quinta-feira, 22 de fevereiro de 2018

Atenção ao prazo de adesão ao Programa de Regularização Tributária Rural

Logo no início deste ano, no dia 10 de janeiro, a Presidência da República publicou a Lei 13.606, instituindo o Programa de Regularização Tributária Rural (PRR), entre outros temas. Nosso objetivo aqui é abordar as características desse novo parcelamento tributário, que, na verdade, é semelhante ao que foi instituído pela MP 793/2017, que perdeu a sua vigência em 28/11/2017[1]. Agora, o prazo para adesão da atual versão do PRR vai até 28 de fevereiro.

Vale destacar que o parcelamento alcança apenas a contribuição devida pelos produtores rurais pessoas físicas e dos adquirentes de produção rural ao Funrural, prevista no artigo 25 da Lei 8.212/91 (com a redação da Lei 10.256/2001) e no artigo 25 da Lei 8.870/94.

Além disso, a Lei 13.606/2018 reduziu a alíquota da contribuição de 2% para 1,2%, por meio do seu artigo 14, da contribuição prevista no artigo 25 da Lei 8.212/91. Todavia, o presidente vetou a redução da contribuição prevista no artigo 25, I, da Lei 8.770/94 de 2,5% para 1,7%, alegando que tal redução representaria sacrifício despropositado aos cofres do Regime Geral de Previdência Social, o que nos parece correto.

Quem acompanha o assunto sabe que a referida contribuição passou pelo controle de constitucionalidade do Supremo Tribunal Federal em março de 2017, quando julgou o Recurso Extraordinário 718.874/RS (Tema 669 de repercussão geral), interposto pela União contra decisão do TRF da 4ª Região, que entendeu pela inconstitucionalidade da contribuição. O STF entendeu que o tributo é devido, nos termos da ementa abaixo, publicada em 3/10/2017:

“Ementa: TRIBUTÁRIO. EC 20/98. NOVA REDAÇÃO AO ARTIGO 195, I DA CF. POSSIBILIDADE DE EDIÇÃO DE LEI ORDINÁRIA PARA INSTITUIÇÃO DE CONTRIBUIÇÃO DE EMPREGADORES RURAIS PESSOAS FÍSICAS INCIDENTE SOBRE A COMERCIALIZAÇÃO DA PRODUÇÃO RURAL. CONSTITUCIONALIDADE DA LEI 10.256/2001.

1. A declaração incidental de inconstitucionalidade no julgamento do RE 596.177 aplica-se, por força do regime de repercussão geral, a todos os casos idênticos para aquela determinada situação, não retirando do ordenamento jurídico, entretanto, o texto legal do artigo 25, que, manteve vigência e eficácia para as demais hipóteses.

2. A Lei 10.256, de 9 de julho de 2001 alterou o artigo 25 da Lei 8.212/91, reintroduziu o empregador rural como sujeito passivo da contribuição, com a alíquota de 2% da receita bruta proveniente da comercialização da sua produção; espécie da base de cálculo receita, autorizada pelo novo texto da EC 20/98.

3. Recurso extraordinário provido, com afirmação de tese segundo a qual É constitucional formal e materialmente a contribuição social do empregador rural pessoa física, instituída pela Lei 10.256/01, incidente sobre a receita bruta obtida com a comercialização de sua produção”.

Cabe a ressalva de que o STF ainda não pronunciou acerca da constitucionalidade das citadas contribuições devidas pela pessoa jurídica produtora rural e pelas agroindústrias. Atualmente, o processo se encontra com vista ao ministro Edson Fachin para análise dos embargos de declaração opostos.

Não tenho aqui o objetivo de me aprofundar nas razões da decisão do STF ou sobre o seu acerto, pois me preocuparei com as suas consequências.

De fato, a decisão a que chegou o Supremo Tribunal Federal no referido recurso extraordinário, em apertada maioria (6x5), causou surpresa por representar uma mudança do entendimento até então existente, que apontava pela inconstitucionalidade da contribuição ao Funrural[2]. No julgamento, percebeu-se, claramente, o desconforto da minoria formada pelos cinco ministros, com a mudança de rumo do entendimento da suprema corte.

Diante do contexto histórico e das decisões que foram sendo tomadas pelo Poder Judiciário, milhares de contribuintes simplesmente deixaram de recolher a contribuição ao Funrural ou estavam alcançados por decisões judiciais favoráveis. Agora, com a definição da tese pela constitucionalidade da Lei 10.256/2001, pode a Receita Federal intensificar a fiscalização e lavrar lançamentos de ofício.

Para os contribuintes que não foram objeto de lançamentos de ofício (autos de infração), o parcelamento das contribuições devidas nos últimos cinco anos (dentro do prazo prescricional previsto no CTN) nos parece uma boa opção. É importante lembrar que, se a Receita Federal não fizer o lançamento, a cobrança não pode ser feita, mas o contribuinte sempre pode, espontaneamente, declarar o crédito tributário e fazer o parcelamento.

A verdade é que todo contribuinte deve ter a consciência de que é sua obrigação declarar e recolher a contribuição prevista no artigo 25 da Lei 8.212/91, especialmente após a decisão do Supremo Tribunal Federal no RE 718.874/RS.

Como dito, os contribuintes poderão, até 28 de fevereiro, parcelar os créditos tributários devidos a título da contribuição do artigo 25 da Lei 8.212/91 e do artigo 25 da Lei 8.870/94, devidos até 30/8/2017, constituídos ou não, inscritos ou não em dívida ativa da União, inclusive objeto de parcelamentos anteriores rescindidos ou ativos, em discussão administrativa ou judicial, ou ainda provenientes de lançamento efetuado de ofício.

O PRR exige dos contribuintes o recolhimento de um percentual de 2,5% da dívida, sem a redução de multa e juros, em até duas parcelas mensais e sucessivas. Tal exigência se assemelha a que havia na extinta MP 793/2017, porém os percentuais lá exigidos eram menores, de 1% ou de 2%, dependendo do momento da adesão. Assim, aderir ao PRR hoje é mais custoso no primeiro momento do que foi anteriormente.

Por sua vez, o restante do crédito tributário está sujeito às reduções de 100% dos juros de mora. Todavia, o presidente vetou a redução de 100% das multas de mora e de ofício e dos encargos legais, incluídos os honorários advocatícios, alegando que tais reduções levariam a sobrelevação de custo fiscal imputado ao Tesouro Nacional, sem previsão na Lei Orçamentária para recepção do impacto, conforme consta da mensagem de veto.

Realmente, temos que concordar que o Congresso Nacional, ao aprovar um parcelamento especial com a redução total de multa, juros e encargos legais, deixou o presidente quase com a obrigação de vetar uma parte, pois seria uma renúncia descabida, em tempos de déficit fiscal tão severo. Apenas para firmamos uma comparação, na MP 793/2017, a redução da multa e dos encargos legais era de 25%.

De qualquer forma, se levarmos em conta discussões mais antigas, que alcancem fatos jurídicos ocorridos há mais de dez anos, o valor dos juros supera o valor do próprio crédito tributário, resta evidente que a remissão parcial é muito expressiva.

O PRR prescreve que o pagamento do restante do crédito tributário, objeto da consolidação, será feito por meio de parcelamento em até 176 prestações, equivalentes a 0,8% da média mensal da receita bruta proveniente da comercialização de sua produção rural do ano anterior ao do vencimento da parcela.

Caso não seja possível quitar totalmente a dívida diante do critério acima, eventual saldo restante deve ser pago à vista ou acrescido à última prestação, ou ser parcelado em até 60 meses.

Acertadamente, a lei prescreve que, na hipótese de suspensão da atividade da produção rural ou de não auferimento de receita bruta por período superior a um ano, o valor da prestação mensal será o equivalente ao saldo da dívida consolidada com as reduções ali previstas, dividido pela quantidade de meses que faltarem para complementar os 176 meses.

É condição necessária para manutenção no PRR o recolhimento regular das contribuições previstas no artigo 25 da Lei 8.212/91, no artigo 25 da Lei 8.870/94, além do FGTS.

Uma melhoria significativa do atual PRR, em relação ao instituído pela MP 793, é não prescrever a existência de garantias. Na MP que perdeu a vigência, para dívidas que ultrapassassem os R$ 15 milhões, era necessária a apresentação de carta de fiança ou seguro garantia judicial.

Em verdade, apenas são mantidas as garantias apresentadas em eventuais execuções fiscais ou que tenham sido objeto de arrolamento. Além disso, na hipótese de existência de depósitos judiciais vinculados aos tributos aqui tratados, esses serão transformados em pagamento definitivo para redução da dívida existente.

Em linhas gerais, o governo federal, ao permitir, mais uma vez, que os contribuintes parcelem os tributos aqui tratados por meio de novo PRR, demonstra que atendeu ao pleito dos proprietários rurais. Não restam dúvidas de que é aconselhável aderir ao parcelamento, especialmente em função da decisão definitiva do STF, que entendeu pela constitucionalidade da contribuição.

[1] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2017/Congresso/adc-066-mpv793.htm
[2] Conforme decisão do STF no RE 363.852/MG:
“RECURSO EXTRAORDINÁRIO - PRESSUPOSTO ESPECÍFICO - VIOLÊNCIA À CONSTITUIÇÃO - ANÁLISE - CONCLUSÃO. Porque o Supremo, na análise da violência à Constituição, adota entendimento quanto à matéria de fundo do extraordinário, a conclusão a que chega deságua, conforme sempre sustentou a melhor doutrina - José Carlos Barbosa Moreira -, em provimento ou desprovimento do recurso, sendo impróprias as nomenclaturas conhecimento e não conhecimento. CONTRIBUIÇÃO SOCIAL - COMERCIALIZAÇÃO DE BOVINOS - PRODUTORES RURAIS PESSOAS NATURAIS - SUB-ROGAÇÃO - LEI Nº 8.212/91 - ARTIGO 195, INCISO I, DA CARTA FEDERAL - PERÍODO ANTERIOR À EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 20/98 - UNICIDADE DE INCIDÊNCIA - EXCEÇÕES - COFINS E CONTRIBUIÇÃO SOCIAL - PRECEDENTE - INEXISTÊNCIA DE LEI COMPLEMENTAR. Ante o texto constitucional, não subsiste a obrigação tributária sub-rogada do adquirente, presente a venda de bovinos por produtores rurais, pessoas naturais, prevista nos artigos 12, incisos V e VII, 25, incisos I e II, e 30, inciso IV, da Lei nº 8.212/91, com as redações decorrentes das Leis nº 8.540/92 e nº 9.528/97. Aplicação de leis no tempo - considerações tese definida pelo STF foi a seguinte: É constitucional formal e materialmente a contribuição social do empregador rural pessoa física, instituída pela Lei 10.256/2001, incidente sobre a receita bruta obtida com a comercialização de sua produção.

Gustavo Ventura é advogado, especialista em Direito Tributário pela Universidade de Santiago de Compostela e mestre pela PUC-SP. Professor de pós-graduação e presidente da comissão de Direito Financeiro do Instituto dos Advogados de Pernambuco.

Fonte: Conjur

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