quinta-feira, 17 de agosto de 2017

Protesto de CDA não interrompe prescrição tributária

O protesto em cartório de Certidão de Dívida Ativa (CDA) tem previsão legal desde 2012, quando a lei 12.672 incluiu o parágrafo único no artigo 1º da lei 9.942, de 10 setembro de 1997.

“Incluem-se entre os títulos sujeitos a protestos”, diz a regra, “as certidões de dívida ativa da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e das respectivas autarquias e fundações públicas”.

Contra a medida, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) ajuizou, sem sucesso, a Ação Direta de Inconstitucionalidade 5135, oportunidade em que o Supremo Tribunal Federal fixou a tese de que “o protesto das certidões de dívida ativa constitui mecanismo constitucional e legítimo por não restringir de forma desproporcional quaisquer direitos fundamentais garantidos aos contribuintes e, assim, não constituir sanção política”.

Ainda que válido seja o meio de cobrança[1], seus efeitos não podem ser igualados àqueles ordinariamente previstos na legislação civilista. Enquanto o protesto cambial de títulos privados provoca a interrupção do prazo prescricional, nos termos do artigo 202, inciso III do Código Civil, o mesmo não se pode dizer do protesto de CDA.

Isto porque o artigo 146, inciso II da Constituição Federal entregou à lei complementar tributária a tarefa de disciplinar matéria de prescrição, causa extintiva do crédito tributário (artigo 156, inciso VI do Código Tributário Nacional – CTN).

Com efeito, em atendimento à ordem constitucional, o artigo 174 trouxe as quatro únicas hipóteses interruptivas do prazo prescricional, dentre as quais figura somente o “protesto judicial” (art. 174, parágrafo único, inciso II, CTN), processo cautelar específico, com participação do Poder Judiciário, distinto, portanto, do mero protesto cambial, procedimento unilateralmente promovido pela Fazenda Pública.

Aliás, quando se alterou o inciso I do referido comando, estabelecendo como causa interruptiva o “despacho do juiz que ordenar a citação em execução fiscal”, e não mais a “citação pessoal feita ao devedor”, foi a Lei Complementar (118, de 9 de fevereiro de 2015) o instrumento legislativo escolhido, nos exatos e precisos termos constitucionais.

Por que flexibilizar a rigidez da Carta Magna no caso dos protestos extrajudiciais de CDA?

Não se duvida da legitimidade emprestada ao protesto cambial de CDA. Isso é página virada. O que se deve preservar é a repartição constitucional de competência tributária, quadro sobre o qual estão desenhadas as limitações ao poder de tributar. Se busca a Fazenda obstar a fluência do prazo prescricional, que o faça como manda o figurino da Lei Complementar Tributária: por via de ação judicial de protesto.

É uma pena que o Tribunal Regional Federal da 1ª Região não tenha considerado este cenário normativo quando decidiu por rejeitar liminarmente petição inicial de Conselho Profissional que ajuizara cautelares de protesto para interrupção da prescrição: “(…) Dispondo a credora de medidas extrajudiciais cabíveis para a finalidade de recebimento de crédito relativo às anuidades não pagas, afigura-se desnecessária a utilização de medida cautelar de protesto, ajuizada com a finalidade exclusiva de interrupção do prazo prescricional”[2].

Já o TRF-2, por sua vez, alinha-se à ideia de que “a prescrição e a decadência tributárias são matérias reservadas à lei complementar. Desse modo, o protesto extrajudicial não tem o condão de interromper a prescrição do crédito tributário por ausência de previsão legal, bastando a simples leitura do artigo 174 do CTN para se chegar a essa conclusão”[3].

É este último desfecho que nos parece atender ao regramento constitucional. Negligenciar norma geral em matéria tributária não é bom para o sistema, não é bom para o Brasil, que precisa e merece segurança jurídica no trato das relações. Direito é meio, é processo, e não se pode negar a importância do processo legislativo-democrático na solidificação da Federação. Se ficou a cargo da Lei Complementar lidar com a matéria, que assim o seja.

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[1] O art. 1º da Lei 9.429/97 (“Lei do Protesto”) admite que “protesto é o ato formal e solene pelo qual se prova a inadimplência e o descumprimento de obrigação originada em títulos ou outros documentos de dívida”. Em que pese não se tratar tecnicamente de uma “cobrança”, seus efeitos invariavelmente pressionam o devedor a arcar com o débito.

[2] TRF-1ª R. – AC 0000955-45.2015.4.01.3814/MG – Relª Desª Fed. Ângela Catão – DJe 25.02.2016 – p. 2829

[3] TRF-2ª R. – AC 0039911-61.2016.4.02.5110 – 4ª T.Esp. – Rel. Ferreira Neves – DJe 15.12.2016 – p. 732

Gabriel da Nóbrega Fernandes - Mestrando em direito tributário na PUC/SP. Advogado tributarista em São Paulo

Fonte: Jota.info/

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