensação dos débitos gerados nas vendas, com os créditos pagos por ocasião das compras, não pode ser diminuído nem, muito menos anulado por normas infraconstitucionais, pois como o princípio da não cumulatividade tem o intuito de evitar que o ICMS distorça as formações nos preços e a própria competitividade das empresas.
Desta forma, ao cabo do processo econômico i) de produção, distribuição e comercialização da mercadoria e ii) de prestação dos serviços de transporte intermunicipal e de comunicações, quem acaba suportando, por inteiro a carga econômica do ICMS é o consumidor final.
Este foi o motivo que levou o Constituinte a conceber esta técnica pela qual o contribuinte i) transfere ao adquirente da mercadoria ou fruidor do serviço o ônus financeiro do imposto que adiantará ao Estado e ii) se credita do imposto que suportou em suas aquisições e que lhe foi transferido pelo seu fornecedor.
O ACÚMULO DE SALDO CREDOR DE ICMS
A compensação do ICMS devido entre as operações e prestações de entrada e saída é feita, ordinariamente, através do confronto periódico na conte corrente fiscal, na qual o saldo, se devedor, é pago, e, se credor, transferido para aproveitamento no período ou períodos seguintes.
Alguns Estados, cada qual através dos seus Regulamentos do ICMS, os quais são meras normas infraconstitucionais, acabam fazendo com que determinados segmentos empresarias mantenham constantemente o acúmulo de saldo credor acumulado de ICMS, ao determinar de alguma forma a não incidência do ICMS em suas saídas de mercadorias/insumos, ficando estas empresas sujeitas ao pagamento integral do imposto suportado em suas entradas de mercadorias/insumos.
O fato de uma empresa manter em sua escrita fiscal, sucessivamente saldo credor acumulado de ICMS, por força de uma legislação que não permite a compensação por ocasião das saídas, nada mais é do que uma espécie de confisco, além de onerar e prejudicar seriamente a competitividade destas empresas, por contrariar o princípio constitucional da não cumulatividade.
ESTRATÉGIAS QUE IMPEDEM A COMPENSAÇÃO
Várias são as estratégias pelos Estados através de seus Regulamentos do ICMS, de impedir que as empresas possam compensar seu ICMS pago por ocasião das entradas, em suas saídas. O que determina o acúmulo de crédito fiscal de ICMS, na escrita fiscal da empresa é a classificação em termos de Regulamento do ICMS com que a mercadoria/insumo ou serviço venha a sair do estabelecimento, de acordo com o que fora estipulado para esta saída no Regulamento do ICMS. As principais formas de acúmulo de créditos de ICMS são as saídas decorrentes de:
i) Imunidade, Exportação
ii) Isenção e Não Incidência
iii) Alíquota Zero, Alíquota ou Base de Cálculo Reduzida.
iv) Diferimento
De forma sucinta, vamos procurar estabelecer a diferenciação em cada uma destas modalidades, a partir de suas generalidades, vez que os aspectos práticos são definidos de forma diferenciada em cada unidade da federação a partir de seu Regulamento do ICMS.
Em termos financeiros, todos estes institutos citados se traduzem no simples fato de que estas saídas não suportam a incidência do Imposto. No entanto, cada um deles possui tratamento diverso, quando estivermos falando em termos de manutenção e aproveitamento do respectivo crédito gerado com outras atividades tributadas.
A IMUNIDADE DAS EXPORTAÇÕES
O acúmulo de saldo credor de ICMS gerado por operações de saídas do estabelecimento ao abrigo da Imunidade, por exemplo, quando esta saída imune do imposto for decorrente de saídas destinada a exportação, tem um tratamento totalmente diferenciado das demais formas de acúmulo de saldo credor de ICMS.
A Lei Complementar 87/96, conhecida como Lei Kandir, estabelece que o Brasil não pode exportar impostos, desonerando as saídas para exportação e permitindo manter o crédito de ICMS correspondente decorrente destas entradas.
No entanto, cada Estado estabelece em seu Regulamento do ICMS restrições a estas transferências decorrentes de exportações, impondo limites financeiros e outras condições que visem a impedir ou retardar estas transferências, por um motivo óbvio, pois em ocorrendo a compensação diretamente entre contribuintes, a arrecadação financeira do Estado com ICMS apresenta queda.
Este mesmo proceder de parte das Fazendas Estaduais ocorre com o saldo credor acumulado de ICMS, formado em função das demais saídas, acima mencionadas.
ISENÇÃO OU NÃO INCIDÊNCIA
Nas saídas de mercadorias/insumos onde não ocorre a tributação de ICMS, decorrentes de seu enquadramento nos institutos da isenção ou não incidência, a manutenção do crédito não é permitida por força da Constituição Federal, que no artigo II do parágrafo do Artigo 155 determina:
“ II – a isenção ou não incidência, salvo determinação em contrário a legislação:
a) não implicará crédito para compensação com o montante devido nas operações ou prestações seguintes
b) acarretará a anulação do crédito relativo ‘as operações anteriores.
No entanto existem as determinações em contrário, que se tratam de benefícios concedidos por alguns Regulamentos do ICMS chamados de benefícios da isenção com não estorno do crédito correspondente, razão pela qual estas saídas em determinadas situações também se enquadram nas hipóteses de acúmulo de saldo credor de ICMS.
ALÍQUOTA ZERO, BASE DE CÁLCULO OU ALÍQUOTA REDUZIDA.
No tocante a alíquota zero, encontram-se duas correntes, uma defendendo que alíquota zero equivale a dizer que o produto é tributado com o% de alíquota, e que em sendo tributado, estas saídas permitem a manutenção do créditos de ICMS por ocasião de suas compras.
Já outra corrente de entendimento, na qual o Jurista Ives Gandra Martins se enquadra, defende que: “a alíquota zero não é senão uma das formas de isenção, pois expressa, claramente em lei”. Ao prevalecer este entendimento, como vimos a isenção, via de regra não permite o aproveitamento de créditos de ICMS.
No que concerne a base de cálculo ou alíquota reduzida, é unânime o entendimento de que por óbvio tratam-se de situações tributadas, e que como tal permitem a manutenção dos respectivos créditos por ocasião das compras. A exceção corre por conta dos casos em que a legislação estadual estabelece regras diferentes deste tratamento, o que se constitui alvo longas demandas judiciais, onde buscam os contribuintes a autorização judicial para ver reconhecido o seu direito a estes créditos.
DIFERIMENTO
Diferimento, segundo nossos léxicos, é o ato ou efeito de diferir, adiamento, do Latin differre=demorar, dilatar adia. Logo, diferimento não é isenção, icentivo ou benefício fiscal na acepção do art. 155 da Constituição Federal aqui examinada.
Vimos até aqui, de uma forma sucinta, as formas técnicas de não incidência do ICMS nas operações de saídas, que por sua vez irão gerar tipos modalidades diferentes de formação de saldo credor acumulado de ICMS.
A questão dos créditos de ICMS, (e não do saldo credor acumulado), é assentada sobre o direito do contribuinte, relativamente as operações anteriores (aquisições de mercadorias com incidência do tributo). Assim tranquilo o direito aos créditos em razão de tais mercadorias virem a ser objeto de futuras operações tributadas (embora diferidas).
A saída ao abrigo do Diferimento, portanto, apesar de não ter a incidência do tributo, equivale a uma atividade tributada, só que o momento do fato gerador é postergado para a operação seguinte.
E como atividade tributada, os saldos credores acumulados em função do diferimento podem ser usados com qualquer outra atividade tributada a qual a empresa esteja fiscal e juridicamente habilitada a exercer.
SÍNTESE CONCLUSIVA
Diante do exposto, é fácil percebermos que quaisquer restrições em relação do princípio da não cumulatividade, só podem advir do Estatuto Supremo que a concebeu.
Tais restrições – vamos logo admitindo – existem. São apontadas na mesma Carta Magna, no inciso II do parágrafo segundo do artigo 155, a ISENÇÃO E NÃO INCIDÊNCIA. Apenas nestas hipóteses que é o princípio da não cumulatividade cede passo.
No entanto, como referimos inúmeras são as contendas judiciais, onde contribuintes buscam decretar a ilegalidade de restrições impostas pelo regulamento do ICMS, contrárias a norma estabelecida na Constituição Federal. Principalmente buscando o direito de manter o crédito nas saídas decorrentes da ALÍQUOTA ZERO, ALÍQUOTA REDUZIDA ou BASE DE CÁLCULO REDUZIDA.
Fartos tem sidos os precedentes jurisprudenciais que asseguram aos contribuintes o direito de transferência de saldo credor acumulado de ICMS decorrentes de saídas que destinem mercadorias e serviços ao exterior, sem as limitações impostas nos regulamentos do ICMS das unidades das federações, no que tangem a estes créditos decorrentes de EXPORTAÇÃO.
No que concerne aos créditos acumulados de ICMS decorrentes de saídas ao abrigo do diferimento, pelo fato de tais mercadorias virem a ser objeto de futuras operações tributadas, tem-se que o DIFERIMENTO equivale a uma atividade tributada, se sendo apenas uma postergação do recolhimento do imposto, o que ocorre na etapa seguinte.
A gestão dos impostos pode significar a vida longa ou morte precoce de um empreendimento. O ICMS, pela sua complexidade e alta alíquota é o imposto que mais onera os empreendimentos, tanto no aspecto controle quanto no aspecto financeiro.
O saldo credor acumulado de ICMS constitui verdadeiro confisco, vez que rompe a cadeia da não cumulatividade, ficando a empresa com o saldo credor com este ônus.
De acordo com o determinado no Regulamento do ICMS em cada unidade da federação, o saldo credor acumulado de ICMS, poderá ou não ser utilizado em proveito próprio, para compensação de outros débitos ou ainda transferido a terceiros.
Em determinadas situações, com o devido conhecimento da legislação aplicável, é possível transferir saldo credor acumulado de ICMS a estabelecimentos de terceiros, de forma administrativa, com autorização prévia da Secretaria da Fazenda.
por Ivo Ricardo Lozekam
Fonte: Contábeis
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