Demandas sociais por transparência e eficiência na gestão pública, aliadas à necessidade de adaptação do Brasil a uma padronização que possibilite aumento da atuação do País no cenário internacional, exigiram um novo modelo de informações da contabilidade aplicado ao setor público — que permitisse maior eficácia na execução de sua função precípua e constitucional, que é servir à sociedade.
Nesse contexto, em 2008, o Conselho Federal de Contabilidade (CFC) editou o documento “Orientações Estratégicas para a Contabilidade Aplicada ao Setor Público no Brasil”, no qual estabelecia, dentre outras diretrizes, o formato inicial para a convergência brasileira às Normas Internacionais de Contabilidade Aplicadas ao Setor Público (Ipsas, International Public Sector Accouting Standards).
A recomendação da STN é que a União, o Distrito Federal e cada estado e município desenvolvam seus próprios planos referentes à implantação, respeitando os prazos estabelecidos — atrasos podem sujeitá-los a penalidades previstas na Lei Complementar 101/2000, como impedimento de receber transferências voluntárias e de contratar operações de crédito.
No âmbito dessa agenda, as unidades federativas têm uma lição de casa a ser concluída ainda em 2016, devendo adequar-se à estrutura conceitual das Ipsas e adotar cinco das 32 normas previstas: as de número 9 (referente à receita de transações com contraprestação), 12 (estoques), 19 (provisões, passivos e ativos contingentes), 23 (receitas de transações sem contraprestação) e 32 (concessões e parcerias público-privadas). As demais serão implementadas em fases, até 2024.
Em termos de ganhos para o Brasil, a adoção das Ipsas possibilitará a organismos públicos, cidadãos, investidores e administradores, dentre outros, ter visibilidade clara da real situação econômica e financeira de União, estados e municípios. Um contraste com o que ocorria até agora. Por mais que possa parecer absurdo, hoje os organismos públicos brasileiros não têm registrados todos os seus ativos e passivos. Rodovias, parques, terrenos, bens de infraestrutura e dívidas podem não constar do balanço patrimonial. Tudo passará a ser contabilizado e mensurado.
Outro importante ganho decorrente da adoção das novas normas está relacionado com a comparabilidade entre as unidades federativas brasileiras, assim como com órgãos públicos de outros países. Saúde financeira e, principalmente, a gestão financeira da coisa pública passarão a ser transparentes. O que poderá levar os cidadãos a indagar, por exemplo, por que um município com determinado número de habitantes e receita presta serviços públicos melhores ou piores do que outra cidade com porte e condições similares. A má gestão será evidenciada, os bons e os maus gestores públicos serão mais facilmente identificados.
Com relação às obrigações trabalhistas, mais uma mudança importante. As novas normas requerem reconhecimento, mensuração e evidenciação da provisão por competência dos benefícios aos servidores públicos (por exemplo, 13o salário, férias e planos de pensão e saúde). Hoje, da forma como a contabilidade pública é feita, União, estados e municípios não têm visibilidade do montante da obrigação referente a esses itens. E a sociedade, que paga impostos para que essas obrigações sejam cumpridas, tem menos ainda.
Maior transparência, maior capacidade de avaliação de desempenho dos gestores e melhor visibilidade do patrimônio público são os principais ganhos com a convergência do Brasil às Normas Internacionais de Contabilidade Aplicadas ao Setor Público. Os brasileiros passarão a ter mais consciência sobre a gestão dos órgãos públicos e a saúde financeira do Estado. A contabilidade passa a ser instrumento de apoio ao cumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal e à evidenciação da prestação de contas das autoridades governamentais, contribuindo para um Brasil mais ético, democrático e equânime.
por Idésio Coelho (ibracon@ibracon.com.br) é presidente do Instituto dos Auditores Independentes do Brasil (Ibracon)
Fonte: Capital Aberto - 28/10/2016
Via Ibracon
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