A lei que determina a discriminação dos impostos na nota fiscal entra efetivamente em vigor daqui a dois meses, mas há risco de o consumidor não conseguir ver o peso dos impostos na nota em cada produto. O parágrafo 2º do primeiro artigo da Lei da Transparência diz que a informação “poderá constar de painel afixado em local visível do estabelecimento, ou por qualquer outro meio eletrônico ou impresso” e está sendo considerado como alternativa para evitar mudanças na nota fiscal.
— A lei permite que a informação seja feita por meio de cartazes. Ainda estamos discutindo como isso será feito, mas cada supermercado poderá adotar a forma que achar melhor — diz Aílton Fornari, presidente da Associação de Supermercados do Estado do Rio de Janeiro (Asserj).
Para o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), a informação somente em cartazes prejudica o consumidor. O Idec defende que a possibilidade seja eliminada na regulamentação da lei, prevista para os próximos dias.
A lei entrou em vigor em junho do ano passado, mas foi dado prazo de um ano para que as empresas pudessem se adequar. Somente daqui a dois meses, poderá ser aplicada multa de até R$ 7 milhões para empresas que não divulgarem os valores dos impostos embutidos nos preços, passados oito anos do início da campanha que reuniu 1,5 milhão assinaturas para criar a Lei da Transparência.
Consumidor desconhece
Para a maior parte dos consumidores, a Lei 12.741/2012 permanece desconhecida. Induzidos pelo GLOBO a verificar o valor pago em tributos na nota de compra feita recentemente em loja que já aderiu à nova regra, a reação da maioria foi de espanto. Eles sequer haviam percebido a existência da nova informação. Foi o caso do vendedor Sandro Luiz da Cunha. Ele quase não acreditou que numa Coca-Cola que custou 5,99, R$ 1,91 era imposto.
— O problema maior é que não há o que fazer. Vamos reclamar a quem?
Entre os entrevistados, os tributos registrados nas notas variavam entre um quarto e um terço do valor total das compras. A administradora Natália Lira, acredita que, a partir do momento que as pessoas se derem conta que a informação consta na nota, haverá um debate natural sobre os altos encargos, o que pode levar a uma mudança de comportamento:
— Acho que a tendência é os consumidores começarem a boicotar produtos com maior carga tributária. Principalmente os mais caros, que devem ter uma parcela ainda mais significativa em impostos — prevê.
O presidente-executivo do Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT), João Eloi Olenike, espera que a informação ajude a pessoas a cobrarem do governo o melhor uso do dinheiro.
— Antes, havia uma tributação silenciosa, o consumidor não sabia quanto imposto estava pagando. Hoje, as pessoas nem olham a nota fiscal e só guardam quando ela é a garantia do produto. Quando essa informação se tornar uma prática, as pessoas vão começar a falar umas para as outras quanto é o imposto e perguntar para onde está indo esse dinheiro — diz.
Para Olenike, o uso dos cartazes para informar valor dos impostos é uma opção dos lojistas, mas não elimina a obrigação de discriminar os impostos na nota fiscal.
— As duas formas são boas, mas está havendo um erro de interpretação da lei. O texto dá a opção de informar por cartazes, mas isso não dispensa a discriminação na nota — diz.
Já a Associação Comercial de São Paulo, responsável pela campanha das assinaturas que deu origem à lei, considera as duas formas de informação válidas.
—Essa possibilidade está prevista na legislação e, para produtos que tenham a mesma tributação, não vejo problema. Em estabelecimentos que vendem poucos itens, como postos de gasolina, por exemplo, o cartaz pode ser mais eficaz do que a nota, porque o impacto visual é maior — Marcel Solimeo, economista-chefe da ACSP.
Ele brinca com a cerveja, que teve o imposto elevado:
— A nota fiscal da cerveja, por exemplo, a pessoa nem olha muito, senão perde até a vontade de beber — brinca.
Para a analista de segurança Marita Campos, a alta carga tributária é injustificável:
— Se este dinheiro fosse destinado à maior qualidade e confiança nos produtos, tudo bem. Mas pagamos altas taxas para ter de voltar no outro dia à loja trocar um produto novo que já veio com defeito — reclama, sem saber que os impostos não são destinados à fabricação do produto.
10% das empresas baixaram programa
A nutricionista Lívia Gonçalves Pires Sollberg compara o Brasil com os países europeus e o americano e acha que estamos atrasados.
— Nos EUA, o preço exposto no produto está isento de encargos. É no caixa, na hora de fazer o pagamento, que são computados os impostos. Dessa forma, sempre sabemos o quanto estamos pagando em taxas — reclama.
Para o presidente do Clube de Diretores Lojistas do Rio, Aldo Carlos de Moura Gonçalves, a comparação entre Brasil e Estados Unidos não é boa, porque os americanos têm um imposto unificado e isso facilita a discriminação na nota fiscal.
— O sistema tributário brasileiro é muito complexo. São vários impostos. O ICMS varia de estado a estado, pode ser cobrado na origem ou destino. Estou pessimista com essa lei, acho que vai onerar o empresário e não vai ser muito útil para o consumidor — diz Gonçalves.
Segundo ele, o uso dos cartazes é uma alternativa mais simples, porém, inadequada para empresas com um rol de mercadorias muito amplo.
— Imagine uma loja de departamento que vende 10 mil itens diferentes. Sou a favor da transparência, da informação ao consumidor, mas acho que a lei não seja a melhor alternativa.
O IBPT pôs à disposição gratuitamente em seu site software com o valor aproximado do imposto de mais de 100 mil itens que já foi baixado por cerca de 10% das empresas do país. Foram 1,5 milhão de downloads, a maioria em São Paulo (31%), Rio de Janeiro (10%) e Minas Gerais (8%).
Entenda a nova lei
Campanha: Em 2006, o movimento de “De Olho no Imposto”, da Associação Comercial de São Paulo, apoiado por diversas entidades, reuniu mais de 1,5 milhão de assinaturas pedindo que o valor dos impostos fosse informado nas nota fiscais
Lei sancionada: Em dezembro de 2012 ,a presidente Dilma Rousseff sancionou a Lei 12.741/2012 que prevê a informação do valor aproximado do ICMS, IPI, ISS, PIS/Cofins, IOF e Cide. A lei entrou em vigor em 10 de junho de 2013, mas a punição para as empresas que descumprirem a regra foi adiada por mais um ano.
Fonte: O Globo
Via Mauro Negruni
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